Fazer o que é certo e não o que é justo
Nem três semanas passaram desde que pelo menos 11 pessoas, maioritariamente idosos, morreram por atrasos no atendimento das linhas de emergência do INEM. O caso, que teve alguma análise do ponto operacional do INEM, ganhou uma nova vida na arena do confronto político, como uma forma de partidos da Oposição, como o PS, atacarem a ministra da Saúde, Ana Paula Martins. Faz parte do jogo. Aguente-se.
Mas houve uma questão que se debateu menos. É razoável - sabendo que há profissões cujo direito à greve tem restrições, como os polícias - que os profissionais do atendimento de emergência possam avançar para uma paralisação sabendo que o protesto terá, com elevado grau de probabilidade, consequências tão gravosas como as que se verificaram nem há três semanas? Não está em causa o direito à greve, garantido pela Constituição, mas poderá um sindicato avançar com um protesto destes sem estarem garantidos os serviços mínimos?
É grave que nem INEM, nem o Ministério da Saúde tenham acionado e garantido um reforço de pessoal para os dias de greve. É censurável que ninguém, ao longo da cadeia de comando, tenha acautelado se os serviços mínimos indispensáveis estavam garantidos.
Mas pode um sindicato, sobretudo sabendo que o INEM e o ministério tinham falhado nos serviços mínimos, avançar com um protesto que - em determinadas condições - resulta em mortes entre a população?
A resposta é não. Algures ao longo desta linha é preciso largar o “este não é um problema meu” ou “não fui eu que criei esta situação”, respirar fundo e fazer o que é certo. E neste caso, a atitude certa, humana, seria reservar a greve, que até pode ser justíssima, para um momento em que não pusesse vidas em risco. Mesmo que para isso os trabalhadores tivessem de avisar aos gritos, na imprensa e na televisão, o ministério, a classe política e o resto da sociedade, para o risco que se estaria a correr. Em última análise, com ou sem o sindicato, os trabalhadores poderiam ter ido trabalhar, em nome de um bem maior. E das suas consciências.
Claro que esta situação resulta, como noutras vertentes do serviço médico em Portugal, do facto de haver falta de trabalhadores para os turnos todos. Ou ser preciso recorrer sistematicamente a horas extraordinárias para suprir as necessidades correntes. Mas isso é tema para outro dia.
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Um aparte. Nem um mês passou desde o momento em que um cidadão desarmado foi morto a tiro por um agente da polícia no Bairro da Cova da Moura. Também desapareceu dos noticiários. Ainda se sabe pouco da investigação às ações da PSP naquele dia.
Nem um mês passou desde o momento em que um bando criminoso lançou fogo a um motorista da Carris Metropolitana, deixando-o numa cama de hospital de que só ontem saiu. É a única boa notícia no meio disto tudo.
Diretor-Adjunto do Diário de Notícias