O General João Cartaxo Alves, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, com o Almirante Henrique Gouveia e Melo, Chefe do Estado-Maior da Armada.
O General João Cartaxo Alves, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, com o Almirante Henrique Gouveia e Melo, Chefe do Estado-Maior da Armada.Foto: Leonardo Negrão

O que dizem os Chefes militares portugueses sobre a guerra

Mendes Ferrão sublinha que não podem haver “respostas levianas” no atual cenário. Gouveia e Melo não hesita em apontar a Rússia como “principal ameaça à segurança Euro-Atlântica. Cartaxo Alves defende uma “estratégia para o espaço” contra os “satélites-espiões” da Rússia e da China.
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Mendes Ferrão (Exército): “Não há respostas levianas”

“É consensual que o mundo está em permanente mudança, agora muitíssimo mais acelerada! E a mudança está, invariavelmente, associada à imprevisibilidade e à incerteza. Perante cenários de imprevisibilidade, há uma certeza – a de que não há respostas levianas! A leviandade é inconcebível em cenários onde a complexidade e a incerteza coexistem, como se verifica nos conflitos atuais, em África, na Ucrânia e no Médio Oriente”, sintetizou o Chefe de Estado-Maior do Exército (CEME), General Eduardo Mendes Ferrão, na conferência “A Segurança e a Defesa na Europa - Desafios”, organizada pela Associação de Auditores com o Curso de Defesa Nacional, que decorreu nesta semana na Academia Militar. Para o CEME “é imperativo antecipar cenários e agir preventivamente, perspetivando o futuro de modo a estarmos preparados para atuar em ambientes que exigem respostas versáteis e multifacetadas, e permitam enfrentar os desafios atuais de forma pronta e eficaz”.

Gouveia e Melo (Marinha): Rússia, “a principal ameaça”

O Chefe de Estado-Maior da Armada (CEMA), sublinhou, na mesma conferência, que “no atual contexto geoestratégico e geopolítico, a Rússia não pode deixar de ser identificada como a principal ameaça à segurança Euro-Atlântica, procurando desestabilizar países nos flancos Leste e Sul e perturbar a liberdade de navegação no Atlântico Norte, no Ártico e nos Mares Báltico, Negro e Mediterrâneo”. Noutro plano, acrescentou o Almirante Henrique Gouveia e Melo, “a China constitui um desafio sistémico às sociedades ocidentais, empregando instrumentos militares, políticos e económicos para aumentar a sua presença global e projetar poder e influência, num quadro de opacidade quanto às suas intenções estratégicas”.

Neste quadro, assinalou, “a agressão da Rússia à Ucrânia e o alinhamento estratégico desta potência com a China, o Irão e a Coreia do Norte, indiciam que já entrámos numa nova era de confrontação global, muito assente em estratégias híbridas". "Efetivamente, estes quatro países – Rússia, China, Irão e Coreia do Norte – recentemente batizados como o 'Quarteto do Caos', apresentam desafios geoestratégicos e geoeconómicos significativos”, apontou.

Gouveia e Melo entende que “a segurança da Europa e a existência da União Europeia podem estar em risco se a NATO se enfraquecer significativamente”.

Caso a Rússia obtenha sucesso na sua guerra na Ucrânia, alerta, “isso poderá desencadear uma agressão mais ampla na Europa, explorando as divisões entre aliados e sociedades ocidentais”.

O CEMA lembrou que “as táticas de guerra híbrida e o uso de todos os elementos de poder (económico, cultural, militar) ou de perturbação (extremismo político, crime organizado, cibercrime) fazem parte das estratégias da Rússia e da China contra a ordem ocidental”.

Do ponto de vista marítimo, salienta Gouveia e Melo, “a ameaça submarina é uma prioridade para a NATO e para Portugal, que tem vastas responsabilidades no Atlântico”, reforçando que “outras ameaças no mar incluem: migração irregular, tráfico de seres humanos, crime organizado transnacional, pirataria marítima, terrorismo, disrupção da liberdade de navegação, ataque a infraestruturas críticas, espionagem, crimes ambientais e exploração maliciosa de cruzeiros científicos”.

Na sua intervenção, o Almirante afirmou que “após 75 anos de existência, é incontestável que a NATO continua a ser a pedra angular e o garante indispensável da segurança da Europa e da América do Norte”. “Este princípio ganhou ainda mais relevância após a invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022, levando países tradicionalmente neutros como a Suécia e a Finlândia a aderirem à NATO. A guerra na Europa, antes um conceito do passado, ressurgiu, sublinhando a necessidade de o nosso continente mobilizar a vontade da sua população para defender os valore democráticos e o modo de vida ocidental. As democracias devem comunicar claramente o que está em jogo e galvanizar a vontade coletiva. Esta perceção de vontade e credibilidade pode dissuadir os agressores de forma mais eficaz do que a ação militar. No entanto, os adversários visam esta vontade através de meios financeiros e ideológicos, com o objetivo de desestabilizar as sociedades ocidentais. De facto, as atuais ameaças incluem o desrespeito por tratados internacionais, a anexação armada de territórios e a consequente tentativa de redefinição de fronteiras, e o uso de estratégias híbridas para desgastar as democracias liberais, incluindo através de forças anti-sistema e de grupos insurgentes”, asseverou.

Cartaxo Alves (Força Aérea): Estratégia aeroespacial

O Chefe de Estado-Maior da Força Aérea (CEMMFA) sublinhou “o escrutínio, quase continuo e permanente, a que está sujeito o nosso país, tal como outros países europeus, promovido pelos satélites espiões de países terceiros, como a Rússia e a China” exigindo que se “olhe para uma estratégia para o espaço, com meios evoluídos tecnologicamente”.

O General Cartaxo Alves, voltou a alertar para a importância de Portugal investir num programa de aquisição de aeronaves F-35, à semelhança de outros países europeus e à medida que os caças F-16 se encontram em fim de vida.

"Temos que dar o salto mais cedo ou mais tarde para o F-35 também. Obviamente é um programa fundamental e crítico nesta matéria como também são os programas de capacidade e capacitação ao nível de baterias de mísseis", afirmou.

Para o CEMFA, “a interoperabilidade dos meios é essencial” e isso implica “uma permanente preocupação na modernização dos meios, na captação e manutenção dos recursos humanos e na sua formação”

Na garantia da segurança e defesa dos países e da Europa é essencial a informação espacial, mas também a modernização dos meios da Força Aérea, designadamente os afetos à capacidade de transporte tático e estratégico.

De acordo com Cartaxo Alves, a Força Aérea “tem uma visão para o Espaço, desde 2020, um plano de ação para implementação dessa visão, desde 2022 e um conceito de espaço na Força Aérea desde 2023”.

No entanto, “o sucesso dessa visão ainda assenta na existência de recursos humanos e na modernização dos seus meios, onde se enquadra a substituição dos F-16 pelos F-35 e o desenvolvimento de uma plataforma não tripulada dotada de vários sensores. Só assim estarão, continuamente, garantidas o apoio às nossas populações e a segurança do nosso espaço soberano”.

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