Israel sofre primeira demissão por causa do 7 de outubro. E Netanyahu?
O diretor do serviço de inteligência militar de Israel, general Aharon Haliva, apresentou ontem o pedido de demissão pela sua “responsabilidade” no ataque do Hamas, tornando-se assim no primeiro alto funcionário israelita a renunciar ao cargo por não ter conseguido impedir os acontecimentos de 7 de outubro que desencadearam a guerra em Gaza e colocaram o governo e os militares sob intenso escrutínio em Israel. O líder da oposição, Yair Lapid, pediu a Benjamin Netanyahu que siga este exemplo e abandone o poder.
“A divisão de inteligência sob o meu comando não cumpriu a tarefa que nos foi confiada. Carrego aquele dia negro comigo desde então, dia após dia, noite após noite. Levarei a dor comigo para sempre”, escreveu Haliva na sua carta de demissão, na qual confirmou que se manterá em funções até ser substituído. “Até ao final do meu turno farei tudo pela derrota do Hamas e daqueles que nos querem prejudicar e, trabalharei pelo regresso dos cativos e desaparecidos às suas casas e terras”, referiu ainda. A 7 de outubro, o Hamas matou 1170 pessoas e sequestrou 253, acreditando-se que 129 reféns ainda estejam nas mãos dos islamistas.
Pouco depois de ser conhecida a demissão de Haliva, o líder da oposição israelita, Yair Lapid, pediu ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu que siga este exemplo e se demita por causa das falhas que levaram ao ataque do Hamas. “Com a autoridade vem uma grande responsabilidade”, escreveu Lapid na rede social X, considerando “honrosa” a decisão do general. “Teria sido apropriado que o primeiro-ministro Netanyahu tivesse feito o mesmo”, acrescentou Lapid.
No mesmo sentido, Vladimir Beliak, outro deputado do partido Yesh Atid, de Lapid, apelou à demissão “imediata” do líder israelita, independentemente da criação de uma comissão de inquérito estatal para identificar os responsáveis pela gestão da “tragédia” de 7 de outubro. Por enquanto, o único inquérito ainda em curso é o que o exército abriu internamente no final de fevereiro, cujas conclusões deverão ser apresentadas ao chefe do Estado-Maior israelita, Herzi Halevi, no início de junho.
Na opinião de Omar Ashour, professor no Doha Institute for Graduate Studies, a carta de demissão do general Aharon Haliva foi uma “clara sugestão ou provocação” para que Netanyahu seguisse o seu exemplo e se demitisse. “Mas conhecendo Netanyahu, é altamente improvável que mude de posição. Teremos que esperar para ver, sempre há surpresas nesta guerra”, prosseguiu este especialista britânico.
Também Akiva Eldar, escritor israelita e antigo colunista do Haaretz, disse que Haliva demitiu-se porque, provavelmente, Netanyahu não vai acabar com a guerra em Gaza tão cedo, mas também porque o primeiro-ministro “não está interessado em trazer os reféns de volta para Israel”. “Netanyahu é a autoridade máxima e nunca assumiu a responsabilidade [pelo ataque do Hamas], então Haliva quis enviar uma mensagem pessoal para lhe dizer: ‘Se eu consigo, você consegue’”, disse Eldar, em declarações à Al Jazeera.
Em meados de fevereiro, e perante os crescentes protestos em várias cidades a pedir a sua demissão, Netanyahu afastou um cenário de eleições antecipadas. “A última coisa de que precisamos neste momento são de eleições e lidar com eleições, uma vez que isso nos dividirá imediatamente”, disse, na altura, sendo que os protestos contra a ação do governo têm sido uma constante. Este sábado não foi exceção e milhares de israelitas voltaram às ruas a pedir novas eleições e a exigir mais ações do governo para trazer para casa os reféns detidos em Gaza.
Duas sondagens publicadas a propósito dos seis meses da guerra contra o Hamas, mostram que quase três quartos dos israelitas querem que o primeiro-ministro se demita, com quase metade do país também a preferir eleições antecipadas para o Parlamento. É também mostrado que o governo seria derrotado caso fosse agora a votos.
Os números da estação pública Kan mostram que 42% consideram que Netanyahu devia renunciar já, e 29% que devia renunciar após o fim da guerra, perfazendo um total de 71% que defendem sua demissão. Já os do Channel 12 referem que 50% acreditam em eleições antecipadas, 41% são contra e 9% disseram que não sabem.
ana.meireles@dn.pt