Hamilton Mourão: "Bolsonaro só não é comparado ao Átila, o Huno"
Vice-presidente do Brasil diz que compete ao governo mudar a imagem do Brasil no estrangeiro. "O mundo tem de entender que, depois de 24 anos de centro-esquerda no país, agora é a vez do centro-direita", afirmou em entrevista a correspondentes internacionais
Hamilton Mourão admite que a imagem do Brasil no estrangeiro não é positiva mas acredita que há exagero nas análises. Para o vice-presidente brasileiro, entrevistado por videoconferência pelo Associação de Correspondentes Estrangeiros em São Paulo, "só falta comparar Jair Bolsonaro ao Átila, o Huno".
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"Bolsonaro só não é comparado ao Átila, o Huno", disse Mourão, general na reserva do exército brasileiro, numa alusão ao líder bárbaro do século V. "Os dirigentes antigos do Brasil tinham uma relação com a comunidade internacional diferente mas essa comunidade internacional tem de entender que, depois de 24 anos de centro-esquerda [Mourão inclui os governos de Fernando Henrique Cardoso, de Lula da Silva, de Dilma Rousseff e o de Michel Temer nas suas contas], agora está no poder a centro-direita".
A contribuir para essa suposta má imagem, o vice-presidente citou dois temas: a questão do desmatamento na Amazónia e o combate ao novo coronavírus. "O combate ao coronavírus é diferente de país para país, o Brasil é muito desigual geográfica e socialmente, só pode ser comparado a países como os Estados Unidos, a Índia, à Rússia, nem digo à China, por causa do regime", lembrou.
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Noutro ponto da conversa afirmou que "o ministro Pazuello [general paraquedista que ocupa interinamente a pasta da Saúde] está a ser elogiado pela distribuição de matérias-primas, o país apresenta 1 milhão e 700 mil curados, o índice de óbitos baixou de 8% para 4%, o país está a agir de acordo com todos os protocolos, embora só se fale da cloroquina, da hidroxicloroquina". O uso da hidroxicloroquina, cujos efeitos no combate à covid-19 não estão comprovados, vem sendo defendido por Bolsonaro, que tem mostrado uma caixa do medicamento a cada manifestação popular nas últimas semanas.
"E sobre o desmatamento, não está comprovado que o Brasil seja contra o combate", continuou. Confrontado com a falta de eficácia do governo para fazer frente ao flagelo, denunciada por pesquisadores, disse que "desde maio as queimadas caíram 7%". "E queremos ficar abaixo das médias históricas de queimadas durante o verão [que no hemisfério sul começa em dezembro]".
Ainda sobre o tema da Amazónia e da relação com a população indígena e quilombola (habitantes de quilombos, os lugares habitados por descendentes de escravos), o general que completa 67 anos na próxima semana, classificou de "verdadeiro absurdo" a acusação de que o governo está a fazer "um genocídio". "Genocídio? Genocídio fez Hitler com os judeus, os turcos com os arménios, fez-se no Ruanda nos anos 90 do século passado, fez o Estaline na União Soviética, há um compromisso do governo com a proteção dessas populações, de acordo com a constituição".
No âmbito das relações internacionais, Mourão disse não temer retaliações dos Estados Unidos pelo uso da tecnologia chinesa de 5G Huawei. "Estamos no meio de uma disputa diplomática, tecnológica, até militar, entre os Estados Unidos e a China, é um momento geopolítico que preocupa o mundo todo, que deriva da perda da hegemonia dos Estados Unidos, esperemos que não entremos naquilo a que se convencionou chamar de Armadilha de Tucídides [teoria das relações internacionais segundo a qual uma potência em ascensão entra em guerra com o poder estabelecido], um conflito entre Estados Unidos e China não seria bom para nenhum deles, espero que cheguem a uma conclusão boa para ambos e boa para a humanidade em geral".
"Mas nós no governo não podemos banir ninguém de entrar nos leilões, e a Huawei, entretanto, também tem de se adaptar às regras de transparência dos países onde atua".
Sobre uma eventual derrota de Donald Trump nas eleições de novembro, o vice-presidente do Brasil não mostrou preocupação. "Os Estados Unidos são um aliado histórico do Brasil, uma aliança baseada em valores como a democracia, o capitalismo, o estado de direito, uma sociedade civil forte, caso Joe Biden ganhe as eleições as relações entre os países continuarão as mesmas".
A propósito da posição das forças armadas brasileiras, lembrou que a estratégia de defesa do país é baseada na "dissuasão e presença". "As forças armadas são capacitadas para dissuadir qualquer ameaça e a única questão que poderia ameaçar seria a Venezuela, e usa da sua presença em regiões como a Amazónia, pelas características da região".
Mourão também relativizou a excessiva militarização do governo - em torno de 6000 militares.
Finalmente, Mourão voltou a mostrar-se crítico "do instituto da reeleição". Perguntado pelo DN sobre se isso significa que não se vai recandidatar em 2022, o militante do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro não confirmou. "A reeleição não era uma tradição da nossa história republicana, depois de Getúlio Vargas os presidentes tinham mandatos de cinco anos, em seguida houve o período dos presidentes militares, depois José Sarney voltou com o mandato de cinco anos, Collor de Mello sofreu impeachment e foi Fernando Henrique Cardoso que instituiu a reeleição após quatro anos", contextualizou.
"Não concordo com ela porque prefeitos, governadores e até presidentes governam a pensar na reeleição, preferia os mandatos únicos de cinco anos, porque você governa só a pensar naquele mandato, entretanto, as regras do jogo são essas, nem sei se Bolsonaro me quer no cargo mas até lá pensaremos nisso".