O painel com Leonídio Paulo Ferreira, Isabel Nunes, Ana Paula Brandão, general Luís Valença Pinto e Marcos Perestrello.
O painel com Leonídio Paulo Ferreira, Isabel Nunes, Ana Paula Brandão, general Luís Valença Pinto e Marcos Perestrello.Leonardo Negrão

Defesa europeia: "Não há dissuasão credível sem capacidades militares credíveis"

"Onde estamos. A Europa na Encruzilhada" foi o primeiro painel da Grande Conferência do DN sobre Defesa Nacional
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O general Luís Valença Pinto, antigo chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e atual presidente da EURODEFENSE, lamentou que tenha havido "negligência política" nos últimos 15 anos em Portugal em matéria de Defesa, falando da "mitificação" da meta e do "soundbite" dos 2% a nível dos parceiros da NATO quando "o que é preciso é convergir em matéria de capacidades militares".

Já o deputado Marcos Perestrello, presidente da Assembleia Parlamentar da NATO, lembrou que em matéria de Defesa Europeia "não há uma dissuasão credível sem capacidades militares credíveis."

O general e o deputado foram dois dos intervenientes no primeiro painel da Conferência DN, subordinado ao tema "Onde estamos. A Europa na Encruzilhada", que contou com a participação também da diretora do Instituto de Defesa Nacional, Isabel Nunes, e da professora Ana Paula Brandão, do Centro de Investigação em Ciência Política da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho. O painel foi moderado pelo diretor adjunto do Diário de Notícias, Leonídio Paulo Ferreira.

O general começou por dizer que a guerra na Ucrânia "trouxe a constatação da insuficiência europeia" em matéria de Defesa, enquanto a eleição do presidente norte-americano, Donald Trump, trouxe "a tomada de consciência da Europa de que não está em condições de assegurar a sua própria defesa".

Diante deste cenário e apesar dos planos "maravilhosos" que estão a ser feitos nesta área, o general lembra, contudo, que a Europa não se conseguirá por enquanto aguentar sozinha e ainda precisará de apoio nos próximos cinco, oito ou dez anos, "desejadamente dos EUA".

Isabel Nunes lembrou que a aposta europeia na Defesa não vem de agora e é algo que já começou já em 2016, com a constituição de um mecanismo de cooperação, um fundo de financiamento que permitisse alocar projetos e um financiamento mais estruturado. Mais recentemente há a questão da bússola estratégica, a estratégia para a indústria de defesa e o "white paper".

Uma aposta, segundo a diretora do Instituto de Defesa Nacional, "contínua, coerente e consistente, que pretende reforçar a autonomia estratégica da Europa e soberania". Expressões que, disse, são por vezes mal compreendidas.

A professora Ana Paula Brandão, sobre a ideia de uma Europa a várias velocidades na questão da política de Defesa, lembrou a questão do euro e o "opting-out" para falar de uma possível "geometria variável", em que participam os estados que querem e que podem.

A professora falou do duplo desafio de enfrentar, a nível dos 27, uma grande diversidade de políticas públicas e também uma diversidade em temos de capacidades, dimensão, vontade política e percepção das ameaças.

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O presidente da Assembleia Parlamentar da NATO, o deputado Marcos Perestrello, defendeu que é perfeitamente conciliável a ideia de uma Europa da Defesa com a NATO, dizendo que seria impensável criar uma estrutura que deixe de fora parceiros como o Reino Unido, a Noruega ou a Turquia.

Mas o deputado quis referir também que a ameaça atual vai para lá da questão da defesa. "Assentámos a arquitetura de segurança mundial numa estratégia de reforço do multilateralismo, de progressiva abertura do comércio, na partilha de um conjunto de valores democráticos comuns a uma parte do mundo, que se designa Ocidente."

Algo que, refere, está em risco. "O grande vencedor sistémico desta arquitetura, os EUA, são a potência que está a criar as grandes disrupções", resumiu. "No domínio da defesa, minando a relação transatlântica, no domínio do comércio, onde está a querer fechar o comércio, no domínio do multilateralismo e também no plano democrático. Porque constatamos uma alteração da forma como os EUA veem o funcionamento dos mecanismos democráticos".

Marcos Perestrello defendeu ainda que "o que a Europa tem que perceber é que não há uma dissuasão credível sem capacidades militares credíveis. E é isso que têm que construir". E lembrou que "a despesa militar cresceu, mas as capacidades militares não cresceram na mesma proporção", sendo isso que precisa de ser tido em conta.

Em relação a Portugal, o general Luís Valença Pinto disse que os militares não reivindicam, apontam necessidades. E que as necessidades portuguesas estão muito abaixo do padrão europeu. "Houve negligência política, distração se quiserem que seja mais brando, e agora estamos todos a acordar."

Lamentou o soundbite dos 2% de investimento do PIB, mostrando-se convicto de que da próxima cimeira da NATO os países vão sair agarrados a dois indicadores. Os 2% "gastos ou declarados", ou seja, os que ainda não atingiram essa meta vão ter que dizer como a vão alcançar. E os 3,5% de meta para 2030.

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Em relação à ideia de um exército europeu, o general lembrou que a NATO não tem um exército próprio e é a organização mais forte do mundo. 

Em resposta, o deputado Marcos Perestrello contou a história do antigo chefe do Estado-Maior da Armada, quando se falou muito da criação de uma guarda costeira em Portugal, dizia: “Como é muito caro ter uma Marinha, se calhar melhor é ter duas.” E, brincou, assim estamos em relação a um exército europeu, “como é muito caro ter 27, se calhar é melhor ter 28”.

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