Profissionais de saúde demitem-se em massa e Suécia encara recorrer a ajuda dos países vizinhos

Situação é "extremamente grave", com 99% dos cuidados intensivos preenchidos em Estocolmo. Finlândia e Noruega recetivos a prestar assistência.

A Suécia poderá ter de recorrer à assistência dos países vizinhos e a Finlândia e a Noruega já mostraram disponibilidade nesse sentido face a um agravamento da segunda vaga de coronavírus e ao abandono de profissionais de saúde, em especial enfermeiros.

O Conselho Nacional de Saúde e Bem-Estar da Suécia contactou no início da semana as autoridades de saúde de outros países nórdicos para iniciar discussões sobre a melhor forma de ajudar a Suécia ao abrigo do acordo de saúde pública nórdica.

"Há alguns dias, iniciaram-se os primeiros contactos com os outros países nórdicos, para que tenham consciência de que este ainda é um acordo válido, caso surja a necessidade", disse Göran Karlström, responsável pela coordenação da capacidade de cuidados intensivos entre as regiões da Suécia, ao londrino The Telegraph.

"Não recebemos um pedido oficial de ajuda, mas avaliamos diariamente a situação hospitalar e estamos, naturalmente, prontos a ajudar a Suécia se pudermos", disse Kirsi Varhila, secretária permanente do Ministério dos Assuntos Sociais e Saúde da Finlândia, ao jornal Svenska Dagbladet.

A sua homóloga norueguesa, Maria Jahrmann Bjerke, disse à emissora estatal NRK que os países nórdicos tinham um acordo de cooperação que permitia que a assistência médica fosse partilhada a curto prazo: "Se as autoridades suecas nos pedissem assistência, daremos uma resposta positiva."

Estocolmo ainda não pediu formalmente ajuda externa, e Johanna Sandvall, a chefe do gabinete de crise, isto é do planeamento no Conselho Nacional de Saúde e Bem-Estar, disse no domingo que a Suécia não tem planos de procurar ajuda junto dos vizinhos. "A situação dos cuidados de saúde é muito tensa em várias partes do país, mas temos uma capacidade disponível a nível nacional para satisfazer as necessidades neste momento", disse.

Para já as autoridades estão a recorrer aos militares e a pensarem em recorrer à transferência de pacientes para regiões menos atingidas.

Porém, Johanna Sandvall reconheceu disse que não era fácil destacar pessoal médico das forças armadas, pois a maioria eram oficiais na reserva já a trabalhar em hospitais noutros locais. "Trata-se de pessoal que já trabalha como enfermeiros ou médicos numa região, mas se utilizássemos o sistema de oficiais na reserva para que as Forças Armadas apenas chamassem as reservas e as colocassem em algum lugar, estaríamos apenas a criar um buraco que as regiões não conseguem controlar", considerou.

A Noruega e a Finlândia tiveram uma primeira e segunda vaga de covid-19 muito mais suave do que a Suécia, uma exceção na Europa na sua política menos restritiva e ao não aconselhar o uso de máscaras.

A Suécia registou 1400 mortes de covid no mês passado, em comparação com cerca de 100 na Noruega e 80 na Finlândia, cada uma com cerca de metade da sua população.

Enfermeiros em debandada

A região de Estocolmo advertiu na quarta-feira que 99% das camas de cuidados intensivos (UCI) estavam preenchidas, enquanto os sindicatos de saúde alertaram para o grande número de trabalhadores que abandonam os serviços à medida que infeções, hospitalizações e mortes continuam a aumentar.

Cerca de 3600 profissionais de saúde demitiram-se na região de Estocolmo desde o início da pandemia, de acordo com a emissora estatal SVT, cerca de 900 mais do que no mesmo período do ano passado.

Ao cansaço e ao risco de infeção, junta-se o principal problema dos enfermeiros,: os baixos salários, tendo em conta o nível salarial médio. Sara Nordin, ex-enfermeira de uma unidade de cuidados intensivos, disse à Bloomberg que se despediu em outubro porque não conseguia sustentar-se com o salário base de 27 700 euros que recebia por ano.

Também à Bloomberg, Sineva Ribeiro, presidente da Associação Sueca de Profissionais de Saúde, diz que já em maio os membros do seu sindicato alertaram para uma "situação insustentável", sendo que agora é "terrível" porque há menos pessoas qualificadas disponíveis agora do que havia na primavera, "o que torna mais difícil expandir a capacidade das UCI".

A Suécia duplicou o número de lugares de cuidados intensivos na primavera para 1100, pelo que a capacidade disponível nunca desceu abaixo dos 30%, mesmo quando as hospitalizações atingiram o pico em abril. Mas a capacidade extra foi reduzida durante o verão, quando o hospital de campanha no sul de Estocolmo, que não chegou a ser utilizado, foi desmontado.

O país nórdico tem agora 673 camas de cuidados intensivos, 82% dos quais estão cheios, com mais de 90% dos lugares cheios em cada uma das quatro regiões mais atingidas e tendo atingido a marca de 99% em Estocolmo.

Além disso, com o início do inverno há um aumento do número de pessoas que necessitam de cuidados intensivos para outras emergências.

A taxa de mortalidade per capita da Suécia na semana passada ultrapassou os 50 por 100 000 pela primeira vez desde o final de maio, de acordo com os números do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças.

Ainda assim, e apesar de um número comparável de transmissões diárias com Portugal, o número de mortos registados na Suécia por covid são bem menores do que no nosso país. No período de 7 a 11 de dezembro faleceram 83 suecos devido ao novo coronavírus, segundo as autoridades. No mesmo período, morreram 410 portugueses devido à mesma causa.

Há que fazer a ressalva que a Suécia faz um registo das mortes de forma diferente do resto da Europa, o que torna difícil conhecer o seu nível exato, como lembra o Financial Times.

"Estamos numa situação extremamente grave neste momento e precisamos de ajuda", disse na quarta-feira o diretor de saúde de Estocolmo, Björn Eriksson, numa conferência de imprensa.

O surgimento da segunda vaga provocou uma alteração na estratégia sueca, com um papel mais ativo do governo, que proibiu reuniões públicas de mais de oito pessoas, a venda de álcool a partir das 22 horas e fixou para as 22.30 o encerramento de bares, restaurantes e clubes noturnos.

Desde segunda-feira que as universidades e institutos superiores promovem o ensino de forma virtual, enquanto a agência de saúde pública endureceu o tom das suas recomendações, apesar de continuar a não aconselhar o uso de máscara devido à ausência de provas científicas.

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