Das estratégias chinesa e russa

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Tudo indica ser verdade que a China procura ser uma potência hegemónica, em termos económicos e militares. E tudo indica que a Rússia pretende ser equiparada à China e aos EUA, em temos militares, que não em termos económico-sociais.

Mas, para além dos objectivos a atingir pelos dois países serem diferentes, as estratégias de afirmação do seu poder são, também elas, distintas.

A China assenta a sua estratégia no crescimento económico e no exercício de uma influência “em rede”, a qual deverá ser implementada de forma diferenciada em três regiões do planeta, a saber:

– a região de “influência directa”, que passa por Taiwan, pela Indochina, pelo Mar da China e pelo Mar do Japão, com contenção da influência Russa na Ásia Central e com contenção da influência do Japão, da Índia e da Coreia do Sul nas zonas do Pacífico e do Índico; – o Continente Africano, que se pretende dominar economicamente, por via da implementação de novas modalidades de “ajuda ligada”, concedendo-se empréstimos a pagar em matérias-primas e convertendo-se dívidas contraídas pelos países devedores em aquisição de activos estratégicos existentes nesses mesmos países;

– a região Sul-Americana, que se pretende hegemonizar não só através de mecanismos de “ajuda ligada”, como também de criação de novas modalidades de “feitorias” em alguns países considerados de relevância estratégica.

A Iniciativa One Belt, One Road procura concretizar esta estratégia, nomeadamente na segunda e terceira regiões.

O objectivo central da China não é, nesta fase da sua existência, debilitar a União Europeia, mas antes contestar a hegemonia dos EUA, apesar de se saber que a actual administração americana converge com o governo chinês numa certa subalternização do multilateralismo (embora de forma mais radical do que a chinesa) e numa secundarização dos direitos humanos (neste caso, de forma menos radical do que a Chinesa).

O que é fundamental é criar uma nova modalidade de “imperialismo económico em rede” que vá da zona de influência directa chinesa a África e à América Latina.

O inimigo principal são os EUA, numa perspectiva a dez anos. O inimigo principal não é a UE, apesar de ser um inimigo ”lateral”, enquanto parte integrante do que se convencionou designar de “Mundo Ocidental”.

Já a Rússia assenta a sua estratégia na implementação de um “imperialismo territorial”, pretendendo alargar a sua esfera de influência na Europa às antigas fronteiras do império soviético, tentando consolidar a sua situação económica a partir de uma modalidade de cooperação com a China que possa vir a funcionar como factor de sustentabilidade para o projecto de futuro da Rússia.

Para já, é preciso conquistar parte da Ucrânia e neutralizar o Estado Residual que vier a resultar da rendição. Depois, é preciso actuar de forma similar com as Repúblicas Bálticas e desestabilizar países como a Hungria, a Eslováquia e a Roménia.

Tal significa que, a partir da Europa de Leste e influenciando os sectores de extrema direita na UE, será fundamental debilitar a Europa, ao mesmo tempo que se procurará diminuir a sua influência em África, concretizando-se uma estratégia de “cerco” aos países democráticos europeus.

Farage poderá desempenhar um papel importante nesse sentido.

Desta forma, a Rússia passará a ser uma grande potência que irá até parte da Europa Ocidental e que poderá gerir diversos países outrora colonizados em África pelos países europeus.

Falta-lhe a criação de um mercado endógeno forte, como poderão vir a ser os mercados chinês e indiano, e para ultrapassar essa situação importa à Rússia apoiar uma espécie de integração económica asiática impulsionada pela China.

O inimigo principal Russo não são os EUA do Sr. Trump.

O inimigo principal russo é a Europa, a mesma que, mal ou bem, continua a ser um modelo de defesa dos direitos humanos e que poderá “contaminar” a região de influência russa.

É essa Europa, a “Europa dos Valores”, que atemoriza Putin. Não é a América dos “interesses” do Sr. Trump. Essa, ele conhece bem.

Nem mais, nem menos…

Economista e professor universitário

Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico

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