"Agressão russa uniu o espírito da nação ucraniana"

Entrevista a Stepan Kubiv, primeiro vice-primeiro-ministro da Ucrânia e ministro do Desenvolvimento Económico e do Comércio, que fala da situação de guerra no leste do país, mas também do sucesso dos imigrantes em Portugal.

Veio a Portugal para tentar aprofundar a cooperação económica, mas há uma questão que surge de imediato: de que forma é que o conflito militar que existe no leste da Ucrânia e a anexação da Crimeia pela Rússia afeta a atratividade do país em termos de investimentos?

Primeiramente, ninguém estava à espera que em 2014 a Rússia agredisse a Ucrânia de forma direta. A segunda força militar do mundo, enquanto do outro lado estavam as tropas ucranianas, a parte militar da Ucrânia, que foi destruída ao longo dos 20 anos, parcialmente pela Rússia também. Deste conflito resultou que perdemos 20% da economia. Como deve calcular, perdemos 80% das exportações porque esses 80% iam para a Rússia e os países aliados da Rússia. Nós perdemos também o controlo de 7,2% do território, incluindo a Crimeia. Mas essa agressão russa, por outro lado, uniu o espírito da nação. E a escolha, a opção da revolução da dignidade, foi a integração europeia. Ou seja, a integração sistemática na União Europeia. E o facto de haver esse espírito unido fez com que, nas eleições, o presidente Petro Poroshenko conseguisse ganhar com uma percentagem de 53%. E nestes 27 anos da independência da Ucrânia esta situação foi, de facto, a mais difícil. Devo realçar que este foi um desafio com o qual conseguimos lidar. Nós conseguimos criar umas forças militares poderosas. Críamos uma grande ligação com os países da NATO e da União Europeia e toda a exportação que antes era feita para a Rússia conseguimos redirecioná-la para os países europeus. E nesse período de agressão da Rússia e de anexação da Crimeia, começámos várias reformas globais, a militar, a económica, a da descentralização, a da desregulamentação, a médica, a da educação e a das pensões. Com isto tudo conseguimos umas reformas legislativas que são 144 leis tomadas em pouco mais de ano e meio. E assim nos últimos dois anos da guerra híbrida conseguimos o crescimento da economia.

Qual é, atualmente, a taxa de crescimento económico da Ucrânia?

Não estamos à espera de menos de 3%. Porém, daqui a dois anos, temos a expectativa de crescer 5%. Estamos a pensar que em 2019/20/21 já conseguiremos chegar a 5%. O nosso objetivo é atingir 6% ou 7% mais adiante. Mas precisamos de inovações, da modernização e abertura da economia, estratégias externas de exportação, cooperações e conjuntos de empresas e formação de um novo modelo de economia, finanças públicas e queremos criar a cadeia de um valor adquirido sobre a realização dos produtos internamente. Assinei um acordo com o lado português. E se comparar 2016 e 2017, a exportação de produtos entre Ucrânia e Portugal cresceu 16%. Era exportação de vários produtos e serviços, um mix de tudo. Hoje estamos a falar não só de exportação de matéria-prima, mas sim de produtos já feitos, tecnologias da informação, energia verde, espaço, construção, indústrias de calçado e têxtil, vinho e cultura. E também turismo. Temos hoje representantes de empresas portuguesas na Polónia que de certa forma também ajudam na troca de contactos com os ucranianos, porém, parece-nos que faz todo o sentido ter alguém delegado de Portugal na Ucrânia.

Qual a importância da comunidade ucraniana em Portugal para estas relações?

Devo dizer que 37 mil ucranianos em Portugal é uma grande diáspora. Quero agradecer ao Governo e ao povo português pelo acolhimento que foi feito aos ucranianos, de modo que eles conseguem sentirem-se confortáveis no seu dia-a-dia e conseguem conservar as suas tradições. Os ucranianos em Portugal podem ajudar a desenvolver as relações bilaterais, até porque, devido historicamente à nossa mentalidade cristã e tradicional, temos muitas semelhanças.

Mas o facto de essa comunidade estar bem integrada e de falar português pode ser um trunfo para as empresas portuguesas investirem na Ucrânia e nas ucranianas investirem em Portugal? Ou seja, o facto de haver pessoas que conhecem as duas culturas, que falam as duas línguas, pode facilitar a parte da troca económica?

É uma facilidade em comunicação porque não existe barreira linguística. Já funciona mas estamos a falar de pequenos e médios negócios. E neste caso resulta porque já conhecem como é feito o negócio cá e na Ucrânia. Podemos ambicionar mais. Estou a pensar nas crianças que nascem cá e que têm crescido com uma mentalidade europeia, podemos falar depois de uma visão global, de negócios em grande escala. Estamos a falar dos engenheiros e dos matemáticos, dos técnicos e especialistas em agricultura, a falar de técnicos em altas tecnologias, em construção, em construção naval e área militar. Também, por exemplo, a construção aérea. Só que a construção destes negócios não pode ser feita de um dia para o outro. É pelo menos um programa de cinco anos. Porém os negócios pequenos, os negócios privados gostava que se resolvem num ano.

Estando a integração na União Europeia no horizonte distante qual o próximo passo que a Ucrânia espera dar em termos de aproximação com a União Europeia? Qual o passo realista que pode ser dado?

A principal questão estratégica do país é conseguir a paz. E a seguir vem a participação na União Europeia e na NATO. Esta perspetiva de ação é uma perspetiva de longo prazo. Relembro que na revolução da dignidade, na praça Maidan em Kiev, em fevereiro de 2014, foram mortas uma centena de pessoas que simplesmente se manifestavam para que a Ucrânia fizesse parte da Aliança e da União Europeia. E quero deixar bem claro que o presidente, o governo e o parlamento trabalham hoje em uniformidade e em união para a condução do país neste tempo difícil.

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