Duas tragédias em quatro meses com modelo "revolucionário" da Boeing
No espaço de pouco mais de quatro meses, o Boeing 737-8 Max - que teve o seu batismo de voo em 2016 e só entre o final de 2017 e o ano passado começou a ser operado regularmente pelas companhias aéreas - já esteve envolvido em dois acidentes graves, que causaram a morte de um total de 346 pessoas.
A queda, neste domingo, de um aparelho da Ethiopian Airlines que ligava a capital Adis Abeba a Nairóbi, no Quénia, causou 157 vítimas. No dia 28 de outubro de 2018, um aparelho idêntico, operado pela companhia low cost Lion Air, da Indonésia, que ligava Jacarta à estância turística de Pangkalpinang, caiu no mar, custando a vida a 189 pessoas.
Coincidências às quais se soma o facto de ambos os aviões se terem despenhado pouco após a descolagem. No caso do voo da Lion Air, o acidente deu-se aos treze minutos de voo. Na Etiópia, a informação é de que o aparelho tinha também partido há poucos minutos quando caiu.
Na Indonésia, a Lion Air confirmou, após o acidente de outubro, que tinha sido detetado anteriormente um problema técnico no aparelho mas que este fora resolvido de acordo com os procedimentos previstos. Desta vez, há relatos do controlo de tráfego aéreo de Adis Abeba de que o aparelho mostrava "velocidade vertical instável após a descolagem".
Motivos mais do que suficientes para fazerem disparar os sinais de alarme em relação a este modelo específico da Boeing, ainda que não existam conclusões finais sobre as causas do acidente da Indonésia e, naturalmente, nada se saiba ainda de concreto e oficial sobre o que causou esta nova tragédia.
Tanto o fabricante norte-americano de aviões como a CFM International - parceria entre a General Electric e a Sfran que é responsável pelo fabrico dos motores - já manifestaram toda a disponibilidade para participarem na investigação, tal como tinham feito em outubro.
Oficialmente, nem os fabricantes, nem as autoridades aeronáuticas, nem as próprias companhias puseram ainda a hipótese de suspender a atividade destes aparelhos até que as causas dos acidentes sejam investigadas. No entanto, não é impossível que o venham a fazer.
O National Transport Safety Board (NTSB), agência governamental independente dos Estados Unidos, já confirmou que enviará uma equipa técnica de quatro pessoas à Indonésia para apoiar as investigações. E a autoridade de segurança aérea norte-americana, a Federal Aviation Administration (FAA), informou também estar a "monitorizar de perto" esta questão.
Na Indonésia, Alvin Lie, perito em aviação e antigo legislador, também já defendeu, segundo o Jacarta Post , que as autoridades devem estar preparadas para suspender a qualquer momento todos os voos com este aparelho.
No caso da Indonésia, as notícias iniciais após o acidente deram sobretudo ênfase à Lion Air, que já tinha tido problemas no passado, chegando mesmo a ser impedida de operar quer para os Estados Unidos quer para a Europa. Mas a Ethiopian Airlines é uma companhia muito respeitada, sendo considerada uma das melhores do continente africano e integrando a Star Alliance, da qual fazem parte, entre outras, A Lufthansa, a United, a Suiss e a portuguesa TAP.
Os dois acidentes obrigam também a olhar com outra luz para os problemas iniciais com o novo modelo da Boeing. Em 2017, ainda durante a fase de testes, o fabricante suspendeu temporariamente todos os voos do 737-8 Max devido a preocupações relativas aos novos motores do 737. Na altura, recorda a CNN, Jamie Jewell, porta-voz da CFM, confirmou que uma inspeção tinha detetado "algumas anomalias no processo" de fabrico dos discos para as turbinas a jato mas classificou a decisão de suspender os voos como uma mera precaução.
Mas as questões técnicas - que não são invulgares com novos modelos - continuaram a surgir ocasionalmente. Ainda na passada quinta-feira a United Airlines suspendeu a operação de 14 aparelhos, cancelando 40 voos, devido a problemas com a instalação das bagageiras superiores dos aparelhos.
O 8 Max - que mantém a longa tradição dos 737 da Boeing -, é considerado pela indústria um modelo revolucionário, nomeadamente pelos seus motores LEAP-1B, 10% a 12% mais eficazes do que o modelo antecessor ao nível dos consumos de combustível, e a capacidade de transportar mais 31 pessoas, num total de 220 passageiros.
Características que despertaram grande interesse das companhias aéreas, nomeadamente nas low cost. No final de janeiro, a Boeing confirmou um total de 5011 encomendas do modelo, recebidas de um total de 79 clientes distintos. Nos três primeiros lugares, todas com mais de 200 encomendas, estavam a Southwest, a Flydubai e...a Lion Air.
A TAP, cuja frota é constituídas pelo europeu Airbus, não consta da lista de clientes, ainda que várias operadoras internacionais que voam para e de Portugal o tenham nas suas frotas.