Jong-un, sorridente, acompanhado da filha Ju-ae junto ao mar.
Jong-un, sorridente, acompanhado da filha Ju-ae junto ao mar.EPA/KCNA

Kim Jong-un inaugura a Benidorm da Coreia do Norte

Chama-se Wonsan Kalma a estância turística construída em cima e ao longo de quatro quilómetros de praia.
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Demorou mais de dez anos a sair do papel e a partir de 1 de julho estará de portas abertas. Para quem, desconhece-se. Mas o ditador Kim Jong-un classificou a estância turística Wonsan Kalma de "um dos maiores sucessos do ano" durante a cerimónia de inauguração.

Prova de que a República Popular Democrática da Coreia vive num mundo muito próprio, a festa de inauguração decorreu na terça-feira, mas as notícias do acontecimento só foram divulgadas nesta quinta-feira.

Acompanhado da filha Kim Ju-ae e da mulher Ri Sol-ju (reaparecida em público ao fim de 17 meses), Jong-un anunciou que o país iria construir mais zonas turísticas de massas no menor tempo possível. "Kim Jong-un expressou a crença de que a onda de felicidade gerada na zona turística costeira de Wonsan Kalma reforçaria a sua reputação como uma estância turística cultural de nível mundial", veiculou a agência noticiosa norte-coreana KCNA. Segundo a mesma fonte, os hotéis e demais apartamentos turísticos podem albergar até 20 mil ociosos, servidos de instalações desportivas e recreativas, caso do parque aquático no qual Jong-un observou um homem a saltar de um escorrega.

As autoridades norte-coreanas inspiraram-se no modelo de Benidorm.
As autoridades norte-coreanas inspiraram-se no modelo de Benidorm. EPA/KCNA

Apesar de a KCNA descrever o complexo como uma "cidade turística costeira com um estilo próprio, sem par no mundo", o modelo terá sido inspirado em Benidorm após uma visita das autoridades norte-coreanas a dois parques temáticos daquela localidade situada na província espanhola de Alicante.

A cidade oriental de Wonsan, com mais de 350 mil habitantes, dotada de um porto fundado pelos japoneses, e de um aeroporto renovado, está ligada à capital Pyongyang por via ferroviária e por uma autoestrada. Na sua província situa-se a mais importante das quatro estâncias de esqui do país, Masikryong. O objetivo do regime totalitário é o de aproveitar as brechas do regime de sanções de que é alvo por parte das Nações Unidas: o turismo é das poucas atividades geradoras de receitas que escapam às limitações económicas em resultado do seu programa de armas nucleares.

Em 2015, Pyongyang anunciou que a zona turística especial de Wonsan, uma área com mais de 400 km2, estava aberta a investimento estrangeiro valor de 1,5 mil milhões de dólares. As brochuras então impressas em várias línguas descreviam a região com nada menos de 680 atrações turísticas, 140 relíquias históricas, 10 praias de areia, quatro fontes minerais, vários lagos naturais e "mais de 3,3 milhões de toneladas de lama com propriedades terapêuticas". Mas o investimento estrangeiro, que se saiba, nunca se concretizou.

A quem se destina o complexo turístico é outra questão. Poderá servir as elites do regime que, ao contrário do que apregoa, é profundamente desigual, regendo-se por um sistema de castas. Segundo a rádio sul-coreana KBS, os norte-coreanos têm direito a 14 dias de férias por ano, mas esse número varia consoante o trabalho ao mínimo de sete e ao máximo de 21. Na prática, porém, é frequente a mobilização para campanhas de trabalho, pelo que as férias não estão garantidas. Além disso, a esmagadora maioria da população não teria como pagar a estada, dado os exíguos rendimentos. Por fim, a população não tem liberdade de movimentos, como realça o relatório da Human Rights Watch. Para um norte-coreano se movimentar para outra província necessita de autorização.

O objetivo será o de atrair estrangeiros e, em consequência, de divisas. Mas também nesse capítulo a situação não é risonha. Em 2015, Pyongyang dizia querer atrair um milhão de turistas por ano no futuro próximo e até 10 milhões mais tarde. A realidade é que desde a pandemia, o país, já de si fechado, mais ficou. A reabertura anunciada há meses, e que se chegou a concretizar com a realização de uma maratona na capital com a participação de atletas estrangeiros, foi interrompida. A fronteira com a China, em Rason, esteve aberta durante duas semanas.

Na cerimónia de inauguração não faltou o embaixador russo e membros da sua delegação. Na Coreia do Sul especulou-se se a Rússia não terá ajudado a completar as obras em resultado da cada vez mais estreita relação entre Pyongyang e Moscovo.

Outra relação (tangente) com a Rússia: há dez anos outro regime opressor, o da Síria, em plena guerra civil, lançou uma campanha publicitária para os turistas fazerem férias nas praias de Tartus, a cidade mediterrânica onde a Rússia tinha a sua base naval.

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