Olena Zelenska, primeira-dama da Ucrânia, e Marcelo Rebelo de Sousa
Olena Zelenska, primeira-dama da Ucrânia, e Marcelo Rebelo de SousaANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA

Primeira-dama ucraniana lamenta inação da comunidade internacional em relação às crianças

Marcelo Rebelo de Sousa fez esta quinta-feira um apelo à ação a nível global, perante o presidente timorense, José Ramos-Horta, e a mulher do Presidente da Ucrânia, Olana Zelenska, que apontou como heróis.
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A primeira-dama da Ucrânia criticou esta quinta-feira a inação da comunidade internacional, avaliando criticamente a eficácia das organizações internacionais e suas respostas no conflito ucraniano, sobretudo no que diz receito ao futuro das crianças e do país.

Numa intervenção na 9.ª edição das Conferências do Estoril, no Campus de Carcavelos da Universidade Nova de Lisboa, no concelho de Cascais, distrito de Lisboa, Olena Zelenska salientou que a "constatação mais dolorosa do conflito", desencadeado com a invasão russa a 22 de fevereiro de 2022 (e com a anexação da Crimeia, em 2014) "talvez seja a deportação sistemática de crianças ucranianas".

"Mais de 19.000 foram levadas para a Rússia, um ato testemunhado pelo mundo, mas que recebeu ação insuficiente. Ao envolvermo-nos nessas discussões hoje, devemos avaliar criticamente a eficácia das organizações internacionais e as suas respostas, ou melhor, a sua inação", sublinhou ao falar sobre o tema "Como manter vivo o espírito de uma nação em tempo de guerra perante quase 1.000 dias de conflito contínuo?"

"À medida que nos envolvemos em discussões significativas hoje, concentremo-nos em resultados tangíveis. Não se trata apenas da Ucrânia. Trata-se da segurança eclética da nossa comunidade global. Nenhum crime está demasiado distante para nos preocupar a todos e cada ato de violência representa uma ameaça à nossa humanidade partilhada", acrescentou a mulher do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.

Para Zelenska, encontros internacionais como o que decorre quinta e sexta-feira em Portugal, "são um microcosmo do mundo", pelo que as ações que hoje se escolherem tomar "moldarão o futuro coletivo".

"Se nos comprometermos com a ação, podemos aproximar a paz e defender os princípios da coexistência face à adversidade. A 'Hora de Repensar' [lema das Conferência do Estoril] ressoa profundamente no nosso contexto atual. A guerra obriga-nos a reavaliar não apenas nossas prioridades, mas também a própria essência do tempo", sustentou.

Segundo Zelenska, na Ucrânia atual também se reavalia a importância de coisas muito simples e quotidianas que agora se tornaram indisponíveis por causa da invasão russa, exemplificando com a simplicidade de chamar um táxi para o aeroporto, entrar num avião e chegar a Portugal em apenas quatro horas.

"Em total contraste, um míssil russo pode atingir um lar pacífico em Kharkiv em apenas 30 segundos. Comprimir as vidas de civis inocentes é um momento insuportável de terror. Além disso, geralmente não são dados mais de dois minutos para estancar o sangramento de uma pessoa ferida por bombardeamento. A urgência da guerra remodela nossa compreensão do tempo. Decisões críticas devem ser tomadas em segundos, enquanto a agonia de suportar a guerra estende o tempo para uma provação sem fim", lamentou.

Para refletir sobre a importância do tema, Zelenska frisou que o "tempo tem um preço profundo, o preço da vida". 

"Embora repensar seja crucial, a reflexão prolongada pode levar ao perigo. Quando o agressor é tolerado, ele ganha tempo para propagar suas narrativas e cometer mais atos de violência. A deliberação sobre como ajudar os necessitados pode levar à tragédia se a ação for adiada", sustentou. 

Para a "primeira-dama" ucraniana, o tempo gasto na discussão deve traduzir-se em "ação decisiva". 

"A Ucrânia tem lições valiosas para compartilhar sobre a resistência às ameaças que enfrentamos na última década de agressão da Rússia. Redefinimos a abordagem à segurança. Se alguém a ameaça, a humilha por anos, diz que não tem o direito de existir, tudo isso deve ser encarado como um ato hostil, não apenas uma manobra retórica", avisou.

"A guerra na Ucrânia também assumiu um novo significado. Ela não é mais definida pelo heroísmo individual, mas pela determinação diária de viver em um país devastado pela guerra, equilibrando esperança com incerteza", argumentou. 

No seu entender, deve-se usar o pensamento para catalisar ações globalmente, garantindo que mais ninguém tenha de suportar o mesmo sofrimento. 

"Na recente cimeira das Primeiras Damas e Cavalheiros em Kiev, declaramos o nosso compromisso em proteger a infância e garantir um futuro seguro. Uma declaração conjunta dos participantes sobre a segurança das crianças durante os conflitos foi preparada para este evento, e um documento especializado relevante foi desenvolvido e apresentado por mim à margem da cúpula da ONU" lembrou. 

A declaração, prosseguiu, mostra que "os melhores interesses das crianças podem ser levados em consideração, mesmo durante as hostilidades", agradecendo aos presidentes português, Marcelo Rebelo de Sousa, e timorense, José Ramos-Horta, pela "participação pessoal" na primeira cimeira global da paz. 

Marcelo faz apelo à ação global perante Ramos-Horta e Zelenska

O chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa, fez esta quinta-feira um apelo à ação a nível global, perante o Presidente timorense, José Ramos-Horta, e a mulher do Presidente da Ucrânia, Olana Zelenska, que apontou como heróis.

"Agora é tempo de agir, amanhã pode ser tarde de mais", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, na 9.ª edição das Conferências do Estoril, no Campus de Carcavelos da Universidade Nova de Lisboa, no concelho de Cascais, distrito de Lisboa.

No início da sua intervenção, feita em inglês, o chefe de Estado saudou as presenças de José Ramos-Horta e de Olena Zelenska, que discursariam a seguir, apontando ambos como "heróis na luta pela paz, independência e soberania".

A seguir, o Presidente da República descreveu o atual momento como o "fim de um ciclo histórico, a nível global", em que se "acreditava que um rejuvenescimento das lideranças americanas era fácil" e que "a aceitação da Federação Russa da sua despromoção de potência global a regional era pacífica".

Acreditava-se que "a ascensão da China através da expansão económica global e a sua liderança na relação com a Rússia era lenta" e "o multilateralismo era mais evidente e mais bem-sucedido", completou.

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, assiste-se ao "fim do ciclo de sistemas políticos, económicos e sociais" na Europa, que "está a ficar para trás dos Estados Unidos da América e da Ásia".

"Estamos num momento de transição, com muito em jogo. Como se num crepúsculo de duração indeterminada, ou no amanhecer de um novo dia de duração ainda indefinida. Estamos a viver, ao mesmo tempo, a invasão russa e a guerra na Ucrânia, o conflito crescente no Médio Oriente, eleições decisivas nos Estados Unidos da América, a ascensão de movimentos políticos e sociais sistémicos ou assistémicos na Europa, o desmoronamento de poder político em África, a radicalização na América Latina", prosseguiu.

O Presidente da República referiu que para alguns "é tempo ainda de esperar para ver", enquanto se vê "reformistas moderados serem abafados por radicais palavrosos e proativos".

"É nestes momentos que é crucial refletir sobre a mudança, mas para agir, antecipando e liderando -- isso é ainda mais crucial. É a nossa missão hoje, no fim de 2024", defendeu.

"Ontem ou anteontem foi tempo de apenas especular sobre o futuro, como iria ser, como deveria ser. Agora é tempo de abrir caminho, de preparar os próximos passos, tão próximos de nós, e ter ideias claras sobre as consequências. Agora é tempo de agir, amanhã pode ser tarde de mais", reforçou Marcelo Rebelo de Sousa.

A organização das Conferências do Estoril cabe atualmente às faculdades de economia e gestão e de ciências médicas da Universidade Nova de Lisboa.

À chegada ao Campus de Carcavelos, o Presidente da República fez breves declarações à comunicação social sobre o cantor Marco Paulo, que morreu hoje, aos 79 anos, reiterando o pesar que já tinha manifestado por escrito no sítio oficial da Presidência da República na Internet.

À saída, o chefe de Estado não falou aos jornalistas.

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