Da humilhação da América e dos Americanos
Nos passados dias 10 e 11 de Fevereiro realizou-se uma Cimeira sobre Inteligência Artificial em Paris, na qual participaram personalidades políticas de todo o Mundo, com destaque para o vice-presidente dos EUA Vance.
Numa altura em que muitos especialistas falam nos perigos dos desenvolvimentos da IA, perigos esses relacionados com ataques cibernéticos e integridade de informação, a ultrapassagem do próprio ser humano pela IA e o futuro do trabalho (e das sociedades) com a robotização, a UE propõe que exista alguma regulamentação da actividade.
Aliás, especialistas como Harari já chegaram a propor a criação de uma Agência, no quadro da ONU, que regule e supervisione a IA, só sendo aceites novas licenças no domínio em causa com a autorização expressa dessa Agência e desde que se comprove que, na descoberta de uma nova tecnologia, houve intervenção humana.
A posição de Vance no sentido de não se condicionar e, portanto, de não se regular a IA não parece, portanto, fazer sentido, muito menos se compreendendo insinuações de que, se a UE continuar a manter a mesma posição que decidiu adoptar no presente, poderá haver retaliação dos EUA noutros domínios.
Na mesma linha da intervenção de Paris - e na linha de várias intervenções de Trump - Vance optou por atacar os países europeus, na Conferência de Segurança em Munique.
Em primeiro lugar, criticou líderes europeus por se terem congratulado com a anulação de eleições na Roménia.
Ora, essas eleições foram anuladas pelo Tribunal Constitucional Romeno por comprovadamente ter havido ingerência russa no sufrágio, tendo, aliás, essa posição sido reiterada pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que recusou um recurso apresentado pelo candidato pró-russo ao sobredito acto eleitoral.
Não foram postas em causa por uma multidão de apoiantes de outros candidatos que tivesse sido incentivada a invadir o Parlamento ou a promover a revolta nas ruas.
Nem as autoridades romenas perdoaram a eventuais criminosos que tivessem praticado actos de violência contra os agentes da autoridade, sob o falso pretexto de se procurar defender “sequestrados” inocentes.
De seguida, Vance foi ao ponto de afirmar que não existe, hoje em dia, liberdade de expressão na Europa, dando a entender que os “desgraçados” da extrema-direita alemã, francesa, inglesa ou romena são perseguidos e que existem esquemas de censura contra as “virtuosas” redes sociais na “nova Europa autoritária”.
Não é verdade. O sr. vice-presidente mentiu.
Não existe perseguição em relação a qualquer corrente, o que, aliás, tem permitido que a sra. Meloni seja primeiro-ministra em Itália e o sr. Orbán chefe do Executivo na Hungria.
E quanto às redes sociais, o que se pretende é que possa haver contraditório e que as informações pelas mesmas difundidas sejam escrutinadas pelos próprios responsáveis pelas redes sociais, em benefício do respeito pela verdade.
É inaceitável que certas redes sociais proclamem que adoptam por regra a difusão de qualquer informação que lhes seja presente sem procurarem, previamente, confirmar se a mesma é falsa ou verdadeira.
Mais, se adianta que o sr. Trump e o sr. Vance têm insistido em veicular a informação de que os EUA se têm sacrificado financeiramente mais do que a Europa no atinente à guerra na Ucrânia.
É falso.
A Europa já gastou, em termos globais, muito mais do que os EUA, se considerarmos a ajuda humanitária e o financiamento ao funcionamento da Administração Pública na Ucrânia. Os EUA gastaram mais em fornecimento de armas, mas, no conjunto das despesas militares e das despesas do funcionamento com o Estado Ucraniano, a UE foi bastante mais longe.
Mais concretamente, o conjunto de países europeus já contribuiu com mais de 154 000 milhões de dólares e os EUA não ultrapassaram os 80 000 milhões de dólares, pelo que o envolvimento europeu represente quase o dobro do americano.
Em resumo, Trump e Vance pretendem humilhar a Europa.
Mas, com as posições que têm vindo a defender, com aquilo que tem sido a sua praxis para com a USAID, para com o Canadá, para com a Dinamarca, para com os agentes do FBI que defenderam o respeito pela Lei no Capitólio, para com os criminosos que agrediram agentes de segurança e para com os velhos aliados europeus, não é a Europa que estão a humilhar.
Estão, isso sim, a desrespeitar a memória dos Founding Fathers dos EUA e estão a humilhar a América e os Americanos.
Nem mais, nem menos…
Economista e professor universitário
Escreve sem aplicação do novo Acordo Ortográfico