"Magalhães morreu por se envolver num problema político local sem precisar"

Entrevista com Ambeth R. Ocampo, historiador filipino e professor na universidade Ateneo de Manila. Esteve em Lisboa para falar das Filipinas, o arquipélago que entra na história europeia com a morte de Fernão de Magalhães
Publicado a
Atualizado a

Quão importante é o português Fernão de Magalhães para a história das Filipinas?

A história nos livros escolares tradicionais credita a Magalhães a "descoberta" das Filipinas, mas uma história escrita de um ponto de vista filipino, em vez de ocidental, vê-o de forma diferente e reconhece a sua "chegada" em 1521 e enfatiza a sua morte nas praias da ilha de Mactan porque se envolveu desnecessariamente num problema político local.

Como é que a sucessiva colonização pela Espanha e pelos Estados Unidos explica a identidade nacional das Filipinas?

A falecida Carmen Guerrero Nakpil, ensaísta e presidente da Comissão Nacional de História, definiu-a melhor do que ninguém quando descreveu a nossa experiência colonial como "as Filipinas são um país que passou 300 anos num convento e 50 anos em Hollywood". Chegou a estar na moda nas décadas de 1960 e 1970 defender um retorno ao passado pré-espanhol, mas a colonização sucessiva da Espanha, dos Estados Unidos e também do Japão faz parte das Filipinas modernas e do filipino contemporâneo. Não se pode fazer recuar a história, assim a experiência colonial seja boa ou má forma define o que o filipino é hoje. Aceitamos o passado, agarramos o que é útil e ignoramos o que não é.

Há algumas minorias religiosas, sobretudo muçulmanos no sul, mas é possível dizer que o catolicismo trazido pelos espanhóis é o fator distintivo mais importante em relação aos outros países da região?

As Filipinas durante muitos séculos foi o único país católico no sudeste da Ásia, o que moldou as Filipinas para o melhor e para o pior.

Como descreve as relações entre as Filipinas e a China, no contexto do surgimento da China como uma superpotência? O mar do sul da China é um lugar de confronto ou de cooperação?

O registo arqueológico mostra que a porcelana chinesa foi exportada para as ilhas no século IX, bem antes da conquista espanhola no século XVI e da ocupação americana de 1898. Ao contrário da crença popular, o mais antigo amigo das Filipinas não são os Estados Unidos, mas sim a China. Influências culturais da China podem ser vistas na nossa língua, na nossa culinária, nos nossos hábitos e grande parte dessas influências nós mesmos nacionalizámos. Muitos filipinos têm ascendência chinesa, então a amizade é mais profunda do que a maioria quer admitir.

Quão forte é a democracia hoje no seu país?

Tem seus desafios, como as dinastias políticas, as famílias latifundiárias e os grupos de interesse que dominam cargos eleitos nos poderes Legislativo e Executivo, mas a democracia é forte nas Filipinas.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt