Fernando Henrique afirma que situação na Petrobras já era conhecida em 1996
O Partido do Movimento da Democracia Brasileira (PMDB) é um problema para a presidência e a gestão da estatal petrolífera Petrobras é um escândalo. Essas duas conclusões podiam ser retiradas por Dilma Rousseff, a atual presidente do Brasil, mas já tinham sido diagnosticadas, entre 1995 e 1996, pelo então chefe do Estado Fernando Henrique Cardoso (FHC).
Em trechos pré-publicados na imprensa do primeiro volume de Diários da Presidência, uma série de quatro livros com 90 horas de gravações do quotidiano de FHC enquanto presidente, são abordados temas da época com incrível atualidade. Além disso, o hoje "líder espiritual" do oposicionista Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) faz juízos sobre Lula da Silva e outros dirigentes.
"Seja eu o presidente ou outro que me venha a suceder, ninguém vai poder governar o Brasil sem ampla base de apoio e eu estendi essa base de apoio ao PMDB, ou uma parte importante do PMDB", diz, em gravação numa das 44 cassetes utilizadas. Mais tarde, afirma: "Se eu quisesse mesmo, poderíamos até fazer uma grande explosão no PMDB mas tenho medo de mexer nessas coisas agora, antes das reformas, e criar dificuldades adicionais para estas. Mas não tenho dúvida de que, depois delas, teremos de dar uma mexida no quadro partidário e o PMDB não pode continuar do jeito que está, sendo uma ameaça." Um paralelo com os problemas de Dilma, sob a sombra dos dois líderes do Congresso Nacional, o amigo de circunstância Renan Calheiros, o inimigo declarado Eduardo Cunha e o indefinido vice-presidente da República Michel Temer, todos do PMDB, a força política mais disseminada no país, herdeira do MDB, oposição permitida durante a ditadura militar.
Sobre Temer, FHC refere que, em troca da sua solidariedade com o governo, "ele quer alguma achega pessoal nessa questão das nomeações, é sempre assim, Temer é dos mais discretos, mas eles não escapam, todos têm os seus interesses". Noutro trecho divulgado há uma semana, o presidente do Brasil de 1995 a 2003 negava na gravação a entrada de Cunha na Petrobras devido a um histórico de "trapalhadas" do hoje líder da Câmara dos Deputados. Cunha reagiu: "FHC não precisa de escada em mim para promover o livro dele..."
[citacao:Temer é dos mais discretos, mas eles não escapam, todos têm os seus interesses]
A respeito da Petrobras, FHC já em 1996 fora avisado de que a estatal era "um escândalo". "Todos os diretores da Petrobras são membros do conselho de administração, uma coisa descabida, acho que é preciso intervir na Petrobras." Só em meados de 2014 rebentou o escândalo do petrolão, hoje um dos principais problemas de Dilma. FHC detalha um almoço com Emílio Odebrecht, pai de Marcelo, hoje detido no petrolão, e dono da maior construtora do país. "É curioso, a Odebrecht tem um nome tão ruim mas o Emílio tem sido sempre correto", diz o ex-presidente, precisando que no encontro o empresário não pediu favores.
A respeito do seu sucessor Lula da Silva, o livro é duro: "Lula, posando outra vez de herói nacional com a frasezinha "ser professor de Ciência Política não significa saber política", enfim essa coisa deprimente, essa mediocridade que faz que gente que não tem proposta para o país encontre acolhimento nos media." FHC disse ainda que o PT de Lula e Dilma não constituía "polo viável de oposição porque é um partido excludente, não faz alianças" - previsão errada, como o tempo comprovou. Marcelo Odebrecht, que está preso em Curitiba, e Lula, que o seu antecessor tinha em pouca consideração, foram os dois nomes do dia de ontem na Operação Lava-Jato. O empreiteiro pediu ao Supremo Tribunal Federal para ser solto, tal como Alexandrino Alencar, um quadro da Odebrecht libertado na semana passada. E Lula foi citado por Fernando Baiano, um dos delatores da operação. Disse Baiano que o presidente da Sete Brasil, participada da Petrobras, se reuniu com Lula em 2011 na sede do Instituto Lula para, supostamente, pagar uma dívida do imóvel da sua nora.