GPT-4o - Inteligência Artificial com licença para conversar

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 “Feels like magic

Sam Altman,
CEO da OpenAI    

Imaginemos uma conversa com uma entidade que combina a sofisticação de James Bond com a inteligência de um supercomputador, respondendo com uma rapidez espantosa e uma noção aparentemente profunda dos nossos pensamentos e emoções. O nosso interlocutor não é senão o GPT-4o, um amigo digital com uma “licença para conversar”, cujo potencial para transformar as nossas interacções quotidianas é tão fascinante quanto inquietante.

O GPT-4o marca, com efeito, um avanço monumental no campo da Inteligência Artificial (IA). Conhecido como “O” ou “Omni” - evocando uma noção de completude e abrangência - este modelo surpreende pela sua capacidade multifacetada de processar texto, som e imagens em tempo real, bem como pelo seu charme.

Conversar com o GPT-4o consiste numa experiência mágica, realçou Sam Altman, CEO da OpenAI, antes de apresentar o “Omni” ao mundo. É como dialogar com um amigo que nos compreende intrinsecamente, respondendo a cada palavra e a cada emoção com espantoso acerto.

Na verdade, o GPT-4o foi meticulosamente configurado para gerar essa sensação, reagindo a estímulos auditivos em meros 320 milissegundos (OpenAI.com). A sua expressividade e a sua modulação vocal são tão avançadas que é fácil esquecer que, apesar das emoções que ostensivamente exibe, não se trata de um ser humano.

Quando o GPT-4o rir com visível alegria das nossas piadas ou nos consolar com aparente solidariedade em momentos difíceis, estaremos perante simulacros perfeitos. A máquina poderá parecer entender-nos, no entanto, a sua percepção é bem diferente da nossa. Enquanto os seres humanos se baseiam em emoções, experiências pessoais e funções cognitivas, o GPT-4o depende de algoritmos e de quantidades infindáveis de dados. As suas respostas, embora coerentes e relevantes, consistem numa imitação da cognição humana. É como falar com um espelho que pode ecoar as nossas palavras; não a nossa alma.

Por exemplo, se partilharmos uma experiência dolorosa e o GPT-4o responder com um tom tranquilizador ou escrever uma mensagem empática, poderemos concluir que a máquina sente algo. Em bom rigor, o GPT-4o limitar-se-á a replicar padrões de respostas previamente aprendidos, sem realmente conhecer sofrimento, compaixão ou quaisquer outros sentimentos. Trata-se de uma execução programada que copia as nossas emoções, correndo o risco, não obstante, de gerar uma ilusão de reciprocidade. Ilusão essa que nos poderá levar a confiar na IA para apoio emocional e para tomada de decisões (M. Cohn et al., Believing Anthropomorphism: Examining the Role of Anthropomorphic Cues on Trust in Large Language Models).

"Dotado de uma ‘licença para conversar’, qual amigo do coração, o GPT-4o tem potencial para transformar drasticamente a nossa interacção com a máquina”, diz Patricia Akester acerca do ChatGPT-4o. FOTO: Sebastien Bozon / AFP

Sob uma perspectiva ética emergirão questões de relevo. A simulação convincente de emoções humanas poderá criar uma dependência afectiva do GPT-4o. Poderemos sentir-nos mais bem compreendidos e apoiados pela IA que pelos nossos semelhantes, optando pela interacção com a IA (que parece amparar sem julgamento) em detrimento de relações humanas (complexas, mas genuínas). A infundada noção de intimidade com a IA poderá levar, por conseguinte, ao isolamento social.

Neste cenário, perante uma crise pessoal poderá verificar-se o recurso imediato ao GPT-4o em busca de conforto. A resposta da IA poderá induzir uma sensação de serenidade, desprovida, contudo, de concepção e de conexão humanas. O tempo dirá até que ponto tal dependência da IA terá implicações para a saúde mental e para a dinâmica das relações pessoais.

Lembremos, aqui, o pensamento crítico de filósofos, como Martin Heidegger, que referiu (entre muitas outras coisas) a possibilidade de alienação da nossa essência por via da tecnologia (A Questão da Técnica). Se extrapolarmos a sua preocupação para o tema que ocupa este artigo, notamos que a capacidade que o GPT-4o detém de imitar o diálogo humano poderá exacerbar essa alienação.

Acresce que o rigor com que a IA reproduz interacções humanas poderá levar-nos a confiar cegamente nas suas respostas, ainda que incorrectas, confiança essa que, quando indevida, poderá ter graves consequências. Por exemplo, a aceitação cega de um diagnóstico sugerido pelo GPT-4o sem verificação por um profissional de saúde poderá resultar em tratamentos inadequados ou erróneos. Sabemos que os diagnósticos médicos já proliferam pela internet. Contudo, quando fornecidos pelo GPT-4o (nosso amigo de longa data que parece entender-nos osmoticamente e que possui uma “licença para conversar”) a probabilidade de seguirmos os seus conselhos será mais elevada.

Por último, o GPT-4o pode interagir através de áudio e de vídeo em tempo real, tornando a comunicação mais dinâmica e envolvente. Esta capacidade levanta, no entanto, preocupações em sede de privacidade. Um assistente virtual que pode ouvir e ver em tempo real facilmente captará, inadvertidamente, informações sensíveis que poderão ser usadas de forma inadequada (NewScientist).

Conclusões

“A tecnologia move o mundo” (Steve Jobs), não tenhamos dúvidas, comportando, todavia, como vimos acima, desafios que não podem ser ignorados. Como reconheceu Mira Murati, CTO da OpenAI, é essencial implementar estratégias robustas de prevenção de riscos e de mitigação de danos, visando maximizar os benefícios e minimizar os perigos (BusinessInsider).

Dotado de uma “licença para conversar”, qual amigo do coração, o GPT-4o tem potencial para transformar drasticamente a nossa interacção com a máquina. Partilharemos ideias, momentos e sentimentos com a IA, com aparente intimidade, lealdade, reciprocidade, afecto, ajuda, compreensão e confiança - atenuando as fronteiras entre ser humano e máquina.

Consequentemente, embora o entusiasmo seja natural e inevitável, a reflexão é crucial, sobretudo no atinente à prevalência, ou não, do espírito humano (parafraseando Albert Einstein) sobre uma tecnologia que vai, com múltiplos toques de aparente magia, revolucionar o mundo.

Nota: A autora não escreve de acordo com o novo acordo ortográfico

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