Primeiro ano de Trump: muitos tweets e poucas mudanças
Nos últimos meses, o USA Today acompanhou um grupo de eleitores de Donald Trump, colocando-lhes questões sobre a atuação do presidente. Passado um ano sobre a eleição do milionário para presidente, todos concordam que os tweets desenfreados são a pior parte da presidência do republicanos. Já sobre a melhor parte, as opiniões divergem. Até porque se nomeou Neil Gorsuch para o Supremo Tribunal, retirou a América do acordo do Clima de Paris, suspendeu o programa que autoriza os filhos de imigrantes ilegais a estudar e trabalhar nos EUA e tem em construção os protótipos para o muro com o México, Trump não conseguiu aprovar um substituto para o Obamacare e a reforma fiscal ainda está a ser negociada.
Provando que se enganaram os que acharam que ele ia suavizar a retórica e tornar-se mais "presidenciável" após sentar-se na Sala Oval, Trump continua fiel ao estilo imprevisível e combativo. "Volatilidade é a palavra que melhor define o estilo do presidente e a sua prática. Como ele terá rapidamente assimilado, a governação política é distinta da de uma empresa", explica ao DN Mário Avelar. Para o professor catedrático de Estudos Anglo-Americanos da Universidade Aberta, esta constatação explica em parte os "atritos no Congresso com o partido que o apoia" e que se revelaram fatais quando tentou revogar o Obamacare e aprovar a sua reforma da saúde.
Entre os eleitores ouvidos pelo USA Today, vários culpam o feudo com o Partido Republicano pela falta de produção legislativa do presidente. É o caso de Patricia Shomion, do Ohio, que admite: "Eles ainda não fizeram nada e agora estão a lutar uns com os outros. Não vejo que as coisas vão melhorar". Monty Chandler, um ex-militar do Louisiana , vai mesmo mais longe: "Se ele conseguir aprovar as leis, será um grande presidente. Senão, será apenas um tipo que não conseguiu ultrapassar o Congresso".
Desemprego mínimo
Com o desemprego nos 4,1% (o mais baixo em 17 anos), a economia americana a crescer 3% no terceiro trimestre e a confiança dos consumidores em alta, Trump não esconde o orgulho neste sucesso económico do seu primeiro ano na Casa Branca. Mesmo se este se deve em muito às reformas impostas por Barack Obama, o presidente que em 2009 recebeu de George W. Bush um país ainda a sair da crise financeira.
A próxima grande batalha de Trump - que vai assinalar o primeiro aniversário da sua eleição na China, onde tem hoje encontro com o presidente Xi Jinping - é a reforma dos impostos. Entre as dúvidas sobre como financiar um projeto que fala em gastos de 1,5 biliões de dólares mas que os peritos estimam poder chegar aos 2,4 biliões e as suspeitas de que a reforma vai beneficiar os mais ricos (ao abolir o imposto sucessório), o presidente precisa de todos os votos republicanos, apesar de alguns eleitos já terem manifestado reticências. Depois do fracasso da reforma da saúde - chumbada no Senado com votos contra de vários republicanos, esta é a última hipótese que o presidente tem de aprovar legislação de peso antes do fim do ano. E cumprir uma promessa eleitoral.
Muro em espera
Outra promessa em espera é o muro na fronteira com o México. A barreira que Trump espera vir travar a entrada nos EUA de ilegais e reduzir o tráfico de droga na fronteira ainda não recebeu luz verde do Congresso para o seu financiamento. É que se o presidente americano sempre disse que seriam os mexicanos a pagar a obra, a verdade é que se estima que esta tenha um custo de 21,6 mil milhões de dólares e o México não parece disposto a dar um cêntimo.
Travada, mas pelos tribunais, foi a iniciativa de Trump para reduzir a imigração - o chamado travel ban, que proibia a entrada nos EUA de refugiados (durante três meses) e de pessoas naturais de sete países de maioria muçulmana (Irão, Iraque, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iémen). Entretanto, o Iraque e Sudão saíram da lista, a que se juntou Chade, Coreia do Norte e responsáveis venezuelanos. Esta proibição foi ela também bloqueada nos tribunais.
Em termos sociais, em abril Trump assinou um decreto a cortar financiamento federal ao programa de planeamento familiar Planned Parenthood e em setembro foi o Senado a rejeitar a sua proposta de cortes no orçamento da educação.
Grandeza americana
Com três ex-colaboradores indiciados esta semana por ligações à Rússia (a juntarem-se às várias demissões na sua equipa devido ao inquérito ao alegado envolvimento de Moscovo nas presidenciais), o primeiro aniversário da sua vitória eleitoral coincide com a viagem de Trump à Ásia. São 12 dias e cinco países - Japão, Coreia do Sul, China, Vietname e Filipinas - com o nuclear da Coreia do Norte a marcar a agenda. A política externa é uma das áreas onde o estilo de Trump mais tensões tem causado. Talvez por o mundo não estar habituado a ter um presidente americano a governar pelo Twitter.
Mas parece que o mundo vai ter de aprender a lidar com Trump. "Quando falamos de "mundo", temos de ter presente algo óbvio: ele não existe; existem, sim, "mundos", com interesses próprios quer no plano económico quer no geoestratégico", explica Mário Avelar. Para o académico, "falar da relação dos EUA com a NATO, é distinto de falar da relação com os países asiáticos, no seio dos quais existem também realidades e interesses distintos".
Crente no lema "Make America Great Again" (Tornar a América Grande Outra Vez), Trump não hesita em subir a retórica até deixar o mundo preocupado com um conflito com a Coreia do Norte. Mas não é só com Kim Jong-un que o presidente americano protagoniza tensões. Mesmo os aliados da NATO não esconderam certo desconforto na primeira cimeira de Trump, em maio, em Bruxelas.
E se as presidenciais foram há um ano, nos EUA já se olha é para as intercalares de novembro de 2018. "Historicamente, as eleições intercalares estão ligadas a perdas por parte do partido do presidente", recorda Mário Avelar, sublinhando estar em causa "a possibilidade de os Democratas voltarem a ganhar a maioria na Câmara [dos Representantes]". Mas admite: "Se isso vai estar ligado a uma onda de fundo, já será mais difícil de prever".