O líder da União Democrata-Cristã, que obteve 28,6% dos votos, confirmou esta segunda-feira o que já havia adiantado no final da campanha: o seu objetivo é tentar formar uma “grande coligação” com o SPD, que caiu para terceiro, não indo além dos 16,4%. “Nós recebemos um claro mandato para governar que aceitamos”, declarou Friedrich Merz. “Olhando para a distribuição de lugares do Parlamento, estamos em posição de formar uma coligação preto-vermelha, e é precisamente isso que tencionamos fazer”, acrescentou. Num Parlamento composto por 630 deputados, são necessários pelo menos 316 para se obter uma maioria, uma marca que a “grande coligação ultrapassa por 12 lugares graças aos 208 eleitos de CDU/CSU e aos 120 do SPD..O próximo chanceler alemão revelou que as negociações para formar esta coligação já estão em andamento, sendo que estava previsto para esta segunda-feira um encontro entre Friedrich Merz e a liderança dos sociais-democratas, nomeadamente Lars Klingbeil, co-líder do SPD. Nos próximos dias deverá também ter lugar uma reunião entre Merz e o ainda chanceler Olaf Scholz, que não fará parte das negociações para o futuro governo. Quanto a prazos, o líder dos conservadores apontou a Páscoa, a 20 de abril, como a meta para o novo executivo entrar em funções, alegando que existe uma urgência em restabelecer uma estabilidade governativa que não se verifica desde a queda da coligação liderada por Scholz em novembro - e que deu origem às eleições federais antecipadas de domingo. “A Alemanha precisa de um governo funcional com uma maioria parlamentar”, reforçou Merz, acrescentando que “esta eleição pode ser a nossa última oportunidade para restaurar a confiança pública”..Analistas mais confiantes na economia alemã e na expansão das despesas militares.Merz não esqueceu também o segundo lugar alcançado pela AfD, referindo que este resultado da extrema-direita foi “o último aviso” dado aos partidos tradicionais de que precisam de proporcionar aos alemães uma liderança efetiva. Um recado sobretudo para o SPD. “Este é realmente o último aviso para os partidos democráticos do centro na Alemanha para alcançaram soluções conjuntas”, enfatizou o conservador. “Devemos trabalhar juntos para resolver os problemas na Alemanha”, continuou Merz, a fim de “privar gradualmente este partido do seu terreno fértil”.Friedrich Merz apontou já também as três prioridades para o governo que irá liderar, e que passam por reforçar a defesa europeia face à nova política vinda dos Estados Unidos, enfrentar os desafios da imigração e proteger a base industrial da Alemanha. “Uma coligação preto-vermelha não trará uma mudança fundamental no apoio à Ucrânia. Os dois partidos querem continuar a apoiar a Ucrânia a nível militar, financeiro e humanitário”, nota Jana Puglierin, diretora do gabinete de Berlim do think tank Conselho Europeu para as Relações Internacionais. “O financiamento continua a ser um grande ponto de discórdia entre os dois partidos, com o SPD a opor-se a cortes massivos ao orçamento social. Merz também foi mais longe que Scholz no passado quanto aos riscos que a Alemanha está disposta a correr. O assunto dos [tanques] Taurus tornou isso claro. No entanto, neste capítulos as coisas vão mudar menos do que muitos pensam ou esperam”, refere a analista. Markus Söder, líder da CSU, partido irmão da CDU na Baviera, falou também sobre as negociações com os sociais-democratas, adiantando que os primeiros sinais são “encorajadores”, sublinhando que “precisamos de uma mudança fundamental de direção no nosso país, e acredito que tal mudança pode ser organizada com o SPD”.Mas deixou já claro que o próximo governo pretende fazer uma reforma urgente das políticas de migração da Alemanha, lutando contra a visão “herdada” da imigração em massa da era Merkel. “É por isso que é importante encerrar isto e começar um capítulo completamente novo”, reforçou Söder. Um sinal que já tinha sido dado pelos diplomas apresentados nos últimos meses pela CDU com vista a restringir a imigração no país, uma linha com a qual o SPD não concorda, devendo ser, portanto, um ponto de desacordo nas negociações entre os dois partidos. Outro tema que deverá marcas as negociações é o chamado “travão da dívida” na Alemanha, motivo que levou Olaf Scholz a demitir em novembro o seu então ministro das Finanças, o liberal Christian Lindner, e a consequente queda da coligação liderada pelos socais-democratas. Os Verdes, que fazem parte do governo de Scholz, defendem que esta questão deve ser resolvida antes de Merz assumir o poder, sendo que o líder da CDU já disse não se opor a uma reforma desta lei, estando também aberto a criar um fundo especial para financiar a ajuda à Ucrânia. Algo que não agrada ao SPD.A grande questão é que quando Merz assumir o poder e o novo Parlamento entrar em funções, a AfD, de extrema-direita, e o Die Linke, de esquerda radical, terão um terço dos deputados, o necessário para bloquear alterações à Constituição, como o “travão” da dívida - que atualmente restringe o défice orçamental a 0,35% do Produto Interno Bruto, apesar de excluir itens como um fundo especial para defesa ou a criação de um novo fundo especial. E estes dois partidos já mostraram ser contra esta revisão. Sabor amargo da derrota.O ainda chanceler Olaf Scholz classificou este domingo eleitoral como “um dia amargo para o SPD e hoje [segunda-feira] não melhorou”, depois de os sociais-democratas terem tido o seu pior resultado desde a Segunda Guerra Mundial - conseguiram apenas 16,41% dos votos, o que representa uma perda de 9,3 pontos em relação a 2021, passando de maior força política do país para o terceiro maior grupo do Parlamento. Scholz referiu que foi uma “grande honra” liderar a Alemanha no que chamou de “as circunstâncias mais desafiadoras” que o país enfrentou “desde 1945”, numa referência à invasão russa da Ucrânia, dizendo ainda estar orgulhoso de que, face a uma guerra travada “a apenas duas horas de avião”, Berlim não tenha abandonado Kiev.“Assim como assumi a responsabilidade pela vitória em 2021, assumo a responsabilidade por este resultado”, prosseguiu Olaf Scholz, prometendo continuar como chanceler da Alemanha “até ao último dia”.Este sentimento de amargura de Scholz foi partilhado pelo co-presidente do SPD, nomeadamente em relação aos candidatos que foram derrotados pela AfD no leste da Alemanha. “Quando olhamos para o mapa e vemos como as regiões do leste ficaram azuis [a cor da AfD], quando vemos a escala do desafio que a social-democracia enfrenta, sabemos que estes serão anos difíceis para nós”, declarou Lars Klingbeil, que passará também a ser líder parlamentar dos sociais-democratas. Olhando para o presente e o futuro do SPD, Klingbeil admitiu que “será uma batalha dura. Mas essa é a tarefa que nos foi dada pelo resultado eleitoral de ontem. Analisar o resultado, sim. Mas também: lutar.”Mesmo assim, garantiu o líder dos sociais-democratas, o SPD deve estar pronto a agir face a um mundo que está “turbulento” fruto da imprevisibilidade do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “É responsabilidade da Alemanha tornar a Europa forte nos próximos anos, e isso exigirá um SPD capaz”.Lars Klingbeil agradeceu ainda a Olaf Scholz pelo seu mandato como chanceler, sublinhando que, no futuro, “as pessoas olharão para o seu mandato de maneira muito diferente”.