Netanyahu afirma na ONU que Israel “deve terminar o trabalho” em Gaza, em intervenção marcada por abandono de vários delegados
SARAH YENESEL / EPA

Netanyahu afirma na ONU que Israel “deve terminar o trabalho” em Gaza, em intervenção marcada por abandono de vários delegados

Muitos delegados das Nações Unidas levantaram-se e saíram assim que o primeiro-ministro israelita subiu ao palanque.
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O primeiro-ministro israelita abriu esta sexta-feira, 26 de setembro, o seu discurso perante a Assembleia Geral das Nações Unidas falando na "maldição do eixo terrorista do Irão", enquanto erguia um mapa do Médio Oriente que usou na mesma sala no ano passado e que mostra a disseminação desta "maldição". "Mostra a maldição do eixo terrorista do Irão. Esse eixo ameaçava a paz do mundo inteiro. Ameaçava a estabilidade da nossa região e a própria existência do meu país", referiu, falando sempre em inglês.

Benjamin Netanyahu prosseguiu, enumerando as operações militares levadas a cabo por Israel na sequência do ataque do Hamas a 7 de outubro de 2023. "Então, o que aconteceu no ano passado? Massacrámos os Houthis, incluindo ontem. Esmagámos a maior parte da máquina terrorista do Hamas. Paralisámos o Hezbollah, eliminando a maioria dos seus líderes e grande parte do seu arsenal de armas", listou, referindo ainda a devastação do programa de armas atómicas e mísseis balísticos do Irão, tendo agradecido a Donald Trump pela sua ajuda nos ataques contra o programa nuclear de Teerão.

"Então, aqui está a situação hoje. Metade da liderança Houthi no Iémen desapareceu. Yahya Sinwar em Gaza desapareceu. Hassan Nasrallah no Líbano desapareceu. O regime de Assad na Síria desapareceu. Aquelas milícias no Iraque? Bem, ainda estão dissuadidas. E os seus líderes, se atacarem Israel, também desaparecerão. E para os principais comandantes militares do Irão e os seus principais cientistas da bomba atómica, bem, também desapareceram", afirmou o líder israelita, riscando-os no seu mapa.

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De notar que enquanto Benjamin Netanyahu caminhava até ao pódio para começar o seu discurso, muitos delegados das Nações Unidas no salão começaram a levantar-se e a sair. Os apoiantes do primeiro-ministro israelita tentaram desviar a atenção do sucedido aplaudindo ruidosamente e ficando de pé durante vários minutos.

Um pouco antes da intervenção foi também dado a conhecer pelo gabinete do primeiro-ministro israelita que havia instruções para instalar altifalantes no lado israelita da fronteira com Gaza para transmitir o discurso para os palestinianos. No entanto, segundo Times of Israel, o exército explicou que levou os altifalantes para o enclave, revelando que um total de nove sistemas de altifalantes foram implantados para a "campanha de influência", dirigida tanto aos civis palestinianos na Faixa como contra o Hamas.

O líder da oposição Yair Lapid criticou a medida, afirmando que Netanyahu não era o líder norte-coreano Kim Jong Un e que os militares "não precisavam de transmitir os discursos do líder através de altifalantes". "Isto é uma loucura megalómana, imprópria para um país democrático", escreveu no X.

O ponto seguinte do discurso de Netanyahu foi dedicado aos reféns, tendo enumerado os nomes dos 20 cativos que se acredita ainda estarem vivos na posse do Hamas. "Quero fazer algo que nunca fiz antes. Quero falar deste fórum diretamente a estes reféns através de altifalantes. Cerquei Gaza com enormes altifalantes ligados a este microfone na esperança de que os nossos queridos reféns ouçam a minha mensagem". E em hebreu acrescentou: “Não nos esquecemos de vocês, nem por um segundo”.

A colocação dos altifalantes em Gaza serviu para o líder israelita enviar também uma mensagem ao Hamas: “Deponham as armas. Soltem o meu povo. Libertem os reféns. Todos eles. Os 48. Libertem os reféns. Agora. Se fizerem isso, viverão. Se não fizerem, Israel caçar-vos-á."

Netanyahu afirmou que, apesar de diminuídas, as forças do Hamas ainda representam uma ameaça e "prometem repetir as atrocidades de 7 de outubro". "Graças à determinação do nosso povo, à coragem dos nossos soldados e às decisões ousadas que tomámos, Israel recuperou do seu pior momento para realizar uma das reviravoltas militares mais impressionantes da história", disse, garantido que “ainda não acabámos" e sublinhando que “Israel deve terminar o trabalho em Gaza o mais rapidamente possível”. 

Falando depois diretamente para o que restava da audiência na Assembleia Geral, Netanyahu garantiu que Israel também está a lutar por eles, revelando que “à porta fechada, muitos dos líderes que nos condenam publicamente, agradecem-nos em privado (…) Dizem-me o quanto valorizam os excelentes serviços de informação de Israel, que têm impedido, vezes sem conta, ataques terroristas nas suas capitais”, declarou, para logo em seguida se referir ao seu maior aliado, os Estados Unidos. 

“O presidente Trump compreende melhor do que qualquer outro líder que Israel e os Estados Unidos enfrentam uma ameaça comum", referiu Netanyahu, questionando ainda: "O que acham que os Estados Unidos fariam se fossem atacados como Israel?”.

Netanyahu descreveu depois o genocídio como uma "acusação falsa" - numa referência ao relatório de uma comissão independente de inquérito da ONU concluiu que Israel cometeu genocídio em Gaza – e notou que na ofensiva israelita em curso na cidade de Gaza têm havido ordens de deslocação, como já aconteceu anteriormente. “Será que um país que comete genocídio imploraria à população civil que supostamente está a visar que se afaste do perigo?”, questionou o líder israelita, voltando a alegar que o Hamas usa civis como escudos humanos. Segundo as autoridades de Gaza, já morreram mais de 65.000 palestinianos desde o início da ofensiva israelita depois de 7 de outubro de 2023.

Netanyahu prossegue, declarando que "Israel é acusado de deliberadamente matar de fome o povo de Gaza. Quando Israel está deliberadamente a alimentar o povo de Gaza". Um monitor global da fome determinou em agosto, de acordo com a Reuters, que a cidade de Gaza e as áreas vizinhas estão oficialmente a sofrer com a fome, e esta irá provavelmente alastrar. Cerca de 514.000 pessoas, quase um quarto dos palestinianos na Faixa de Gaza, estão a passar fome, sendo previsto que este número aumente para 641.000 até ao final de setembro. “Se há residentes de Gaza que não têm alimentos suficientes, é porque o Hamas está a roubar. O Hamas rouba, acumula e vende a preços exorbitantes para combater a sua máquina de guerra”, repetiu Netanyahu.

Críticas aos países que reconheceram o Estado Palestiniano

O PM israelita passou depois à sua oposição à criação de um Estado palestiniano – afirmação que, segundo a Al Jazeera, foi aplaudida pela delegação dos Estados Unidos - e criticou duramente os líderes mundiais dos países que esta semana reconheceram a Palestina, como França, Portugal, Reino Unido, Canadá ou Austrália, dizendo que “"Israel não permitirá que nos enfiem um Estado terrorista goela abaixo", mas também que "o que vocês estão a fazer é dar a recompensa final aos fanáticos intolerantes que perpetraram e apoiaram o massacre de 7 de Outubro".

“Dar aos palestinianos um Estado a 1,6 km de Jerusalém depois de 7 de Outubro é como dar à Al-Qaeda um Estado a 1,6 km de Nova Iorque depois de 11 de Setembro. Isto é pura loucura. É insano, e não o faremos", prosseguiu o primeiro-ministro israelita

Netanyahu sublinhou ainda: "A minha oposição a um Estado palestiniano não é simplesmente a minha política ou a política do meu governo. É a política do Estado e do povo do Estado de Israel".

Quase no final da sua intervenção, Netanyahu garantiu que a guerra de Israel conduzirá à paz regional, notando que a Síria e o Líbano são fundamentais para isso. "Hoje iniciamos negociações sérias com o novo Governo sírio", declarou. "Acredito que, nos próximos anos, o Médio Oriente terá um aspeto dramaticamente diferente. Muitos dos que hoje fazem guerra contra Israel terão partido amanhã", continuou, referindo ainda que “em nenhum lugar isto será mais verdade do que no Irão. O sofrido povo iraniano recuperará a sua liberdade. Tornarão o Irão grande novamente. E os nossos dois povos ancestrais, o povo de Israel e o povo do Irão, restaurarão uma amizade que beneficiará o mundo inteiro."

Netanyahu referiu-se ainda aos países árabes, apesar de muitos analistas temerem que o ataque israelita deste mês ao Qatar pôs em risco as relações de Telavive com os países do Golfo. “A nossa vitória levaria a uma extensão e expansão drásticas dos históricos Acordos de Abraão, que o Presidente Trump negociou entre os líderes árabes e eu há cinco anos”, disse, referindo-se aos acordos de normalização das relações entre Israel e vários países árabes. 

Numa referência ao discurso desta quinta-feira de Mahmoud Abbas, o presidente do Estado da Palestina – que garantiu que os palestinianos nunca abandonarão a sua terra, mas também que estão prontos para trabalhar com os EUA, a Arábia Saudita, a França e a ONU para alcançar a paz em Gaza – o primeiro-ministro israelita acusou a Autoridade Palestiniana de ser igual ao Hamas na sua oposição à existência de Israel. "A Autoridade Palestiniana paga aos terroristas para matarem judeus. Quanto mais judeus os terroristas matarem, mais a Autoridade Palestiniana paga", disse, acusando ainda a organização de mentir ao prometer reformas, numa referência também ao discurso de Abbas. "Nunca cumprem. A Autoridade Palestiniana é corrupta até à medula."

Netanyahu terminou o seu discurso garantindo que Israel quer ser um "farol de progresso, engenho e inovação para o benefício de toda a humanidade", sublinhando que "no dia 7 de outubro, os inimigos de Israel tentaram apagar essa luz”. “A determinação e a força de Israel brilharam mais intensamente do que nunca; com a ajuda de Deus, essa força e essa determinação levar-nos-ão a uma vitória rápida, a um futuro brilhante de prosperidade e paz”, concluiu. 

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Abbas acusa Israel de manter “guerra de genocídio” e garante que o Hamas não terá lugar em Gaza
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