Bruxelas vai controlar as exportações de vacinas contra a covid-19
Bruxelas rejeita a ideia de se tratar de uma medida protecionista. O vice-presidente da Comissão Valdis Dombrovskis diz que é antes uma forma de tornar o processo "mais transparente", depois de a AstraZeneca ter anunciado uma redução no número de doses para a União Europeia. Dombrovskis considera que era "tempo de agir", para dar prioridade à "proteção dos cidadãos".
"A comissão adotou medidas estritamente direcionadas, que nos vão permitir reunir informação sobre a produção das vacinas, e para onde os fabricantes pretendem enviá-las", afirmou o comissário. "A medida é limitada no tempo", devendo estar em vigor até "ao final de março".
Este mecanismo dirige-se "especificamente para as vacinas contra a covid-19, com as quais há contratos de pré-compra", precisou Valdis Dombrovskis. "Tivemos de desenhar este mecanismo para trazer transparência, mas também para evitar fragmentação no nosso mercado interno", completou.
A Comissão Europeia foi surpreendida na semana passada pela informação da AstraZeneca de que não teria doses suficientes para a União Europeia. Mas, ao mesmo tempo, não têm sido fornecidas as quantidades contratualizadas com o Reino Unido, produzidas no espaço comunitário. A comissária da Saúde, Stella Kyriakides afirma no entanto que não se trata de uma medida protecionista.
"Não estamos a proteger-nos contra qualquer país em específico. Não estamos numa competição, nem numa corrida contra qualquer país. A única corrida em que estamos é contra este vírus", disse.
A vacina foi aprovada hoje pela Agência Europeia do Medicamento, no auge de um braço de ferro que coloca a farmacêutica anglo-sueca em rota de colisão com a União Europeia.
Já esta sexta-feira a Alemanha pressionou para que esta aprovação tivesse em conta "limitações" no desenvolvimento do composto, produzido a partir de uma técnica que utiliza um vírus modificado, para assumir as características da proteína spike de modo a instruir o sistema imunitário do recetor.
A Alemanha desaconselhou até o uso da vacina produzida em parceria com a Universidade de Oxford, para a AstraZeneca, em maiores de 65 anos. Mas, a diretora executiva da Agência Europeia do Medicamento, Emer Cooke anunciou a aprovação sem restrições, apesar de a vacina não ser perfeita. Mas, "nenhuma é", frisou.
"Temos agora três vacinas desenvolvidas e recomendadas para aprovação, contra uma doença que não conhecíamos há um ano. Nenhuma delas é perfeita. Nenhuma delas tem as características que pudéssemos querer, para nos ajudar a sair disto completamente. Nenhuma delas é uma varinha mágica por si própria", disse a diretora da Agência, admitindo que "em conjunto, vão dar-nos ferramentas e opções, para prevenir diferentes aspetos desta doença".
No contrato assinado com Bruxelas, a empresa compromete-se a desenvolver "os melhores esforços" para assegurar um número de doses contratualizadas com a União Europeia.
Mas, ao longo das 41 páginas do contrato lê-se também que "caso a capacidade da AstraZeneca de cumprir as obrigações (...) seja impedida por um acordo concorrente, a AstraZeneca informará imediatamente a Comissão".
Mas, neste caso a farmacêutica deve "continuar a usar os melhores esforços razoáveis para se envolver com próprios fornecedores e fabricantes, para utilizar todas as capacidades e componentes" para produzir o número contratualizado de vacinas.
A Comissão compromete-se a "ajudar a encontrar uma solução mutuamente aceitável para este Contrato e o contrato concorrente", pode ler-se na cláusula que desencadeou a controvérsia.
Foi ao abrigo desta cláusula que a empresa informou a comissão europeia na sexta-feira que apenas conseguiria fornecer uma fração das 300 milhões de doses da vacina ainda não autorizada contra o novo corona vírus.
Fontes da comissão Europeia ouvidas pelo DN admitem que se trata de uma questão de interpretação de um "termo jurídico objetivo, e estabelece condições contratuais".
Mas, no contrato divulgado com extensas partes censuradas, como o número de doses, ou os custos envolvidos, pode ler-se também que "se o desempenho da AstraZeneca sob este Contrato for impedido por qualquer um dos contratos concorrentes, a AstraZeneca não deve ser considerada em violação deste Contrato, no caso de haver atrasos nas entregas".
Enquanto a Europa espera por vacinas, contra o coronavirus, a mesma fonte conhecedora das negociações com a farmacêutica admite que o caso pode terminar nos tribunais.