Dos “Anti-Militaristas”
Existem, na Europa como em Portugal, correntes que se manifestam contra a ideia de reforço da Política de Defesa e de Segurança Europeia. E os argumentos aduzidos têm sido os mais diversos, consoante a orientação política das mesmas.
Uns filiam-se no marxismo-leninismo ortodoxo de inspiração soviética, os quais sempre entenderam que deveriam estar mais próximos de uma Rússia do que da Europa, mesmo tratando-se de uma Rússia de capitalismo selvagem e com um regime autocrático de tipo “siciliano”.
Neste conjunto de “teorizadores” existem dois sub-grupos, sendo que um primeiro é, no fundo, favorável à anexação da Ucrânia (quiçá, das Repúblicas Bálticas e de parte da Polónia) pelos russos, embora não o assuma abertamente.
Existe um segundo sub-grupo que, embora condenando timidamente a invasão da Ucrânia pela Rússia, entende que não deveria ajudar-se militarmente a Ucrânia, apelando-se só à Paz, sabendo, todavia, que se ninguém apoiar a dita Ucrânia a mesma acaba anexada pelos ditos russos.
Trata-se de uma posição mais hipócrita do que a do primeiro sub-grupo.
Existe, depois, a tese defendida por aqueles que, já não estando, por inteiro, no campo dos marxistas-leninistas, ainda são muito críticos do “imperialismo capitalista” e sempre duvidaram do projecto europeu: o projecto europeu era considerado um “sub-produto” do capitalismo neo-liberal, a construção da “zona do euro” nunca lhes agradou verdadeiramente (embora nem sempre assumissem abertamente essa posição) e, enfim, não acreditavam, nem acreditam, genuinamente, no futuro desta Europa.
Porquê, então, estar a França, a Alemanha, a Espanha ou Portugal a sacrificar-se por um projecto que não é deles?
Trata-se de uma posição muito semelhante à das correntes nacionalistas exacerbadas europeias, com a diferença de que não se é tão intensamente contra a imigração e de que se assume a defesa da democracia e das liberdades públicas no país em que se habita (que não, necessariamente, noutros países).
Segundo este tipo de corrente do pensamento, apresenta-se caricato que um português defenda o reforço das despesas com a Defesa e a Segurança se não existe perigo algum em que o Sr. Putin entre pela fronteira de Badajoz sentado num tanque.
Mesmo que os russos ataquem a Polónia, a Alemanha, a Finlândia ou a França, o problema não será nosso, dos portugueses.
Solidariedade europeia? Nem mesmo a solidariedade soft de que nos fala parte da classe política, solidariedade soft essa que consiste em “se estar solidário com alguém, desde que tal não implique sacrifícios”.
Só existe solidariedade para se continuar a obter fundos de coesão ou outras modalidades de apoio comunitário, mas não se acredita no projecto europeu.
Não adianta falar-se na nossa ZEE-Zona Económica Exclusiva, que poderá ser do interesse dos russos numa situação de conflito generalizado.
Não adianta argumentar que há quem acredite num projecto supra-nacional europeu e que tal implica solidariedade europeia, que não seja mera solidariedade soft.
Como também não adianta falar-se em solidariedade democrática com países, também eles, com instituições democráticas e que são agredidos por países totalitários, no claro desrespeito pelo Direito Internacional.
O problema é deles e não nosso e, hoje em dia, o que faria sentido, segundo essas correntes, era a adesão às teses realistas, que convidam ao pragmatismo e, portanto, à análise da correlação de forças.
Termos uma Europa que é a segunda maior potência económica do Mundo, que é (comparativamente com as outras regiões do Mundo) um exemplo de defesa do Estado Social, do desenvolvimento sócio-cultural, das mais amplas liberdades cívicas e até do combate às alterações climáticas, sem se pensar na sua Defesa e Segurança faz algum sentido?
Existe, assim, tanta segurança em que esta Europa jamais veja a sua soberania (ou a soberania dos seus Estados Membros) posta em causa?
Ou, então, acredita-se em quê?
Na teoria da contestação permanente, tendo em vista reforçar direitos como os relativos a salários, pensões de reformas, serviço nacional de saúde e estruturas educativas, sem se procurar saber para que tipo de sociedade europeia se caminha ou, então, pensando sempre que, com esta metodologia, chegará, finalmente, o dia de “Sol Iluminador” que permita a emergência de uma “revolução” que concilie a justiça com a liberdade?
Trata-se de um caminho perigoso, em que se acaba nas mãos de tiranos ou se acaba sendo tirano, o mesmo tirano que outrora se enjeitava, mas em que as “circunstâncias da vida” transformam os que não conseguiram encontrar um verdadeiro “objectivo existencial”.
Nem mais, nem menos…
Economista e professor universitário
Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico