Médico recorda últimos minutos de vida do Papa: "Os olhos estavam abertos, mas não me respondia"
Sergio Alfieri, médico do Papa Francisco, recordou, em entrevista ao Corriere della Sera, os últimos minutos de vida de Francisco na madrugada de segunda-feira.
"Na segunda-feira, por volta das 5h30, [o enfermeiro Massimiliano] telefonou-me: 'O Santo Padre está muito doente, temos de voltar para [o hospital] Gemelli'. Avisei todos com antecedência e vinte minutos depois estava em Santa Marta, mas parecia difícil pensar que fosse necessário um internamento. Entrei no quarto dele e os seus olhos estavam abertos. Notei que não tinha problemas respiratórios e tentei interagir com ele, mas não respondeu. Não respondia a estímulos, nem mesmo dolorosos. Naquele momento compreendi que não havia mais nada a fazer. Ele estava em coma", contou o clínico.
"Arriscaríamos deixá-lo morrer durante o transporte, expliquei que o internamento teria sido inútil. Strappetti sabia que o Papa queria morrer em casa, quando estávamos em Gemelli dizia-o sempre. Morreu pouco depois. Fiquei lá com o Massimiliano, a Andrea, as outras enfermeiras e as secretárias. Depois chegaram todos e o Cardeal Parolin pediu-nos para rezar e rezámos o terço com ele. Senti-me privilegiado e agora posso confirmá-lo. Nessa manhã fiz-lhe uma carícia como última despedida", prosseguiu.
Alfieri disse que havia estado com o Papa "sábado depois de almoço" e que encontrou Francisco "muito bem". "Estou muito bem, voltei a trabalhar e estou bem", disse-lhe o líder da Igreja Católica.
O médico adiantou que não desaconselhou Francisco a evitar trabalhar porque se tratava do Papa e que "voltar ao trabalho fazia parte da terapia". "Ele nunca se colocou em perigo", frisou.
Alfieri recordou ainda o primeiro encontro com o Papa, em 2018: "Foi uma grande emoção." "Eu era cirurgião consultor da Santa Sé e ele convidou-nos para assistir a uma missa na igreja de Santa Marta. Era como um padre de paróquia, fazia o sermão e depois no final da celebração saía da igreja e cumprimentava toda a gente, um a um. Dois anos depois, começou a sentir-se mal do estômago, tinha dores abdominais muito fortes e a sua qualidade de vida, com todos os compromissos laborais que tinha, não era a ideal. Fez exames e ouviu vários médicos. Tinha doença diverticular grave. Um dia Strappetti trouxe-me a tomografia computorizada. Talvez o Papa soubesse que eu tinha a maior experiência em Itália em cirurgia colorretal e escolheu-me para operá-lo", explicou, recordando que Francisco lhe pediu segredo sobre a cirurgia.
O médico recordou ainda um pedido recente do Papa, para que a medicina cuidasse dos embriões abandonados. "Eles são vida, não podemos permitir que sejam utilizados para experiências ou que se percam. Seria um assassinato", disse-lhe o sumo pontífice.
O Papa Francisco morreu na segunda-feira aos 88 anos, de acidente vascular cerebral (AVC), após 12 anos de pontificado.
Nascido em Buenos Aires, a 17 de dezembro de 1936, Francisco foi o primeiro jesuíta e primeiro latino-americano a chegar à liderança da Igreja Católica.
A sua última aparição pública foi no domingo de Páscoa, no Vaticano, na véspera de morrer. O papa Francisco esteve internado durante 38 dias devido a uma pneumonia bilateral, tendo tido alta em 23 de março.
O corpo de Francisco foi exposto para ser velado na quarta-feira e as exéquias irão terminar com despedidas solenes no sábado, com a transferência para a Basílica de Santa Maria Maior, onde será realizada a cerimónia de sepultamento, como havia sido pedido pelo Papa, com uma única inscrição: “Franciscus”.