"Carnificina" em Mariupol matou "mais de 20 mil civis"
As imagens de satélite, que os serviços militares britânicos disponibilizaram revelam o que parecem ser os preparativos para a "grande ofensiva": a Sul foram detetados movimentos militares em direção à cercada Mariupol: um vem da região de Melitopol, o outro em sentido contrário vem da zona de fronteira russa; de Melitopol saiu também uma força em direção a Zaporizhzhia, mais a Norte; das fronteiras russas, a Leste, há um reforço militar na direção de Donetsk e Luhansk; ligeiramente mais a Norte, surgem dois movimentos a caminho de Izyum; um vem de Leste, o outro vem de zonas controladas pela Rússia a sul de Kharkiv.
"É um período crucial" garantem "fontes ocidentais", citadas pela BBC, que avaliam estes sete movimentos, e outros, à "medida que os militares russos se reagrupam, reequipam e redistribuem".
A concentração de forças militares russas e ucranianas nestas áreas, uma frente de guerra, em forma de lua minguante, com cerca de mil quilómetros de extensão - Zelensky fala em dezenas de milhares de soldados russos, Putin diz que a "operação está a decorrer como planeado" - permite antever "batalhas decisivas".
Durante quanto tempo? "Depende da intensidade dos combates. E não há dúvida de que os objetivos serão alcançados", afirmou o presidente russo, esta terça-feira à tarde, durante uma visita ao cosmódromo Vostochny, no leste da Rússia.
"A nossa missão é atingir todos os objetivos estabelecidos, minimizando ao mesmo tempo as baixas. Vamos agir com firmeza, calma, de acordo com o plano que foi inicialmente elaborado pelo Estado-Maior", garantiu.
O que se espera é "uma batalha sangrenta e decisiva", escreveu Jonathan Beale, jornalista da BBC que está no Donbas junto das tropas ucranianas. Na zona Leste haverá, nesta altura "forças similares": entre "30 a 40 mil militares de cada lado". Porém, a intenção russa é "duplicar ou mesmo triplicar" o número de tropas no terreno dado que terá "perdido 20% da sua força militar" envolvida no conflito.
Vladimir Putin, acompanhado por Alexander Lukashenko, presidente da Bielorrússia, apresentou durante a visita ao cosmódromo, em declarações citadas pela agência noticiosa oficial TASS, o argumento da nobreza para justificar os ataques à Ucrânia.
"Os objetivos [da guerra] são absolutamente compreensíveis e nobres. (...) Era simplesmente impossível continuar a suportar este genocídio. A nossa lógica é simples. O nosso objetivo é ajudar as pessoas que vivem no Donbas, que sentem uma ligação inquebrável com a Rússia e que durante oito anos foram vítimas de genocídio [tese russa] ", afirmou.
A guerra, sustenta o presidente russo, "era inevitável, a única questão era o tempo". E o tempo era agora porque "obviamente, não tínhamos outra escolha".
A explicação para a decisão de invadir a Ucrânia - que agora tem esse acrescento de "nobre" - foi a mesma que apresentou a 24 de fevereiro: "O neonazismo, infelizmente, tornou-se um facto da vida num país relativamente grande e próximo de nós (...) a Ucrânia começou a ser transformada numa base antirrussa, os rebentos do nacionalismo e do neonazismo, que existem há muito tempo, começaram a crescer no país".
E as negociações? "Voltámos de novo a uma situação sem saída" por causa das alegações ucranianas sobre "crimes de guerra", disse Putin. Alexander Lukashenko tem uma explicação para as denuncias de atrocidades: "É uma operação psicológica realizada pelos ingleses."
Mykhailo Podolyak, conselheiro de Zelinsky, garantiu à Reuters, que as negociações não estão num beco "sem saída", como alega Putin. "Continuam apesar de serem difíceis", assegurou. O que justifica as declarações do presidente russo? "Pressionar as futuras negociações de paz".
Podolyak lamenta que a Rússia "mantenha as suas tradicionais táticas de pressão pública sobre o processo de negociações, em particular através de certas declarações".
Vladimir Putin que admitiu que a "operação russa" na Ucrânia é uma "tragédia", sem explicar porquê, elaborou ainda, durante a visita, uma explicação geopolítica para o que está a acontecer. O mundo, diz, está a assistir à "rutura do sistema mundial unipolar que foi formado após a desintegração da União Soviética".
O presidente da Bielorússia, citado pela agência estatal Belta, ensaiou um acrescento à "análise" de Putin argumentando que este ataque à Ucrânia é um ataque preventivo contra o Ocidente que se preparava para "esmagar" Moscovo.
"Se a Rússia tivesse adiado um pouco a sua operação militar, eles [o Ocidente] teriam aplicado, como dizem, um golpe esmagador à Rússia, nas regiões vizinhas. Estamos agora claramente convencidos de que isso era possível. Portanto, se alguém duvida da justiça da decisão, imagine o que poderíamos ver apenas meio mês ou um mês depois", afirmou Alexander Lukashenko.
O presidente da câmara de Mariupol, Vadym Boychenko, revelou, esta terça-feira , em declarações à Reuters, que a estimativa mais recente aponta para que tenham morrido cerca de 21 mil civis vitimas dos ataques russos. Os combates de rua, justifica, têm impedido calcular o número exato. Por seu lado, o chefe da administração militar de Donetsk, Pavlo Kyrylenko, acredita que o número de mortes pode chegar às 22 mil. Zelinsky alertou para a existência de "dezenas de milhares" de mortos.
Vadym Boychenko, em declarações à Associated Press, acusa Moscovo de impedir a entrada de comboios humanitários na cidade, na tentativa de esconder a "carnificina".
O autarca garante que as forças russas levaram para Mariupol equipamentos móveis de cremação para retirar das ruas os corpos que vão "preenchendo as estradas".
O porta-voz dos separatistas ucranianos apoiados por Moscovo, Eduard Basurin, que na segunda-feira, afirmou à televisão estatal russa que os separatistas usariam o que denominou por "tropas químicas" contra os soldados ucranianos, escondidos na fábrica de aço em Mariupol, para os "expulsar de lá", hoje disse à agência russa Interfax que as suas forças "não utilizaram nenhuma arma química".
Numa mensagem no Telegram, o fundador do regimento Azov da Ucrânia, Andrei Biletsky alegava que a Rússia tinha usado uma substância venenosa, de origem desconhecida, largada por um drone na fábrica Azovstal e que tinha provocado três feridos.
Em declarações à Reuters, um alto funcionário do ministério da Defesa dos Estados Unidos afirma que não foi ainda possível confirmar se houve ou não usos de armas químicas em Mariupol. Norte-americanos e britânicos estão a analisar a denúncia. O governador de Donetsk diz ser "demasiado cedo" para ter certezas.
James Heappey, ministro britânico das Forças Armadas, citado pela BBC, afirma que o caso precisa de uma investigação adequada. E se se provar que a Rússia usou armas químicas? "Nada está descartado" na NATO, mas o mais provável será um reforço das sanções e a entrega de mais armas à Ucrânia.