A difícil missão de educar na era tecnológica
É difícil permanecer indiferente ao tema da série Adolescência, da Netflix. Sem querer revelar demasiados detalhes, é a história de um rapaz de 13 anos que é acusado de assassinar uma colega da mesma idade, tendo como pano de fundo uma subcultura da chamada “manosfera” que leva adolescentes a serem vítimas de bullying e a terem comportamentos agressivos para com as mulheres. E para tornar o assunto ainda mais atual em Portugal, três jovens foram ontem detidos em Loures por suspeitas de violação de uma adolescente de 16 anos, com o crime a ser filmado e divulgado nas redes sociais. É caso para nos questionarmos: o que explica o aumento destes casos? O que estamos a fazer de errado, enquanto sociedade, para que a violência juvenil continue a aumentar de ano para ano? Onde falhamos como pais e educadores?
Entre outros fatores que poderão ajudar a responder a estas questões, diria que existe um denominador comum que não podemos ignorar, que é a tecnologia. Ou, para ser mais exato, o uso que fazemos da internet. Como todas as tecnologias que a Humanidade desenvolveu nos últimos milénios, a internet tem coisas boas e más, dependendo do uso que fazemos dela.
A violência, a intolerância, o machismo, a discriminação e o bullying sempre existiram. Onde há seres humanos, este tipo de problemas também existe. Os adolescentes sempre demonstraram ser capazes das maiores maldades uns para com os outros. Não é nada de novo. O que a tecnologia fez, sobretudo desde o advento da internet e das comunicações instantâneas, foi exponenciar quase até ao infinito estes e outros aspetos negativos da condição humana.
Isto afeta a qualidade da nossa democracia, com a polarização e a ascensão dos radicalismos, mas também tem consequências na vida privada e familiar. Até há poucos anos, os mais novos podiam ser relativamente resguardados dos males do mundo, passando a maior parte do tempo em ambientes controlados. Mas, com as redes sociais passaram a estar expostos a todo o tipo de influências externas. Se antigamente o bullying era presencial e exercido em contextos onde poderia ser mais facilmente detetado, hoje ocorre em interações na internet, onde por vezes a vítima nem (re)conhece o agressor. Os quartos dos nossos filhos, que deveriam ser espaços seguros por excelência, passaram a alojar portais por onde entram todo o tipo de ideias, sem que, muitas vezes, tenhamos conhecimento disso. É como se existisse uma porta aberta para a rua.
O que fazer para combater este fenómeno? O caminho tem de passar pela prevenção, com os adultos a controlarem os conteúdos a que as crianças acedem. Para isso, precisamos de investir na literacia tecnológica dos educadores. Mas precisamos, sobretudo, de uma educação com valores, que incentive a comunicação, a empatia e o respeito pelas outras pessoas. E, por fim, é hora de pensar em novos modelos de organização do trabalho que permitam que as crianças tenham os seus progenitores presentes nas suas vidas.
Diretor do Diário de Notícias