Marcelo Rebelo de Sousa esteve esta quinta-feira no Natal dos Hospitais.
Marcelo Rebelo de Sousa esteve esta quinta-feira no Natal dos Hospitais.FOTO: PAULO SPRANGER

Marcelo diz ser indesejável um antigo Presidente da República intervir na atualidade política

À margem do Natal dos Hospitais, o chefe de Estado fez ainda questão dá razão àquilo que defende o procurador-geral da República no combate à corrupção e ao enriquecimento ilícito. O chefe de Estado criticou ainda as mudanças na saúde e na educação e pede estabilidade
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 O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou esta quinta-feira indesejável um antigo chefe de Estado intervir na atualidade política depois de deixar o cargo, indicando que não tem "essa vitalidade, essa força, nem esse desejo".

Depois de na quarta-feira ter dito que jamais falará de política quando deixar o Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa foi confrontado com o facto de ter dito em 1996 que não seria candidato à liderança do PSD "nem que Cristo desça à Terra", e depois ter entrado nessa corrida, que acabou por ganhar. 

"Eu aprendi com essa experiência e com outras posteriores. Aprendi que quando se diz que não, tem que ser não, totalmente não. Porque se é mais ou menos, aceita-se isto, não se aceita aquilo, depois aceita-se isto, depois não se aceita aquilo, às tantas temos aquilo que é indesejável num antigo chefe de Estado, que é estar a intervir no que se passa com o seu sucessor, com os governos que ele nomeou", afirmou.

Marcelo Rebelo de Sousa falava à margem de uma visita ao Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão (no distrito de Lisboa), onde participou no programa Natal dos Hospitais, da RTP.

O chefe de Estado recusou tratar-se de uma crítica a algum dos seus antecessores, referindo que "houve na experiência portuguesa casos de chefes de Estado que agiram de uma maneira ou de outra maneira, são como são". 

"O Presidente Mário Soares, por exemplo, até ao fim da vida foi político e interveio politicamente, candidatou-se várias vezes, umas vezes ganhou, outras vezes perdeu, fazia parte da natureza. Eu não tenho essa vitalidade, essa força, nem esse desejo", indicou, defendendo que "é bom" para a "estabilidade das instituições" que um Presidente da República se afaste quando deixa o cargo.

"Eu irei aos Conselhos de Estado, eu irei às cerimónias 25 de Abril, 10 de Junho, 05 de Outubro, mas não devo estar a intervir naquilo que é o dia-a-dia da política nacional e internacional", considerou.

Sobre as eleições presidenciais de 2026, Marcelo Rebelo de Sousa sustentou que seria "falta de gosto" falar sobre os candidatos.

"Eu que não falo dos candidatos autárquicos, dos candidatos legislativos, dos candidatos às regionais, às europeias, não vou falar nos candidatos à sucessão no cargo que exerço. Além de ser violação da neutralidade, era falta de gosto, falta de senso e falta de gosto", disse.

O chefe de estado chegou ao Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão minutos antes das 12:00 e cumprimentou funcionários e utentes. Durante a sua participação no programa cantaram-lhe os parabéns em direto na televisão nacional, e Marcelo Rebelo de Sousa acompanhou a canção, cantando também.

No final, o Presidente da República explicou aos jornalistas que alterou os planos da visita de Estado que fez nos últimos dias aos Países Baixos e que regressou a Portugal "durante a madrugada" para poder estar presente nesta celebração que "é uma tradição".

Marcelo Rebelo de Sousa disse que o seu dia de anos seria passado a trabalhar. Depois de sair de Alcoitão iria dar um mergulho à hora de almoço e seguiria para o Palácio de Belém para receber "personalidades internacionais" ligadas a "vários tribunais internacionais". À tarde participa na cerimónia de entrega do título de professor emérito a António Sampaio da Nóvoa e à noite vai ao concerto do 40º aniversário da Blitz.

Já quanto ao Natal, o chefe de Estado afirmou que, antes, ainda irá a Cabo Verde, "para assinalar os 50 anos do acordo que abriu caminho à independência" e à Eslováquia, para visitar a força nacional destacada naquele país.

"Quando regressar, ainda tenho o dia 23 de trabalho, e a partir da noite de 23 e até 25 é Natal no sentido de encontro familiar mais próximo", indicou.

O Presidente disse que fará a habitual aparição na Ginjinha do Barreiro, mas "provavelmente" reduzirá a sua agenda pública o "mais possível" naquela altura, justificando que "quem deve ter protagonismo agora, como noutras ocasiões outro primeiro-ministro, é o primeiro-ministro".

Delação premiada "é um instrumento a que faz sentido recorrer"

O Presidente da República considerou ainda que a delação premiada é "um instrumento a que faz sentido recorrer" no combate à corrupção, assim como o crime do enriquecimento ilícito.

O chefe de Estado foi questionado sobre a ideia lançada pelo procurador-geral da República de criação no ordenamento jurídico português da figura da delação premiada para ajudar no combate à corrupção. A delação premiada é um instrumento adotado em países como o Brasil que permite aos investigados ou acusados num processo penal receberem um benefício em troca da sua colaboração com a justiça.

Marcelo Rebelo de Sousa considerou "evidente que a delação premiada é um instrumento que pode ir mais longe do que já existe". "É um instrumento a que faz sentido recorrer, como disse o senhor procurador-geral da República", defendeu.

"Sabem que a minha posição aí é uma posição muito especial. Eu defendo mesmo que se considere a sério, o recurso à figura do enriquecimento ilícito", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa.

Assinalando que este instrumento "não tem passado no Tribunal Constitucional", e que "há professores que dizem que há maneiras de poder passar" no Palácio Ratton, o Presidente da República disse ser "mais radical ainda".

Na segunda-feira, Dia Internacional contra a Corrupção, o procurador-geral da República disse que os mecanismos de deteção da corrupção, embora longe da perfeição, estão cada vez mais eficazes.

Amadeu Guerra defendeu que "essa eficácia pode aumentar se aqueles que praticaram um crime de corrupção, que ainda não foi detetado, optarem por assumir um comportamento reparador ou colaborante, comunicando a sua prática ao Ministério Público".

Embora esta não seja "uma situação habitual, nem a sociedade está preparada para isso", o procurador-geral da República admitiu ser desejável "uma inflexão nesse sentido".

PR critica mudanças na saúde e na educação e pede estabilidade

O Presidente da República criticou ainda mudanças de aspetos fundamentais em áreas como a saúde e a educação, quando mudam os governos, e apelou à estabilidade.

"Era bom que cada vez que muda o Governo não mudassem coisas fundamentais na saúde, como aliás na educação", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa.

Questionado se o Governo fez demasiadas mudanças, o chefe de Estado respondeu: "Eu não estou a dizer se mudou mais ou mudou de menos, o que aconteceu foi que mudam os Governos e muda a orientação".

"E essa orientação tem que ter o mínimo de estabilidade, porque estar a mexer no sistema de saúde, e em particular no Serviço Nacional de Saúde, demora tempo, custa dinheiro, cada mudança demora tempo e custa dinheiro, e é tempo perdido e é dinheiro mal gasto, se não há o mínimo de estabilidade", defendeu.

Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que "devia haver acordo entre as forças políticas" para que "haja uma solução que seja para durar".

O chefe de Estado considerou também que a reforma do Serviço Nacional de Saúde, "que demorou muito tempo a arrancar", devia "ser experimentada".

"Foi entendido que não. Pode ser que a solução que vem aí seja melhor", indicou.

O Presidente da República falou também no estatuto do cuidador informal, considerando que "demorou muito tempo" e tem tido "passos pequeninos", mas "tem vindo a melhorar".

"Vai andando, mas é muito lentamente, e o que é facto, como a sociedade envelhece, há cada vez mais necessidade de cuidadores informais, e já não são os parentes, já teve que se alargar a outros, que são vizinhos, que são até, eventualmente, profissionais, ou eram, ou estão reformados, mas que passam a ser cuidadores informais", afirmou.

Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que "a lei tem melhorado, ainda recentemente melhorou um bocadinho", mas "não pode melhorar só de quatro em quatro anos, de cinco em cinco anos". 

"Porque é muita gente que depende disso, e é muita gente de quem depende muita gente em Portugal, muitos, muitos portugueses", alertou.

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