Menos viagens e microcelebrações. Americanos celebram Ação de Graças em pandemia
O Dia Ação de Graças é assinalado na última quinta-feira de novembro e tem origem em 1621, quando se diz que os colonizadores ingleses partilharam uma refeição com os nativos da tribo Wampanoag.
Um dos feriados mais importantes do calendário nos Estados Unidos, o Dia de Ação de Graças costuma levar milhões de pessoas a viajarem para junto das suas famílias, sendo uma tradição mais importante até do que o Natal. Neste ano, com a covid-19 a arrasar o sistema de saúde e o número de novas infeções mais alto desde que a pandemia começou, muitos norte-americanos decidiram ficar em casa e não arriscar. A Ação de Graças, sinónimo de peru recheado e grandes ajuntamentos familiares, será um feriado mais solitário para muita gente, num ano em que várias outras celebrações também foram canceladas.
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"Não vou poder ir nesta Ação de Graças e provavelmente também não irei no Natal", disse ao DN a gestora de desenvolvimento de negócio Alicia Zendejas. "A minha mãe e eu temos o sistema imunitário debilitado. Não quereria expô-la a alguma coisa e ela ficaria demasiado preocupada se eu me metesse num avião, por isso encomendei jantar de um restaurante local para o Dia de Ação de Graças." Para Alicia Zendejas, a distância é um dos maiores problemas, já que teria de se deslocar de Nova Iorque à costa oeste, e tudo acarretaria riscos. A alternativa é usar tecnologia. "Vou falar com a família ao telefone e nas redes sociais durante as festas", explicou. "É a melhor coisa que posso fazer por toda a gente."
A decisão de Alicia vai ao encontro do que governadores e autoridades de saúde têm pedido aos norte-americanos: não viajem na Ação de Graças, especialmente se for para fora do respetivo estado. O Centro de Controlo e Prevenção de Doenças pediu aos cidadãos para adiarem viagens e ficarem em casa, sublinhando que os Estados Unidos estão a reportar mais de um milhão de casos novos por semana. No final da semana passada, foi batido um novo recorde, com 196.500 novas infeções num só dia. Com 12,6 milhões de infetados e 260 mil mortos, é o país mais afetado pela pandemia de covid-19. A subida exponencial de infeções pode tornar-se muito pior depois da Ação de Graças, avisam as autoridades de saúde. Mas apesar de no último fim de semana os aeroportos terem visto um aumento significativo da atividade, os indicadores apontam para que uma grande parte dos norte-americanos realmente fique em casa ou opte por celebrações bastante mais comedidas do que o habitual.
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É o que fará Gaby, que mora em Venice e não se vai deslocar para ver família. "Normalmente faço um 'Friendsgiving', com amigos", disse, referindo-se a algo que é quase uma tradição em Los Angeles, fazer uma festa de Ação de Graças com os amigos. "Se calhar é porque sou solteira em LA com muitos amigos solteiros, mas a noção de uma Ação de Graças com família está longe da minha cabeça agora."
A decisão de não viajar está a ser comum, e isso é visível nos números da aviação: de acordo com dados do LA Times, as reservas estão 60% abaixo do normal para esta altura do ano. No início de outubro tinha sido registado um aumento da compra de bilhetes de avião, mas essa subida desapareceu quando os números da pandemia pioraram. Várias companhias domésticas, como Southwest Airlines e American Airlines, também reportaram um aumento do número de cancelamentos.
Para muita gente, a alternativa é ir de carro, mesmo quando se trata de grandes distâncias. É o que farão Melissa e o parceiro, Michael, que irão de Los Angeles até ao Arizona visitar os pais dela. São mais de 800 quilómetros.
O Dia Ação de Graças é assinalado na última quinta-feira de novembro e tem origem em 1621, quando se diz que os colonizadores ingleses partilharam uma refeição com os nativos wampanoags.

O Dia Ação de Graças é assinalado na última quinta-feira de novembro e tem origem em 1621, quando se diz que os colonizadores ingleses partilharam uma refeição com os nativos wampanoags.
"Na Ação de Graças é comum ter uma refeição maior e um ajuntamento maior de pessoas da família do que no Natal", notou, apesar de neste ano serem apenas eles e os pais numa celebração tranquila, que nem terá de seguir a tradição do peru. "A verdade é que comemos peru uma vez por ano e não interessa o que lhe põem, é sempre seco. Ninguém gosta assim tanto de peru, é... boring", admite. "Supostamente é uma tradição, os peregrinos comiam, mas não me parece que a história seja mesmo assim." A longa distância valerá a pena, explicou, porque teme que pelo Natal a região volte a entrar em confinamento e não seja possível viajar.
Quando o problema não é a deslocação, a análise do risco é feita de outra forma.
"A minha bolha é composta por onze pessoas", explicou ao DN Katherine Soares, uma lusodescendente que vai celebrar o feriado com a família, em Nova Jérsia. "Vivemos todos a oito minutos de carro uns dos outros", referiu.
Inicialmente, ponderaram fazer uma celebração mais pequena e dividir-se entre duas casas, mas acabaram por concluir que faria mais sentido limitarem-se à bolha num só local. "Decidimos que, apesar da tristeza disto, devíamos passar o dia uns com os outros", disse Katherine. "Somos muito cuidadosos com as máscaras e já nos encontrámos anteriormente para jantares", afirmou, acrescentando que todos se submeteram a testes de covid nalgum momento desde que a pandemia começou.
Além de todo o simbolismo deste feriado orientado para a família, há também um cansaço pelas tribulações de 2020 - começando pela pandemia e terminando nas divisões políticas que culminaram na eleição de Joe Biden para a presidência. Mas para estimular aqueles que não se vão deslocar no feriado, a Zoom suspende nesta quarta-feira o limite de 40 minutos nas sessões com mais de duas pessoas, e vários meios de comunicação estão a divulgar dicas para celebrar em família usando tecnologia.
"Devo viajar na Ação de Graças?" é uma das perguntas mais pesquisadas no Google, de acordo com o Google Trends, assim como "Jogos Ação de Graças virtual" e "Como celebrar Ação de Graças durante a covid."
As tecnologias são as alternativas possíveis para quem não queira arriscar. No caso de Angela Simões, lusodescendente que vive no norte da Califórnia, esta é a primeira vez em 40 anos que a família paterna não faz um enorme evento por esta altura. "Esta será a Ação de Graças mais pequena que alguma vez tivemos, só nós e a minha mãe", disse. Uma alteração que provoca tristeza, "especialmente porque, para alguns de nós, é a única vez que vemos esse lado da família."
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