A ministra da Saúde, afinal, deve demitir-se?
Tivemos Gandra d’Almeida, diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde, louvado e medalhado em agosto pelo ministro da Defesa, Nuno Melo, após proposta da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, “pela forma excecionalmente dedicada e competente, bem como pela nobre conduta, integridade e profissionalismo com que exerceu as suas funções como diretor da Delegação Regional Norte do Instituto Nacional de Emergência Médica entre 2021 e 2024”.
Tivemos o mesmo Gandra d’Almeida a demitir-se do cargo de diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde, para o qual fora nomeado em maio, depois de se ter descoberto que acumulara indevidamente funções na Emergência Médica com trabalhos em Urgências hospitalares, pagos através de uma empresa que fundou com a mulher, uma esperteza que contornava a incompatibilidade.
Este comportamento até pode eventualmente ser legal, mas não parece ser digno da citada “nobre conduta, integridade e profissionalismo” constante no louvor.
Tivemos uma ministra da Saúde e um primeiro-ministro a afirmarem publicamente que não sabiam, nem tinham sido informados da existência dessa incompatibilidade de funções do tenente-coronel que chamaram para dirigir o SNS, o que legitimamente os ilibava da acusação de terem sido cúmplices ou coniventes com a alegada falcatrua.
Tivemos a notícia de que, afinal, a CRESAP, entidade que aprovou a nomeação de Gandra d’Almeida, não sabia que ele fizera Urgências no Algarve (o tema da notícia que espoletou o caso), mas sabia que fizera o mesmo em Gaia e que o Governo omitiu essa informação na resolução do Conselho de Ministros, assim como no comunicado de imprensa feito a anunciar a nomeação para diretor do SNS.
Estes factos levantam a suspeita de que, por um lado, a CRESAP não foi diligente para apurar se o serviço em Gaia era compatível com o trabalho no INEM e, por outro lado, faz parecer que, afinal, o Governo tinha consciência de que havia ali um problema, o que, se assim for, e, ao contrário do que inicialmente me parecia, passa a colocar responsabilidades políticas claras em Ana Paula Martins, agravadas pela sucessiva acumulação de múltiplos “casos” no setor, que ela parece sistematicamente agravar em vez de resolver, piorando, em vez de melhorar, a herança deixada pelo Governo PS.
Sendo assim, a ministra da Saúde devia demitir-se? A esta pergunta, salvo melhor informação, tenderia agora a responder que sim e, provavelmente, seria acompanhado nessa opinião por muitas outras pessoas se, entretanto, as atenções não se tivessem desviado...
... acontece que agora isso não interessa nada. porque andamos entretidos com o caso do deputado do Chega, Miguel Arruda, que é suspeito de roubar malas no aeroporto e incrédulos perante a forma como o Bloco de Esquerda explica mal despedimentos de funcionárias grávidas ou mães recentes, sem antes ter pedido parecer da CITE, a comissão tripartida (Governo, sindicatos e patronato), que se encarrega de acompanhar esse tipo de processos. O PSD agradece.
Há, porém, algo incontestável: a miséria humana que nos entretém o noticiário diário ilustra, todos os dias, a angustiante pequenez dos nossos protagonistas políticos.
Jornalista