Caiu a máscara à extrema-direita
André Ventura foi particularmente suave na condenação que fez à “violência na política”, referindo-se aos confrontos de 25 de abril, em Lisboa, causados por elementos de, pelo menos, duas organizações de extrema-direita, o partido Ergue-te, liderado pelo ex-juiz Fonseca e Castro, e o grupo 1143, comandado pelo neonazi Mário Machado - ambos detidos pela PSP na sequência dos distúrbios.
Não se ouviu a utilizar duas das palavras que mais repete nos seus discursos: bandidos e vergonha. Bandidos porque quem provoca, injuria e agride manifestantes pacíficos está a cometer um crime (a polícia indiciou oito, até ao momento, e deteve três); e é uma vergonha especial atacar os polícias que representam o Estado na defesa da legalidade e dos direitos dos cidadãos.
A omissão do presidente do Chega tem uma leitura e é, de facto, incómoda para quem tem tentado manipular as forças de segurança para a sua propaganda política: os acontecimentos da passada sexta-feira revelaram uma extrema-direita violenta e falsa amiga dos polícias. Caiu-lhe a máscara. Que sirva de lição aquela “fruta podre”, como lhe chamou a ministra Margarida Blasco, que apoia extremistas criminosos.
A outro nível, há também uma leitura a fazer, que diz respeito ao famoso capitulo apagado do Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), no qual a Polícia Judiciária (PJ) expunha os riscos e alertava para as atividades dos movimentos extremistas, à esquerda e à direita, em Portugal.
Porque tendo em conta estes últimos acontecimentos, a que se junta a informação noticiada pelo DN nesta edição segundo a qual a PSP identificou um menor de 13 anos em atos de violência junto a elementos da extrema-direita, a análise da PJ ganha ainda mais relevância e oportunidade. Esta não só adverte para a crescente radicalização de menores por estes grupos, como regista o perigo de crescente violência.
O PS acordou tarde e, seguindo o BE, veio pedir agora explicações ao Governo para um “apagão” que tem quase um mês. As explicações que a secretária-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), a procuradora Patrícia Barão, já deu ao DN, não terão sido suficientes.
Não tendo assumido que partiu de si a decisão de eliminar aquele capítulo, mas repartindo responsabilidades de uma alegada aprovação - quando o tema foi apenas debatido na reunião e o facto consumado na versão final que veio a público - por todos os elementos do Gabinete Coordenador de Segurança (polícias, serviços de informações, na presença das ministras da Justiça e da Administração Interna), fica por explicar quem deu essa ordem que obedientemente cumpriu.
Porque o conteúdo eliminado era certeiro para a interpretação do que sucedeu no dia 25 de abril e esta atitude sugere várias perguntas. O SSI pretendeu desvalorizar a extrema-direita? O SSI está politizado? Os cidadãos podem confiar nas análises que publica? Ou podem confiar mais nas palavras das polícias, na sua experiência e avaliação técnica, como foi o caso, neste relatório, do capítulo da PJ?
Porque a secretária-geral do SSI pode estar funcionalmente dependente do primeiro-ministro, mas, acima de tudo, é a Constituição e a lei da República que deve ditar a sua ação.
PS: Ontem, dia 27, o Museu Nacional Resistência e Liberdade, no Forte de Peniche, completou o seu primeiro aniversário. Ao DN, a diretora Aida Rechena disse que neste ano foi visitado por 146 191 visitantes. Todos eles, ao conhecer e partilhar estas memórias dos presos políticos da ditadura, estão certamente melhor preparados para defender a Democracia.