O vídeo de Chuck Schumer a gritar “Vamos vencer, vamos vencer”, num comício intitulado “Ninguém Elegeu Elon [Musk]”, que foi motivo de chacota nos principais late nights das televisões americanas é talvez o melhor exemplo da falta de uma voz forte no Partido Democrata neste início da segunda era Trump. “Estamos tramados. Com todos estes homens velhos”, exclamou Jimmy Kimmel no monólogo que abre o seu Jimmy Kimmel Live!, perante as imagens do líder da minoria democrata no Senado, de 74 anos, rodeado por alguns eleitos democratas, de punho erguido, e que continuou a gritar “não vamos descansar”. Depois de o presidente Joe Biden ter desistido de procurar um segundo mandato - pressionado por todos os lados devido à sua idade e à aparente degradação da sua saúde - e da derrota da sua vice Kamala Harris frente a Donald Trump nas Presidenciais de novembro, o Partido Democrata parece estar com dificuldade em encontrar uma figura de peso que fale em seu nome. Confrontado com uns primeiros dias de atividade efervescente da nova Administração Trump - desde que tomou posse, a 20 de janeiro, o republicano já assinou dezenas de ordens executivas - a retirar os EUA do Acordo de Paris sobre o clima, a acabar com o direito de cidadania dado a filhos de imigrantes ilegais nascidos na América (entretanto travado pelos tribunais), a banir as mulheres trans das competições desportivas, a desmantelar a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional - USAID (também já travada), a renomear o Golfo do México como Golfo da América, etc. E no dia 4, durante a visita do primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu à Casa Branca, apresentou mesmo um plano para o futuro da Faixa de Gaza que especula sobre a entrega do território aos EUA, que o esvaziaria dos seus habitantes e ali criaria uma “Riviera do Médio Oriente”. Até agora a resposta democrata a este frenesim de atividade presidencial tem estado sobretudo a cargo de Schumer, mas também de Hakeem Jeffries, o líder da minoria democrata na Câmara dos Representantes. Mas não faltam vozes dentro do partido a denunciar o que dizem ser uma resposta fraca à segunda Presidência Trump.“A liderança democrata age como se fosse permanentemente 2006, um ano em que, sim, recuperámos o Senado, mas também antes de os republicanos encontrarem um líder de culto e perderem a cabeça de forma coletiva”, afirmou ao jornal The Hill a estratega democrata Christy Setzer. A analista, que trabalhou nas campanhas de Al Gore e Howard Dean, lembra que estes tempos já passaram, acrescentando que agora “temos um vigarista e criminoso condenado na Sala Oval que tenta todos os dias transformar o país numa ditadura. Temos de agir como tal”. E isso, segundo ela, passa por “não estarmos zangados por Trump tentar congelar o financiamento federal de manhã, mas votarmos a favor do seu secretário do Tesouro - que vai destruir a economia - à tarde. Parem de ajudar Trump!”. Quem também já fez chegar o seu desagrado a Schumer terá sido um grupo de seis governadores democratas, entre eles JB Pritzker, do Illinois, e Maura Healey, do Massachusetts, que numa chamada telefónica com o líder da minoria no Senado, noticiada pelo diário The New York Times, o pressionaram a ser mais duro na oposição a Trump.Uma posição que não parece sequer ser consensual entre os senadores democratas, com uns a defender uma estratégia mais agressiva e os que em 2026 vão estar envolvidos em disputas eleitorais renhidas a apostarem no compromisso.Depois da pesada derrota nas Eleições Presidenciais de novembro passado, em que Kamala Harris fez pior do que Joe Biden fizera em 2020 no eleitorado que lhe devia ser mais favorável - como as mulheres, os negros ou os latinos -, os democratas “têm de encontrar novas formas de chegar às audiências que precisam de conquistar”, explicou Rodell Mollineau também ao The Hill. O estratega, que trabalhou com o ex-líder da maioria no Senado, Harry Reid, acredita que “temos de ser mais inteligentes quanto a onde lutamos, quando lutamos e como lutamos para maximizar o nosso efeito de alavanca”. Realinhar o partidoComo preencher este vazio e encontrar uma estratégia que volte a alinhar o partido com as preocupações dos americanos será um dos desafios para o novo presidente do Comité Nacional Democrata (DNC). No passado dia 1, Ken Martin foi o escolhido pelos membros do comité, depois de uma campanha em que o presidente do Partido Democrata Agricultores-Trabalhadores do Minnesota se ter distinguido pela franqueza com que admitiu as dificuldades que o partido atravessa. “Levámos um murro na boca em novembro”, afirmou, citado pela revista The Nation. “Muitas pessoas neste país vão precisar de nós, o que significa que vamos ter de lutar contra os extremos de Donald Trump enquanto defendemos, tanto nos Estados vermelhos como nos azuis, a razão pela qual nos devem confiar os seus votos. Quando a agenda de Trump falhar para os americanos - o que certamente acontecerá, e já aconteceu - temos de estar presentes com a alternativa legítima a este caos.”E num momento em que os democratas já olham não só para as Eleições Intercalares de 2026 - em que esperam recuperar pelo menos uma das câmaras do Congresso e tornar a tarefa de Trump na segunda metade do mandato mais difícil -, mas também já começam a pensar em quem pode ser o seu candidato à Presidência em 2028, Martin foi buscar a canção Which Side Are You On para perguntar: “Estamos do lado do barão ladrão, do multimilionário ultrarrico, do poluidor de petróleo e gás, do destruidor de sindicatos? Ou estamos do lado da família trabalhadora, do pequeno empresário, do agricultor, dos imigrantes, dos estudantes?” E garantiu: “Deixem-me dizer-vos: Eu sei de que lado estou.”O cenário pode não ser tão catastrófico para os democratas como foi depois das Presidenciais de 1984, quando o republicano Ronald Reagan ganhou frente ao democrata Walter Mondale em todos os estados menos no Minnesotta, mas a falta de uma figura forte dentro do partido não deixa de ser um problema. E se não falta quem sonhe ver aparecer um líder carismático e inesperado, como aconteceu com Barack Obama antes das eleições de 2008, a verdade é que esse não é o perfil dos candidatos que se perfilam para, em 2028, disputar as Presidenciais mais abertas dos últimos anos, uma vez que Trump não se pode recandidatar.A s listas de potenciais candidatos democratas às próximas presidenciais vai mudando de meio de comunicação para meio de comunicação, mas o jornal The Washington Post, por exemplo, tinha há dias uma lista de nomes em que se distinguiam os governadores da Pensilvânia, Josh Shapiro, do Michigan, Gretchen Whitmer, e da Califórnia, Gavin Nesom, o antigo secretário dos Transportes Pete Buttigieg, a própria Kamala Harris ou os senadores John Fetterman e Ruben Gallego..POSSÍVEIS CANDIDATOS PARA 2028Josh Shapiro.Uma questão que muitos democratas se colocam é: “E se Kamala Harris tivesse escolhido Josh Shapiro em vez de Tim Walz para vice-presidente?” Nunca saberemos se o resultado teria sido diferente com o governador da Pensilvânia, mas muitos desejam agora ver este homem jovem (51 anos), popular e profundamente conhecedor deste eleitorado de colarinho azul como candidato a presidente em 2028.Gretchen Whitmer.Haverá, com certeza, quem tenha muitas dúvidas em voltar a apostar numa mulher em 2028, depois das derrotas de Hillary Clinton em 2016 e Kamala Harris em 2024, mas a governadora do Michigan, de 53 anos tem um dos currículos mais sólidos desta lista de potenciais candidatos, além de ver o seu mandato como governadora terminar em 2027.Pete Buttigieg.O ex-secretário dos Transportes de Joe Biden é um dos democratas mais populares. Conhecido pela eficiência e competência, tem histórico de se bater bem em território adverso, como a Fox News. No entanto, o facto de ser homossexual ainda é visto como potencialmente negativo junto dos eleitores conservadores. Aos 43 anos, pode antes optar por candidatar-se a governador do Michigan em 2026.Gavin Newsom.Até aos incêndios mortíferos que marcaram o início do ano em Los Angeles, o governador da Califórnia, de 57 anos, encabeçava quase todas as listas de candidatos a 2028. Mas as dificuldades de gestão e as críticas, mancharam a sua imagem de competência. Ambicioso, orador talentoso e habituado a dialogar com os republicanos, resta saber se tem tempo para recuperar a imagem até às próximas Presidenciais.Kamala Harris.É verdade que não conseguiu conquistar os eleitorados que a podiam ter levado à Casa Branca, mas não é menos verdade que a demora de Joe Biden em desistir da candidatura deixou apenas uns curtos meses à sua vice-presidente, de 60 anos, para montar a campanha. Arriscará voltar a tentar a sua sorte em 2028? Nada é menos certo, até porque, pelo meio, fala-se na sua possível candidatura a governadora da Califórnia, já nas intercalares de 2026. Ruben Gallego.Eleito em novembro senador do Arizona, um Estado que deu a vitória a Trump, por ser hispânico, ex-militar da Marinha e jovem (45 anos), Gallego é uma das estrelas em ascensão no partido. Capa de apelar aos eleitores de todos os quadrantes, parece ter compreendido os problemas dos democratas com a imigração e os latinos antes de quase toda a gente.