Parceria Europa-África relançada nos 25 anos da Cimeira do Cairo
DN-Leonardo Negrão

Parceria Europa-África relançada nos 25 anos da Cimeira do Cairo

Multilateralismo, Paz e Segurança, Prosperidade e Mobilidade Humana, e Migrações são os temas a discutir em Bruxelas pelos ministros europeus e africanos, já a pensar numa 7.ª cimeira.
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Com a intenção de organizar até final de 2025 a 7.ª cimeira Europa-África para assinalar os 25 anos da pioneira Cimeira do Cairo, os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia e da União Africana reúnem-se nesta quarta-feira em Bruxelas com quatro grandes temas na ordem de trabalhos: Multilateralismo, Paz e Segurança, Prosperidade e Mobilidade Humana, e Migrações. Portugal, que organizou em 2007 em Lisboa a 2.ª cimeira UE-UA, tem um interesse especial nesta parceria e, ao DN, o ministro Paulo Rangel sublinhou que “a afirmação global da África e da Europa depende, no essencial, da relação entre os dois continentes. Só esta parceria pode equilibrar a deriva da balança do poder para o Pacífico. Com a presidência angolana da União Africana, esta reunião ministerial é ainda mais importante para Portugal e para a CPLP”.

Com a liderança da UA a ser assumida pelo presidente angolano João Lourenço, Luanda é uma das cidades que poderá vir a acolher a próxima cimeira, sempre com Adis Abeba, capital da Etiópia e da UA, como fortíssima candidata, sem excluir a hipótese da capital de outra grande nação africana. As anteriores cimeiras ocorreram, numa lógica de rotação continental, no Cairo, Lisboa, Trípoli, Bruxelas, Abidjan e de novo Bruxelas.

Na cimeira de Bruxelas de 2022, europeus e africanos adotaram uma “Visão Comum para 2030”, respeitando as prioridades de ambas as organizações. Desde então, os desafios acumularam-se e, além das guerras sem fim, do Darfur ao Leste do Congo, há que ter em conta a crescente influência chinesa e o renovado envolvimento russo em África.

Da parte da UE, a questão migratória ganhou especial importância nos últimos anos, até pelo debate político em cada um dos 27. E não é de excluir que a ajuda ao desenvolvimento possa vir a ser acompanhada por negociações sobre fluxos migratórios.

“África e Europa estão a atravessar um momento de profunda transformação que exige uma mudança de paradigma face ao histórico das relações euro-africanas nas primeiras duas décadas deste século. A Ministerial permitirá abordar de que forma os dois continentes devem cooperar para fazer face a novas dinâmicas, como a inadequação do atual modelo de cooperação para o desenvolvimento, o crescimento de narrativas soberanistas e do sentimento anti-Ocidente, ou ainda o aparecimento de novos atores e novas soluções de integração regional, menos ancoradas no sistema multilateral”, alerta João Gomes Cravinho, representante especial da UE para o Sahel.

“Ainda que estejamos a atravessar um contexto extremamente complexo, existe um reconhecimento mútuo de que a paz e segurança se mantém um domínio prioritário para as duas regiões. A União Europeia e os 27 têm, contudo, de saber articular os seus interesses, para que, num espírito de respeito mútuo e respeitando as prioridades dos nossos parceiros africanos, possamos alcançar os nossos objetivos, ao mesmo tempo que contribuímos para a estabilidade global”, acrescenta o antigo chefe da diplomacia portuguesa.

Por seu lado, o académico Fernando Jorge Cardoso afirma que “há um forte ataque ao projeto de integração europeia. Por dentro, por forças xenófobas e nacionalistas; por fora, pelos EUA de Trump, tendo em vista o fim da arma mais poderosa que a UE tem no quadro global: a política comercial comum. África é tratada à la carte, com os países a serem vistos como fontes de matérias-primas e terra arável. A UE (não confundir com cada país europeu) é ave rara, ao olhar para África de forma mais abrangente. Este quadro poderia ser base para debater questões de comum interesse numa cimeira UE-UA, tratando dossiers comerciais ou de ajuda como dossiers técnicos e focando a parceria na geopolítica e nas questões estratégicas. Europa e África perdem com o enfraquecer do multilateralismo e o desrespeito de normas internacionais contratualizadas.”

Segundo o professor catedrático da Universidade Autónoma de Lisboa, “Portugal teria todo o interesse em adotar esta visão. Porém, a julgar pela ausência total de debate de questões externas nas eleições legislativas, não é certo que o faça.”

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