As pessoas no centro do debate sobre a imigração

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Nas últimas semanas a imigração passou a ocupar o centro do debate político, onde alguns abordam o tema com receio ou desconfiança e outros com simplificações perigosas. Mas é possível e é necessário falar de imigração com serenidade, clareza e confiança, sem abandonar os princípios que nos guiam como comunidade. Princípios que colocam a dignidade das pessoas no centro da vida coletiva e exigem que vejamos cada ser humano antes de qualquer estatuto. E, ao mesmo tempo, reconhecendo com realismo os desafios demográficos, económicos e sociais que enfrentamos. Falar de imigração com a convicção de que podemos construir uma sociedade mais justa, mais coesa e mais próspera, onde quem chega, quem cá está e quem aqui nasceu tenham lugar, voz e oportunidades.

O humanismo personalista recorda-nos que cada ser humano tem valor em si mesmo, independentemente da sua origem, religião, condição económica ou situação legal. Esse valor é intrínseco e inalienável, anterior a qualquer decisão política ou jurídica. Por isso, uma política de imigração digna da nossa História e dos nossos valores não trata as pessoas como números ou ameaças, mas como sujeitos de direitos e de dignidade. O objetivo não é apenas acolher, mas integrar quem se junta à nossa comunidade, permitindo que contribua para o bem comum de forma plena e reconhecida, sendo vista e tratada como uma pessoa individual, única, merecedora de respeito e de direitos.

Ao mesmo tempo, enfrentamos desafios concretos. Portugal é um país envelhecido, com uma população ativa em declínio e setores essenciais com falta da mão de obra necessária para gerarmos a riqueza que permita, a quem está e a quem chega, viver vidas dignas. A imigração é, assim, parte da solução e a maioria dos imigrantes vem trabalhar, preencher vagas que não queremos, cuidar dos nossos idosos, empreender, pagar impostos, contribuir para a segurança social e enriquecer a nossa diversidade cultural. São parceiros no crescimento e não obstáculos ao progresso.

Há, também, um outro lado desta realidade que devemos escutar com empatia e responsabilidade: os receios legítimos de muitos cidadãos que têm medo da mudança, da competição nos serviços públicos ou no mercado de trabalho e temem a insegurança social ou identitária. Todos estes desafios não podem ser descartados e devem ser enfrentados. Ignorá-los seria irresponsável. Escutá-los e dar-lhes respostas é o caminho para uma sociedade mais coesa. Um Estado democrático e aberto tem precisamente a missão de proteger os mais frágeis e, ao mesmo tempo, acolher com dignidade quem chega com vontade de trabalhar, viver em paz e contribuir para a nossa vida coletiva. A imigração exige políticas públicas articuladas com regras claras para entrada e permanência e combate à exploração laboral e ao tráfico humano, necessita de investimento em serviços públicos que sirvam todos e de estratégias de integração que promovam a convivência e o respeito mútuo. E não há razão para pensar que não seremos capazes o fazer. Portugal tem experiência de emigração e de acolhimento, tem instituições democráticas, uma sociedade civil ativa, comunidades imigrantes organizadas e uma cultura de abertura que pode e deve ser reforçada.

O verdadeiro debate sobre a imigração não é sobre “eles”. É sobre “nós”. Sobre quem somos e, sobretudo, sobre quem queremos ser. Se queremos ser uma sociedade fechada, presa ao medo e à desconfiança ou se temos a confiança numa comunidade aberta, guiada por princípios humanistas, que alia dignidade, solidariedade, inteligência económica e responsabilidade social para enfrentar o futuro com coragem. Reconhecendo a humanidade alheia fortalecemos a nossa e a escolha está nas nossas mãos para construirmos uma comunidade mais rica, mais dinâmica, mais humana e mais democrática. Com as pessoas e para as pessoas.

Professor Convidado IEP/UCP e NSL/UNL

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