Bombas em Brasília. O que se sabe e o que falta saber
O que aconteceu às 19h30 (22h30, em Lisboa) de quarta-feira na Praça dos Três Poderes em Brasília?
Na ressaca de um dia intenso no Congresso, os parlamentares e os jornalistas presentes numa conferência de imprensa foram surpreendidos com ruídos fortes do lado de fora a que não prestaram particular atenção. Os ruídos vinham da entrada da sede do Supremo Tribunal Federal (STF) onde um homem carregado de explosivos, se implodiu e morreu.
Seguranças aperceberam-se de que ele carregava na mão o que poderia ser um relógio e transeuntes contaram que ele fez sinal de joinha – polegar levantado, como quem pergunta ‘tudo bem?’ – ao passar por eles.
O que as autoridades fizeram inicialmente?
Interditado o local onde se verificaram as explosões e se encontrava o corpo, a polícia rastreou-o através de robôs preparados para detectar bombas – no total, quatro, algumas no cinto que o terrorista usava, já foram desativadas. Mas a varredura prossegue, razão pela qual o cadáver ainda não foi retirado do local, 14 horas após as explosões.
Entretanto, quase em simultâneo àquelas explosões, ocorreu outra, a cerca de 300 metros de distância, num carro estacionado no parque da Câmara dos Deputados. Foi através de documentos na viatura que a polícia chegou à identificação do terrorista.
Quem é o terrorista?
Francisco Wanderley Luiz, 59 anos, era chaveiro de profissão e disputou, pelo PL, o partido onde milita Jair Bolsonaro, a eleição municipal de 2020, sob nome de urna Tiü França, em Rio do Sul, no estado de Santa Catarina, mas não foi eleito.
Antes de morrer, publicou uma série de mensagens sobre o ataque, misturando declarações de cunho político e religioso.
“Vocês poderão comemorar a verdadeira Proclamação da República”, diz uma das mensagens, a propósito de sexta-feira, dia 15, quando se assinala aquela data no Brasil.
"Vamos jogar??? Polícia Federal vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas de merda: William Bonner, José Sarney, Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin… Vocês quatro são velhos cebosos [sic] nojentos”, escreveu ele noutra, referindo-se a um apresentador da TV Globo, a dois antigos presidentes e ao atual vice de Lula da Silva.
Noutra mensagem diz ainda que escolheu o dia 13 para lançar a bomba por não gostar do número – "13" é o número que o PT, de Lula, usa nas urnas eletrónicas.
Na página de Luiz no Facebook, entretanto removida, ele dizia ser empreendedor, investidor e desenvolvedor. O suicida publicou ainda uma fotografia dentro do STF, tirada supostamente em agosto, num sábado, que ele legendou “deixaram a raposa entrar no galinheiro”.
O terrorista costuma visitar Brasília?
Jorge Guetten, um deputado também de Santa Catarina do Republicanos, partido com ligações à IURD, disse conhecer Francisco Wanderley Luiz, que chamou de “boa gente” mas “muito abalado”, e admitiu tê-lo recebido em agosto no Congresso.
Celina Leão, vice-governadora do Distrito Federal, disse em conferência de imprensa que Luiz tentou entrar no STF na noite de quarta-feira, sem sucesso.
Luiz é um “lobo solitário” ou agiu em grupo?
Tudo aponta que Luiz agiu sozinho, de acordo com a Abin, o serviço de inteligência do Brasil. Mas a investigação ainda decorre, nomeadamente em Ceilândia, cidade nos arredores de Brasília onde o terrorista alugou uma casa nos últimos dias. Lá, a polícia colheu materiais, incluindo outras bombas, que podem elucidar se Luiz era um lobo solitário ou se teve apoio exterior.
Quem seriam os visados?
Segundo o teor das mensagens conhecidas, os supostos alvos de Luiz eram difusos – o governo do PT, ex-presidentes, um apresentador da TV Globo e “comunistas” em geral. Mas a julgar pela tentativa de entrada na sede do STF e de as explosões se terem verificado em frente a esse edifício, junto a uma estátua que simboliza a justiça, tudo indica que a intenção seria detonar as bombas na Corte ou, no mínimo, ameaçá-la. Alexandre de Moraes, um dos 11 juízes do STF, tem sido o maior alvo do bolsonarismo desde há aproximadamente quatro anos por ter em mãos processos contra o ex-presidente e aliados seus. A mulher do suspeito confirmou à PF que ele queria matar o magistrado.
Quais as consequências políticas do ato?
O PT, partido de Lula, condenou-o e comparou-o ao 8 de Janeiro, quando milhares de bolsonaristas inconformados com os resultados da presidencial de 2022 invadiram e depredaram as sedes dos três poderes.
Já entre aliados de Bolsonaro o tom era de desalento, segundo trocas de mensagens no Whatsapp divulgadas pela imprensa: o ato ocorreu numa altura em que a extrema-direita, animada com o triunfo de Donald Trump nos EUA, buscava uma amnistia para os presos do 8 de Janeiro e até para Bolsonaro, inelegível por oito anos. Oficialmente, porém, minimizam eventual relação entre o terrorista e o ex-presidente.