"Eu, Venâncio Mondlane, presidente eleito pelo povo moçambicano - não pelo Conselho Constitucional, não pela CNE - juro pela minha honra servir a pátria moçambicana e os moçambicanos”, declarou esta quinta-feira o candidato presidencial no seu regresso a Moçambique, após dois meses e meio de ausência, ainda no Aeroporto Internacional de Maputo, cujo acesso estava a ser controlado pela polícia. Na sua intervenção, Mondlane acusou as autoridades moçambicanas de “uma espécie de genocídio silencioso” na repressão à contestação dos resultados das eleições gerais de 9 de outubro, mas manifestou-se disponível para o diálogo e para negociar. “Quero quebrar a narrativa de que estou ausente por vontade própria das iniciativas de diálogo, estou aqui em carne e osso para dizer que se querem negociar, dialogar comigo, querem ir à mesa de negociações, estou aqui presente para o diálogo”, declarou pouco depois de aterrar em Maputo..Montenegro transmitiu a Daniel Chapo "necessidade de assegurar um cessar imediato da violência" em Moçambique.O candidato presidencial, que lidera a contestação aos resultados das eleições gerais, justificou ainda o seu regresso com o facto de não poder continuar fora do país quando o povo “está a ser massacrado”. “Acho que não posso estar ao fresco, bem protegido, quando o próprio povo, que está no suporte da minha candidatura, dos meus valores, está a ser massacrado”, realçou, acrescentando ter-se apercebido de “que o regime optou por uma estratégia de criar uma espécie de genocídio silencioso, as pessoas estão a ser sequestradas nas suas casas, estão a ser executadas extrajudicialmente nas matas, estão a ser descobertas as valas comuns com supostos apoiantes de Venâncio Mondlane”.O acesso ao aeroporto de Maputo esteve esta quinta-feira condicionado pela polícia devido ao regresso de Venâncio Mondlane a Moçambique. Segundo a Deutsche Welle, nas vias de acesso ao aeroporto os carros eram controlados pelas autoridades e impedidos de entrar no seu perímetro, com o transporte dos passageiros (que eram obrigados a comprovar que tinham voo marcado) a ser feito por autocarros a partir dos pontos de bloqueio.Estes entraves levaram a que milhares de pessoas optassem por esperar por Venâncio Mondlane no Mercado Estrela, um dos mais populares da capital, local para onde se dirigiu depois de sair do aeroporto, tendo sido acompanhado por um cortejo com milhares de pessoas. Já no Estrela, e cerca de uma hora depois de ter chegado a Moçambique, voltou a garantir que vai até às últimas consequências pela reposição da verdade eleitoral, reafirmando-se vencedor das presidenciais.Mas, ao fim de alguns minutos de discurso aos apoiantes em cima de um carro de som, em que simbolicamente voltou a prestar juramento do que autointitulou tomada de posse, e depois de vários disparos e gás lacrimogéneo lançado na envolvente pela polícia, uma carga policial provocou a fuga generalizada, logo após o apelo para desmobilização, perante o som dos tiros, lançado por Mondlane. Fonte próxima do candidato disse mais tarde à Lusa que este estava “em segurança, encontra-se hospedado em Maputo. Está bem”.Segundo a Polícia da República de Moçambique, dois agentes foram mortos em confrontos com manifestantes no distrito de Moma (Nampula) - “saindo do serviço, foram interpelados na via pública e agredidos fisicamente até a morte e os respetivos corpos carbonizados”, disse o porta-voz da PRM, Orlando Mudumane. Em Maputo, as autoridades anunciaram que pelo menos três pessoas ficaram feridas em confrontos com a polícia durante a receção de Mondlane. A Plataforma Decide tinha avançado horas antes que pelo menos três pessoas morreram e outras seis foram baleadas entre os apoiantes que acompanhavam Mondlane, e que agora contabilizava um total de 294 óbitos desde o início dos protestos.Partidos abertos ao diálogoCinco partidos políticos asseguraram esta quinta-feira, após novo encontro com o presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, que as formações que discutem soluções face à tensão pós-eleitoral estão abertas a integrar Venâncio Mondlane no diálogo interno. “A mesa de diálogo presente está em aberto, mas como dissemos inicialmente, o que está presente são plataformas partidárias e, sendo plataformas partidárias, nós estamos aqui a trabalhar, mas reitero que a mesa de diálogo está em aberto”, declarou Daniel Chapo, secretário-geral da Frelimo, na apresentação de um comunicado conjunto. Chapo, que é também o presidente eleito, tomará posse na quarta-feira.Dirigentes dos cinco partidos - Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), Partido para o Desenvolvimento Optimista de Moçambique (Podemos), Nova Democracia (ND, o único sem assento parlamentar), Movimento Democrático de Moçambique (MDM) e Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) reuniram novamente com Nyusi.Após este novo encontro com o presidente moçambicano, Daniel Chapo anunciou que os partidos políticos vão formar grupos de trabalho que incluem comissões técnicas, visando discutir reformas estatais para colocar fim à crise pós-eleitoral no país. “Hoje chegámos a um consenso que vamos continuar a trabalhar para as reformas que é o objetivo principal do povo moçambicano, estamos a falar de reformas relacionadas com a lei eleitoral, o aprimoramento da descentralização e as reformas que possam levar-nos à revisão da Constituição da República para acomodar os interesses do povo moçambicano”, explicou o dirigente da Frelimo.A 30 de dezembro, os quatro partidos da oposição já tinham manifestado abertura, após um encontro com Nyusi, a prosseguir um diálogo para um pacto social que conduza a reformas no país, face à tensão pós-eleitoral.Em causa estão as manifestações e paralisações que levaram o caos às ruas em Moçambique, protestos convocados por Mondlane, que rejeita os resultados proclamados pelo Conselho Constitucional a 28 de dezembro, dando vitória à Frelimo nas eleições gerais de 9 de outubro, compostas por legislativas, presidenciais e provinciais. com Lusa