Como assim os talibãs apanharam Biden de surpresa? Até a Toyota estava à espera*
Os talibãs tomaram Cabul em meia dúzia de dias. E, segundo o discurso oficial, os EUA foram apanhados desprevenidos com a velocidade dos acontecimentos.
Querem assim convencer-nos de que a CIA e os restantes serviços de informação não esperavam que o avanço acontecesse desta forma, que o exército afegão mal mostrasse resistência.
É verdade que a CIA já nos deu por várias vezes provas de incompetência. Mas acreditar que todos os serviços de informação americanos não sabiam exatamente que isto ia acontecer é brincar com a nossa credulidade.
De tal forma era isto previsível que até a Toyota, escreve a revista online Quartz, estava à espera: sabendo que os terroristas, perdão, combatentes talibãs adoram as suas carrinhas (aguentam de facto tudo e mais alguma coisa) começaram a exigir contratualmente aos compradores que não revendessem os modelos no prazo de pelo menos um ano, numa tentativa de impedir que cheguem ao Afeganistão.
No entanto...
Esta versão oficial é de tal forma propalada que o The New York Times desta segunda-feira titula em primeira página: "Talibãs capturam Cabul, espantando os EUA". Decididamente, não bastou o tempo em que eles ignoraram as provas de que não existiam quaisquer armas de destruição maciça no Iraque -- e depois lá pediram desculpas aos leitores --, demonstrando mais uma vez que para a "referência" NYT sempre que a Adminstração lhes é simpática (i.e., não é Donald Trump), o discurso oficial é notícia.
(A minha assinatura do Washington Post está em renovação automática, felizmente.)
Avancemos. Os talibãs estão de regresso e com eles o Afeganistão voltará à Idade Média ou pior. Sobre isso, sugiro a leitura deste Editorial do DN, de Leonídio Paulo Ferreira.
Para nós, as consequências serão também grandes (ainda que não tão pesadas, claro). A Al-Qaeda -- ou algo parecido -- está de volta. O próximo ataque ao Ocidente não será amanhã, nem para a semana, mas acontecerá. É tão certo quanto o leitor estar a ler esta frase.
A retirada de Joe Biden, que de facto pode (e deve) ser comparada com a do Vietname, não terá no entanto consequências para o atual Presidente nem para a sua administração. Pelo menos para já.
Isto porque, ao contrário do que acontecia com o Vietname, esta guerra era totalmente ignorada pela população -- excepto pelas famílias dos soldados mortos.
Com a retirada, Biden poupa (muito) dinheiro, pode chamar para si o mérito de poupar vidas e não há aqui, internamente, qualquer noção de derrota na guerra. É um win-win-win para o Presidente.
Nenhuma consequência política negativa terá desta retirada.
A não ser que os talibãs, até 2024 - data das eleições presidenciais -, levem a cabo um atentado terrorista nos EUA... Mas não vão ser estúpidos o suficiente para isso, pois não?!