Medidas de Macron podem custar 8 a 10 mil milhões de euros e agravar o défice
23 milhões de pessoas viram a intervenção televisiva de 13 minutos do presidente francês Emmanuel Macron na segunda-feira à noite. O chefe do Estado francês anunciou o aumento do salário mínimo nacional em 100 euros para tentar acalmar a contestação desencadeada pelos coletes amarelos devido ao aumento do preço dos combustíveis.
O chefe do Estado, que decretou o "estado de urgência económica e social" em França, disse que o primeiro-ministro, Édouard Philippe, apresentará as suas propostas esta terça-feira aos deputados do país.
Entre essas medidas está a decisão de aumentar em cem euros por mês o salário mínimo (que atualmente é de quase 1500 euros), de não cobrar impostos sobre as horas extras dos trabalhadores desde janeiro (a medida era prevista só em setembro) ou de os reformados que ganham menos de dois mil euros por mês verem anulado o aumento na contribuição social. Há ainda a indicação do pagamento de um "prémio" no final de ano, mas caberá aos patrões decidir se o pagam (não terá imposto).
Em declarações feitas esta manhã à BFM TV, o ministro da Administração e das Contas Públicas, Olivier Dussopt, calculou que as medidas anunciadas por Macron "representam um custo entre os 8 e os 10 mil milhões de euros". Questionado sobre de onde virá o dinheiro, o governante respondeu que o governo "está a afinar as medidas" e a ver "como pode financiá-las".
Isto depois de, em declarações à RTL, o presidente da Assembleia Nacional francesa, Richard Ferrand, ter afirmado que a França terá de "aumentar o défice público" para financiar as medidas anunciadas por Macron em resposta à crise dos coletes amarelos.
Ferrand, do Partido Socialista, sublinhou que este aumento do défice público não será substancial e que será "estritamente temporário", uma vez que não haverá um efeito de acumulação das medidas económicas e fiscais já anunciadas. O mesmo responsável estimou, ainda, que França deverá recuperar para um défice inferior a 3% do PIB em 2020.
O ministro das Finanças, Bruno Le Maire, estimou, por sua vez, também em declarações à RTL, que os problemas relacionados com os coletes amarelos deveriam fazer a França perder 0,1 ponto percentual de crescimento no quarto trimestre, mas recusou rever as metas do governo.
Ouvido pela Reuters, Michel Martinez, economista da Societé Générale, afirmou que "quase com toda a certeza o défice público de 2019 ficará acima da margem dos 3% do PIB". A previsão do Orçamento do Estado francês para 2019 era de um défice público de 2,8 do PIB.
Citado pela Bloomberg, Giovanni Orsina, diretor da School of Government da Universidade Luiss-Guido em Roma, avisou que o aumento da despesa por parte da França vai dar novos argumentos à Itália de Matteo Salvini (da Liga) e Luigi Di Maio (do 5 Estrelas). "O aumento da despesa por parte de Macron vai encorajar ainda mais Salvini e Di Maio. Macron era suposto ser o líder exemplar e poupado das forças pró-europeias, mas se mesmo ele se vê forçado a desafiar as regras da União Europeia, Salvini e Di Maio vão aproveitar isso para mostrar que essas regras estão erradas".
Segundo as regras da Zona Euro, os países da moeda única europeia devem ter um défice inferior a 3% do PIB e uma dívida pública também inferior a 60% do PIB. Neste momento, a UE, que rejeitou de forma histórica a proposta de Orçamento do Estado do governo italiano para 2019 por esta apostar num aumento da despesa pública, está a pressionar Roma a ter um défice público de 2,4%.
Já esta terça-feira, o ministro da presidência do Conselho de Ministros de Itália, Giancarlo Giorgetti, próximo de Salvini, defendeu, em declarações à Ansa, que deve haver uma abordagem "razoável" em relação ao Orçamento de Itália. E sublinhou: "A França já violou as regras de limite do défice de 3% do PIB várias vezes. A Itália não".
Mas as medidas anunciadas não parecem ter sido suficientes para acalmar quem protesta. "Ele dá-nos migalhas. Ele acha que somos pardais e dá-nos migalhas", disse, revoltado, um manifestante ouvido em Dole pela BFM TV. Benjamin Cauchy, um dos porta-vozes do movimento dos coletes amarelos, considerou que o presidente "fez gestos significativos" mas "é preciso fazer melhor". Para sábado está marcada uma nova manifestação. No Facebook o evento Acte % Résistance ! conta esta terça-feira de manhã com 5,6 mil pessoas a dizer que vão e 22 mil interessadas.