A cidade sente o que os relatórios não mostram: As cifras negras

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Lisboa vive um paradoxo. Os relatórios oficiais dizem que a criminalidade está estável. Mas nas ruas, nas conversas, nos grupos de bairro, o sentimento é outro; algo não está bem.

Essa diferença tem nome: Cifras negras.

São os crimes que acontecem, mas não entram nas estatísticas. Porque não foram denunciados. Porque a vítima desistiu. Porque ninguém quis ver.

O crime não denunciado não deixa de existir. Deixa é de contar. E quando o que conta para o Estado não é o que conta para os cidadãos, a confiança nas instituições começa a ceder.

Essa clivagem entre os números e a realidade vivida abre espaço a algo mais perigoso: A exploração política do medo.

As cifras negras impedem a resposta adequada por parte das forças de segurança. Se não há registo, não há patrulha. Se não há queixa, não há prevenção. E se os relatórios dizem que não há problema, como justificar a ação? O resultado é um sistema que reage a dados incompletos e deixa comunidades inteiras sem a devida proteção.

Esta ausência cria um vazio e os vazios, na política, nunca duram muito tempo. Preenche-os quem provoca mais ruído, não quem tem mais razão. É nesse espaço que entra a retórica fácil da extrema-direita: “Se o Governo e a Câmara Municipal de Lisboa dizem que está tudo bem, porque é que continuamos a sentir medo?” A pergunta parece simples,

mas esconde uma armadilha. Porque o objetivo não é melhorar a segurança, mas sim alimentar a perceção de abandono.

E é por isso que temos de ser claros; o sentimento de insegurança é real. E não deve ser ignorado nem instrumentalizado. Deve ser compreendido e enfrentado com políticas públicas inteligentes, humanas e corajosas. Isso é exatamente o que Carlos Moedas tem feito.

Ao reforçar a Polícia Municipal, ao investir em iluminação pública, ao cuidar dos espaços urbanos abandonados e ao dar prioridade à escuta ativa da população, a Câmara de Lisboa está a agir onde é mais difícil: No quotidiano.

Está a combater não apenas o crime, mas a perceção de abandono. Porque uma cidade bem gerida não é só aquela que tem bons números. É aquela onde as pessoas se sentem protegidas, respeitadas, ouvidas.

Lamentavelmente, há quem confunda política com cartazes e likes. Há quem transforme cada episódio isolado num argumento de colapso. Mas não se governa com indignação permanente. Governa-se com responsabilidade.

E responsabilidade é dizer: “Sim, existem cifras negras. Sim, há medo nas ruas. Mas não deixaremos que o medo se torne política”.

Lisboa precisa de confiança. E confiança constrói-se com proximidade, dados reais e ação firme. Nem com negacionismo, nem com populismo.

Se os relatórios não mostram o que a cidade sente, é aos líderes responsáveis que cabe agir antes que os extremos tomem conta da narrativa.Porque quem sente medo precisa de segurança. Mas quem sente que ninguém o ouve... vota em quem promete gritar."

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