Liu Xiaobo: o Nobel da Paz que saiu da prisão para morrer

Para o comité norueguês, Pequim tem "pesada responsabilidade" na morte do ativista, preso em 2009 e condenado a 11 anos

A liberdade não durou sequer três semanas. Liu Xiaobo, Nobel da Paz chinês em 2010, morreu ontem aos 61 anos, depois de ter sido libertado a 26 de junho por razões médicas. Os tratamentos não foram capazes de travar o avanço da doença, um cancro do fígado diagnosticado já em fase terminal. Liu estava atrás das grades desde 2009, condenado pelos tribunais chineses a 11 anos de prisão por "incitamento à subversão". Ajudar a escrever uma petição, conhecida como Carta 08, que exigia reformas políticas foi o crime que cometeu.

"O governo chinês tem uma pesada responsabilidade na sua morte prematura", escreveu ontem num comunicado Berit Reiss-Andersen, presidente do Comité Nobel Norueguês. "É perturbador que Liu Xiaobo não tenha sido transferido para uma unidade médica onde pudesse ter recebido tratamento adequado", acrescentou Reiss-Andersen, em alusão ao facto de ter sido negada a Liu possibilidade de sair do país para consultar outros especialistas.

A Human Rights Watch também foi cáustica para com o estado chinês, falando em "arrogância, crueldade e insensibilidade chocantes" por parte do governo de Pequim. "Mas a luta de Liu por uma China democrática e respeitadora dos direitos humanos e democrática continuará", acrescenta o comunicado da associação sediada em Nova Iorque, que apela ainda à libertação "imediata e sem condições" da viúva do ativista.

Liu Xia, pintora poeta e fotógrafa de 56 anos, encontra-se em prisão domiciliária desde que o marido foi agraciado com o Nobel da Paz, em 2010. Na altura, Pequim considerou a decisão da Academia norueguesa uma "obscenidade", por ter distinguido um criminoso acusado de subversão. A família nunca chegou a ver o prémio. Carl von Ossietzky, pacifista que morreu em 1938 na Alemanha nazi, foi o último Nobel da Paz a morrer sob vigilância estatal. A birmanesa Aung San Suu Kyi, em 1991, também foi homenageada com o prémio enquanto estava presa.

Liu Xiaobo, poeta e crítico literário, além de ativista pelos Direitos Humanos, ficará para sempre ligado às manifestações pró-democracia da praça Tiananmen, em maio-junho de 1989. Quando os protestos começaram a ganhar forma, Liu estava como professor convidado na Universidade de Columbia, nos EUA, mas decidiu fazer as malas e regressar a Pequim. Além de participar nas manifestações e de ter feito uma greve de fome de 72 horas, foi um dos responsáveis pela negociação que permitiu a saída pacífica da maior parte dos estudantes de Tiananmen. "Se não fosse pelo trabalho dele e de alguns outros a praça teria ficado num mar de sangue naquele dia 4 de junho", disse em 2010, em declarações ao The New York Times, Gao Yu, um veterano jornalista e ativista chinês.

Ontem a agência estatal de notícias chinesa, a Xinhua, para noticiar a morte, publicou apenas um texto em inglês, ressalvando que Liu teve acesso aos melhores especialistas do país na área do cancro. "A China perdeu um cidadão modelo que merecia respeito e adoração e não as penas a que foi sujeito", afirmou Terry Branstad, embaixador dos EUA em Pequim. Para Hu Jia, amigo de Liu, o Partido Comunista "quis mostrar a sua força, mostrar que controla as vidas das pessoas". Liu Xiaobo nasceu em 1955. Morreu ontem, aos 61 anos, no hospital de Shenyang, no nordeste do país.

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