Existirá uma saída para o eleitorado indiano?
A tentativa do Partido Bhartiya Janata (BJP) de infantilizar e diminuir Rahul Gandhi está a ter sucesso. Hoje, muitos eleitores indianos afirmam que, embora não apoiem o BJP, votarão no partido porque a oposição não tem alternativa a Narendra Modi.
O BJP conseguiu tornar Modi omnipresente. A sua imagem grandiosa fez com que o eleitorado indiano acreditasse que ele é incomparável e insubstituível. Possivelmente, isso influenciou Ajit Pawar a dizer: “Hoje, não há alternativa para ele no país nem no mundo. Temos de o tornar primeiro-ministro pela terceira vez”.
Potencialmente, o constrangimento e o cansaço dos eleitores e a compreensão das travessuras do BJP e do Hindutva estão a alimentar “Modi porque não há alternativa viável”. Simultaneamente, eles estão satisfeitos com a percepção de distância de Modi das atividades de direita hindus, com a sua religiosidade benigna, e felizes com a forma como ele moldou a Índia. A antipatia para com o Congresso e a sua fixação nos Gandhis provavelmente resulta no apoio a Modi, mas não necessariamente ao BJP.
É claro que muitos têm motivos para querer um governo Modi. Mas a crença fatalista na falta de alternativas que resulta no voto em Modi não é um bom presságio para a Índia. Sugere que, embora os cidadãos estejam conscientes das consequências da forma como o país está a ser governado, estas são inconsequentes devido a uma aparente falta de opção política a Modi.
Estarão os eleitores a enganar-se a si mesmos, ou a outros, tentando separar Modi do BJP, da sua ideologia e de outros candidatos do BJP? Modi atravessa o país e faz campanha pelos candidatos do BJP porque o seu cargo de primeiro-ministro depende da vitória dos candidatos do BJP. A desculpa de “não haver alternativa viável” tem outras ramificações importantes. Aqueles que usam este pretexto não estão preocupados com a qualidade dos candidatos do BJP no seu círculo eleitoral, embora, quando eleitos, sejam responsáveis pelo desenvolvimento do círculo eleitoral e possam acabar como ministros no governo de Modi.
A Índia enfrenta outras questões além da Votação do Pessimismo.
O eleitorado indiano nunca teve uma vida tão difícil como agora. Nesta época em que a informação é facilmente acessível, as eleições gerais de 2024 podem não ser uma escolha informada. De acordo com o Relatório de Risco Global de 2024 divulgado pelo Fórum Económico Mundial, os executivos indianos listaram a desinformação como o risco número um para o país.
Embora se queira acreditar na santidade dos resultados eleitorais e que estes refletem a escolha dos cidadãos pelo que é melhor para o país, a verdade é provavelmente diferente. Demagogia, questões emotivas de religião e casta e subornos influenciam as escolhas eleitorais. Há também a questão da inviolabilidade das máquinas de voto eletrónico e da troca de partido dos candidatos eleitos. Nesses casos, será que os controlos e equilíbrios tão necessários e vitais numa democracia podem ser criados através da votação noutros candidatos políticos?
A maioria dos indianos acredita que o seu dever democrático termina com o voto. Nas eleições gerais de 2019, o BJP e aliados conquistaram 353 assentos parlamentares com 45% de votos. Mas a maioria insatisfeita que não votou nos candidatos do BJP e do NDA manteve-se em silêncio sobre questões que podem tê-los levado a ignorar o BJP.
Não esqueçamos que os políticos afirmam que entram na política para servir o povo e a nação. O eleitorado, ao votar num político e num partido político, está a fazer um grande favor ao político e ao partido, dando-lhes uma oportunidade de servir. No entanto, ao vencer as eleições, os candidatos mortais tornam-se deuses inexpugnáveis. O eleitorado não exige responsabilização do partido e do político porque fazê-lo implica traição ou, pior, confirma uma má escolha. Assim, o eleitorado faz-lhe um favor ainda maior.
Atualmente na Índia ecoa a reclamação do BJP sobre os anos do Congresso, quando este tinha maioria parlamentar, ou montou uma coligação desigual e formou governo. Estará o BJP a apontar para as consequências nefastas e de longo alcance para a nação de uma maioria bruta e de uma coligação desequilibrada? Não deveria o eleitorado tomar conhecimento destes lembretes do BJP e não repetir os erros passados?
Nestas circunstâncias, Nenhuma das Opções Acima (NOTA) é uma opção para os eleitores indianos. A observação do Honorável Supremo Tribunal (ST) na sua decisão de 2013, sobre a petição da União Popular pelas Liberdades Civis (UPLC), de que os eleitorados têm o direito de demonstrar descontentamento e também escolher um candidato moralmente íntegro levou à implementação da NOTA.
A NOTA foi incluída pela primeira vez como opção durante as eleições legislativas de 2013. Nas eleições gerais de 2019, 1,04% dos eleitores escolheram a NOTA. No espírito desta ordem do ST, muitas Comissões Eleitorais Estaduais reconhecem a “NOTA” como um candidato fictício. Assim, se a NOTA obtiver mais votos que os demais candidatos, serão convocadas novas eleições. Se na segunda eleição a NOTA ainda obtiver mais votos, então o candidato com o segundo maior número de votos é declarado eleito.
A NOTA não impede que um partido político ganhe eacabe por formar um governo. Os eleitos nas circunstâncias da NOTA celebram uma vitória vazia. Imagine-se um governo com menos votos do que a NOTA.
A NOTA combate a falta de informação, a suposta falta de alternativas, frustra maquinações políticas e contorna a potencial recalcitrância e apatia dos eleitores no pós-eleições.
O eleitorado esquece que votar nem sempre significa renunciar a escolhas ou eliminar completamente um partido político. Às vezes, significa forçar todas as partes a trabalharem juntas.
Milhões de pessoas apreciam as travessuras dos personagens fictícios que salvam o dia. Agora existe uma oportunidade de dar vida a algo muito mais identificável, um candidato fictício - a NOTA. O poder da NOTA é capacitar aqueles que o usam. A NOTA é aquele herói que sabe que a sua vitória exige o seu sacrifício. Este sacrifício é para o bem maior da democracia porque recalibra a definição de vitória eleitoral. Quando um número suficiente escolhe a NOTA, obtém-se a capacidade de traduzir as eleições num processo que é Pelo Povo, Do Povo e Para o Povo.
Samir Nazareth é autor e escreve sobre questões socioeconómicas e ambientais
Artigo originalmente publicado n’O HeraldO, de Goa