Londrinos regressam a casa discretos: "É tão triste"
No metro, semblantes carregados. Ninguém fala, o único som que se ouve são as informações sobre as estações
Westminster estava rodeada de turistas a fotografar e filmar a zona monumental, indiferentes às discussões do brexit, quando o som de três tiros paralisou toda a gente. Renato e Conceição Patrício viram logo a seguir um carro desfeito contra o gradeamento do palácio do parlamento britânico. Ao lado, o corpo de um homem. O SUV escuro vinha da ponte de Westminster e tinha atropelado duas dezenas de pessoas, mas o casal brasileiro não podia sabê-lo. O pânico substituiu o espanto, a polícia gritava "move, move!" e os dois fugiram como todos em volta. Momentos depois, a zona estava isolada pela polícia e um helicóptero tinha aterrado no local.
Passou pouco tempo até Renato, neurocirurgião do Rio de Janeiro, deixar o anonimato de turista para ser o centro das atenções das dezenas de jornalistas reunidos perto da ponte Lambeth, com a Abingdon Street vedada pela polícia. Conceição ficou de lado e deparou com outra brasileira, também ela Conceição, de Araponga mas residente em Londres, e pouco depois juntou-se Alceu, de São Paulo, que veio em negócios e foi surpreendido pelo atentado quando fotografava o Big Ben. Estavam chocados com o atentado, já classificado de terrorista pelas autoridades. Afinal, Conceição Patrício andava tão contente por poder passear na cidade sem medo, um ambiente tão diferente do que está habituada a viver no Rio de Janeiro: "Imagine, aqui posso usar ouro na rua, ninguém olha". Amanhã, parte para Roma e está inesperadamente preocupada: "Há poucos dias houve um atentado em Paris, agora em Londres. Será que Roma é segura?"
Jovens, Alexis e Melina, de Buenos Aires - desistiram das fotos do Big Ben e da Abadia de Westminster e procuram informações, fazem perguntas. Com cabelos coloridos, as norte-americanas Sarah, de New Jersey e estudante de História de Arte em Londres, e Jamie, uma californiana a estudar Psicologia, ontem de visita à amiga, dizem baixinho: "É tão assustador [It" so creepy]", enquanto enviam mensagens pelo telemóvel. Alguns residentes pedem informações a um jovem agente fardado, querem saber como chegar de um lado a outro com as ruas cortadas. Sobre o atentado, não fazem perguntas, só os turistas estão agitados e querem saber mais: "I can"t say anymore", responde o polícia sem levantar a voz.
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A expressão dos britânicos não tem a palavra medo nem susto. Dizem apenas: "It"s so sad". É isso que diz o motorista que bebe ao meu lado um copo cheio de café, para aquecer a longa espera: está ao serviço de um empresário retido no edifício do Parlamento. "É tão triste", é o que diz o homem que me ajuda a encontrar a estação de metro e prefere falar da exposição de David Hockney na Tate Britain quando passamos perto.
No metro, semblantes carregados. Ninguém fala, o único som que se ouve são as informações sobre as estações e as linhas de ligação, rematadas agora pelo aviso: "Westminster está fechado", sem comentários. Sem comentários dentro do comboio: os passageiros não trocam palavras, nem mesmo olhares de reconhecimento, de desconforto. Cada um está fechado no seu telemóvel, nas palavras cruzadas, na música dos headphones.
A rapidez da resposta policial e dos serviços de emergência foi assombrosa. Como o responsável do contraterrorismo da polícia metropolitana disse ao fim da tarde, numa breve conferência de imprensa à porta da Scotland Yard, estão treinados para um ataque como este embora desejassem que nunca acontecesse. A rotina retomou o seu caminho, e poucas horas depois, com as televisões em direto, os londrinos voltaram para casa enchendo os autocarros, o metro e os comboios, com o trânsito mais complicado no centro porque a zona de Westminster se mantinha cortada.
Ao fim da tarde, o rececionista do hotel mantinha o rumo. Ia atendendo os hóspedes com um sorriso educado, solícito. Mal viramos as costas, vira-se para a televisão, silencioso e atento. Ouço no Channel 4: "Atacaram os guardas de Westminster, logo eles que são sempre tão simpáticos, atenciosos com os turistas, prontos a tirar selfies com eles". E porque a normalidade tem de ganhar ao terror e à tristeza, começa um programa de culinária. E depois uma evocação da Princesa Diana.
Em Londres