"Na Venezuela não há risco de guerra civil. 90% da população quer mudança"

O presidente da Assembleia Nacional, que há uma semana prestou juramento como presidente do país, afirmou estar à procura de uma saída política para o conflito
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O autoproclamado presidente interino da Venezuela, reconhecido pela Assembleia Nacional (presidida por ele mesmo) e por mais de 60 países, que se seguiram aos Estados Unidos de Donald Trump, respondeu às perguntas do jornal espanhol El País, afirmando que "nos próximos dias cumpre-se o ultimato, que é a base para outras ações importantes para nós como venezuelanos."

Juan Guaidó garantiu que "na Venezuela não há risco de uma guerra civil". Porquê?, perguntou retoricamente, "porque 90% da população quer mudança. A maioria do país quer mudança, há um parlamento que exerce as suas funções, há um presidente encarregado legitimamente com atribuições na Constituição, que estão à procura de uma saída política para o conflito. Os únicos que falam de violência e estão a exercê-la são Maduro e o seu regime. Os que alimentam uma tese como essa alimentam precisamente a violência."

Sobre a sua legitimidade como presidente, Juan Guaidó afirmou que esta "emana do voto popular. "Já que não houve eleições presidenciais em 2018 [considerando ilegítima a eleição de maio de 2018], o mandato de Maduro terminou a 10 de janeiro de 2019. Por isso, encontramo-nos perante um vazio na presidência, que o presidente da Assembleia Nacional deve ocupar, segundo o artigo 233 da nossa Constituição. Maduro insiste em usurpar as funções, sequestrar o poder e deixar em condições muito precárias os venezuelanos que hoje precisam de comer, precisam de alimentos, de medicamentos."

Citando novamente o artigo 233 da Constituição, Guaidó acrescentou ainda que este é claro sobre o que os passos fundamentais que se seguem: "Fim da usurpação, porque estamos em ditadura, um governo de transição que trate da emergência humanitária, que dê os passos necessários para reinstitucionalizar o país, e o Conselho Eleitoral Nacional, para ter uma eleição livre."

Quanto ao tempo que poderá levar a uma transição, respondeu: "Se amanhã, por exemplo, terminar a usurpação e iniciarmos o processo de transição, em seis, nove meses, máximo 12 poderíamos ter uma eleição livre."

Em relação às forças armadas, num artigo ontem publicado no New York Times, Guaidó afirmou que "a transição vai precisar do apoio dos continegentes militares. Tivemos reuniões clandestinas com membros das forças armadas e forças de segurança. Oferecemos amnistia àqueles que forem culpados de crimes contra a humanidade."

Depois de ontem o ministro da Defesa de Maduro, Vladimir Padrino, ter afirmado que "as armas estão prontas para defender o país e está também o espírito libertário, bolivariano, chavista das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB) para executar com força, eficácia e com mística e com espírito militar a tarefa constitucional que nos confere", Guaidó afirmou ao El País que acredita que os militares acabarão por ficar do lado da transição.

"Fizemos uma chamada clara das forças armadas. O Maduro tem as armas da república sequestradas, 27 sargentos torturados no sótão da DGCIM [Direção Geral da Contrainteligência Militar] para gerar medo", afirma, acrescentando ainda que "diz-se" que os autores destas torturas serão cubanos.

Ainda sobre a transição, Guaidó disse estar convicto de que o medo da população está a desaparecer. "Se nos perguntarmos quais são os elementos para uma transição, pareceria que temos todas as variáveis. Há que unificá-las."

Questionado acerca da possibilidade de uma intervenção internacional, responde não acreditar ser necessário chegar a uma etapa como essa, mas disse ter pedido proteção dos ativos e ajuda humanitária, como planeia fazer com a União Europeia. O Parlamento Europeu reconheceu nesta quinta-feira Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela. Também os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia reúnem-se entre hoje e sexta-feira em Bucareste, na Roménia, com a crise política na Venezuela no topo da agenda, nomeadamente após o ultimato europeu para eleições no país.

No artigo do New York Times, Guaidó diz já ter pedido apoio humanitário ao secretário-geral das Nações Unidas António Guterres, "assim como a várias agências humanitárias". "Comecei o processo de nomear embaixadores e de recuperar ativos nacionais no estrangeiro".

Sobre as possibilidades para o futuro de Maduro, disse ainda: "Pusemos sobre a mesa uma lei de garantia e de amnistia, algo a que nalguns países se chamaria justiça transitória."

Quem é e de onde vem Juan Guaidó, segundo o próprio

"Eu tinha 15 anos quando Hugo Chavez chegou ao poder em 1998", escreve Juan Guaidó no mesmo artigo do New York Times. Nesse ano, no estado de Vargas, onde vivia, as chuvas torrenciais mataram milhares.

"Perdi vários amigos, familiares, e a minha escola ficou enterrada pelo deslizamento de terras. A importância da resiliência ficou gravada na minha alma desde então." Quando, recorda, "ficou claro que sob [o regime de] Chavez o país estava a caminhar para o totalitarismo", juntou-se ao movimento estudantil.

Depois veio Maduro. Nos protestos de 2017 foi atingido pelas forças armadas. "Um preço menor comparado com os sacrifícios feitos pelos meus compatriotas", escreveu.

Notícia atualizada às 13.38 com o reconhecimento do Parlamento Europeu da presidência de Juan Guaidó

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