A “revolução” já está a acontecer, mas não é a de André Ventura
A primeira reunião do Grupo de Trabalho (GT) criado pela ministra da Administração Interna para reformular a formação nas forças de segurança e adaptá-la aos diferentes contextos sociais onde atuam, aconteceu na passada sexta-feira.
Nada foi noticiado, tendo em conta os episódios de violência que ainda se viviam na Grande Lisboa, mas o que sucedeu é algo que merece ser enaltecido.
Discretamente, longe dos holofotes, onde realmente trabalha e vai deixando a sua marca, Margarida Blasco conseguiu começar a realizar um plano que já tinha desde que foi inspetora-geral da Administração Interna.
Apesar de o anterior Governo o ter deixado na gaveta, Blasco não esqueceu, nem desistiu das lições aprendidas em 2015, quando seis moradores da Cova da Moura, entre os quais Flávio Almada que é atualmente um dos porta-vozes do movimento Vida Justa, foram brutalmente agredidos na esquadra da PSP de Alfragide, crime pelo qual foram condenados um chefe e sete agentes da PSP.
As perguntas que nos últimos dias se têm colocado sobre que formação têm os agentes que patrulham as zonas de bairros como a Cova da Moura ou Zambujal, foram também colocadas nessa altura. No âmbito de uma auditoria inédita feita pela Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), que identificou, entre outros, falta de preparação dos polícias para os diferentes contextos sociais em que atuam, foi recomendada uma “reforma no sistema” e uma “especialização dos polícias de acordo com as áreas de intervenção”.
Só agora Margarida Blasco conseguiu ter poder executivo para recuperar esse trabalho criando este GT com representantes das forças de segurança e dos respetivos estabelecimentos de ensino e determinando que lhe apresentem uma “estratégia pedagógica” já no próximo dia 16 de dezembro.
“A evolução e constante dinâmica dos contextos, sejam eles sociais, económicos, criminológicos e de insegurança, aos níveis local e regional e sobretudo culturais das comunidades que as forças de segurança servem, implicam alterações no seu modelo organizativo, adequando-as aos novos contextos, de molde a construir uma relação integrativa das forças de segurança com as comunidades, minimizando-se, assim, os riscos que potenciem atuações desviadas da legalidade”, está escrito no despacho que assinou a nove de setembro passado, muito antes da morte de Odair Moniz, na qual estão envolvidos dois jovens agentes de 21 e 27 anos.
É esta a mais importante e decisiva “revolução” que está a decorrer. A que aproxima forças de segurança de todas as comunidades que deve proteger. A que une e reforça a confiança dos cidadãos nas suas polícias.
Não a que almeja André Ventura, para pôr fim ao "sistema dos últimos 50 anos", diga-se a Democracia. Uma revolução que faz pontes, não uma racista e xenófoba que separa e cava trincheiras profundas. Onde o medo se junta ao ódio e divide. Onde, certamente, não há justiça, nem paz.