Como os grandes bancos lucram com as redes de terrorismo e cartéis de drogas

Documentos libertados no portal <em>Buzzfeed e no site da BBC, </em>e partilhados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, revelam rede fraudulenta que envolve grandes bancos como JPMorgan Chase, HSBC, Standard Chartered, Deutsche Bank e Bank of New York Mellon. Isabel dos Santos e o marido citados nos documentos.
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Os gigantes da Banca movimentam biliões de euros em transações suspeitas, enriquecendo-se a si próprios e aos seus acionistas enquanto facilitam o financiamento de redes terroristas e tráfico de droga. Documentos libertados no portal americano Buzzfeed e no site da britânica BBC partilhados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, revelam rede fraudulenta que envolveu alguns dos maiores bancos mundiais entre 1999 e 2017.

Os arquivos FinCEN revelam milhares de "relatórios de atividades suspeitas" e outros documentos do governo dos Estados Unidos e mostram uma corrupção financeira global na banca. Esses documentos expõem o vazio das salvaguardas bancárias e a facilidade com que os criminosos as exploram. Lucros da guerra entre cartéis de drogas, fortunas desviadas de países em desenvolvimento, num verdadeiro esquema de Ponzi. Bancos como JPMorgan Chase, HSBC, Standard Chartered, Deutsche Bank e Bank of New York Mellon são alguns dos visados no esquema.

São 2657 documentos, entre os quais figuram 2100 relatórios de atividades suspeitas, que incluem informação sobre transações que levantam suspeitas aos próprios bancos. Esta fuga de informação mostra como decorreu o branqueamento de capital em alguns dos maiores bancos do mundo e como os criminosos utilizaram empresas britânicas anónimas para ocultar o dinheiro.

"A lavagem de dinheiro é um crime que possibilita outros crimes. Pode acelerar a desigualdade económica, drenar fundos públicos, minar a democracia e desestabilizar as nações - e os bancos desempenham um papel fundamental. Algumas dessas pessoas com aquelas camisas brancas engomadas em seus ternos elegantes estão se alimentando da tragédia de pessoas morrendo em todo o mundo", disse Martin Woods, um ex-investigador de transações suspeitas do Wachovia.

Ainda segundo a investigação, "as redes pelas quais o dinheiro sujo atravessa o mundo tornaram-se artérias vitais da economia global" e possibilitam um sistema financeiro paralelo tão amplo e tão descaradamente usual.

As leis que visavam impedir o crime financeiro não funcionaram e permitiram que ele prosperasse. A Financial Crimes Enforcement Network, ou FinCEN, é a agência do Departamento do Tesouro encarregada de combater a lavagem de dinheiro, o financiamento do terrorismo e outros crimes financeiros, mas a investigação mostra que mesmo depois de processados ​​ou multados por má conduta financeira, bancos como JPMorgan Chase, HSBC, Standard Chartered, Deutsche Bank e Bank of New York Mellon continuaram a movimentar dinheiro para suspeitos de crimes. E com as mais variadas fontes, desde o desporto a Hollywood.

Um dos bancos implicados é o JPMorgan, o maior banco com sede nos EUA, que movimentou dinheiro saqueado de fundos públicos da Malásia, Venezuela e Ucrânia, além de mais de 50 milhões de dólares em pagamentos ao longo de uma década, para Paul Manafort, o ex-gerente de campanha do presidente Donald Trump. Contactado para responder às acusações, o banco disse estar legalmente proibido de discutir clientes ou transações, mas lembrou que implementou "técnicas inovadoras para ajudar a combater o crime financeiro".

Outra instituição bancária de renome visada é o britânico HSBC, que permitiu que fossem transferidos milhões de dólares para todo o mundo de forma fraudulenta, mesmo depois de ter tomado conhecimento da fraude. A maior entidade bancária do Reino Unido transferiu dinheiro através do seu negócio nos Estados Unidos para contas do HSBC em Hong Kong em 2013 e 2014, segundo informação de um ficheiro confidencial.

Os ficheiros agora revelados detalham uma fraude de investimento avaliada em 80 milhões de dólares (mais de 67 milhões de euros). O esquema de Ponzi começou pouco depois de o banco britânico ter sido sancionado com uma multa de 1400 milhões de libras (1900 milhões de dólares ou 1600 milhões de euros) nos Estados Unidos por operações de branqueamento de dinheiro, altura em que se comprometeu a erradicar este tipo de práticas. O HSBC tem sempre sustentado que cumpriu as suas obrigações legais na hora de denunciar a fraude.

O Standard Chartered optou por não responder às perguntas do ICIJ e de seus parceiros, tal como o Deutsche Bank, apesar de reconhecer "fraquezas do passado". Por sua vez, o Bank of New York Mellon afirmou em comunicado que "leva a sério seu papel de proteger a integridade do sistema financeiro global, incluindo a apresentação de Relatórios de Atividades Suspeitas".

A empresária angolana Isabel dos Santos e o marido, Sindika Dokolo, foram alvo de dois relatórios sobre atividades suspeitas em 2013 nos Estados Unidos, segundo o Expresso, que faz parte do Consórcio Internacional de Jornalistas. De acordo com a investigação, a filha do ex-presidente de Angola José Eduardo dos Santos "foi alvo de dois relatórios sobre atividades suspeitas em 2013 nos Estados Unidos, um do JP Morgan e outro do Standard Chartered" devido a "transferências ligadas à Unitel e ao negócio dos diamantes em que Sindika Dokolo foi sócio do Estado angolano".

"Houve uma transferência, em particular, que chamou a atenção do compliance da instituição: Sindika Dokolo, o marido de Isabel dos Santos, tinha enviado em 2 de março de 2012 quatro milhões de dólares para uma conta de uma empresa holandesa, a Melbourne Investments BV, que passaram por uma conta correspondente do JP Morgan". Ora, como o banco "foi incapaz de identificar qualquer outra transferência relacionada com a Melbourne Investments BV nem qualquer perfil público sobre ela, isso reforçou a possibilidade de se tratar de uma empresa de fachada sem nenhum propósito comercial", lê-se no relatório, citado pelo Expresso.

De acordo com o relatório encontrado nos FinCEN Files, "foram detetadas entradas e saídas de 10 milhões de dólares nas contas de Dokolo durante esses seis anos, sendo que sete milhões corresponderam a saídas, a maioria delas a partir do EuroBIC, em Portugal, e do FBME, em Chipre".

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