Enquanto o controverso plano de recambiar imigrantes indocumentados para a Albânia continua a enfrentar obstáculos legais -- no sábado, a totalidade das pessoas enviadas dias antes de navio, voltaram para Bari, no sul de Itália --, o governo de Giorgia Meloni continuou enredado no chamado caso Almasri, sobre a libertação e deportação de um líbio procurado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes contra a humanidade. Sem a presença da chefe do executivo no Parlamento para dar explicações sobre o tema, coube aos ministros da Justiça e do Interior tentar apaziguar a indignação dos opositores. Osama Almasri Najim, chefe da polícia judiciária da Líbia, encontrava-se em Turim para ver um jogo de futebol da Juventus, mas foi detido no hotel em que estava hospedado. Sobre este diretor da cadeia de Mitiga, para migrantes, pende um mandado de captura emitido pelo TPI há dez anos por crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Enquanto chefe da prisão, é responsável pela morte de 35 pessoas e de agressões sexuais a outras 22, entre as quais uma criança de cinco anos. Almasri acabou libertado por ordem do tribunal da Relação de Roma, por razões processuais, e deportado para Tripoli num avião do Estado italiano, onde foi recebido como um herói. Na semana passada, o Ministério Público italiano anunciou que iria investigar Giorgia Meloni, Carlo Nordio (ministro da Justiça) e Matteo Piantedosi (ministro do Interior), suspeitos de terem facilitado a libertação do líbio bem como o seu regresso a Trípoli. Perante os eleitos, Nordio contestou a documentação recebida: à comunicação da Interpol faltava um pedido de extradição, ao mandado de captura do TPI havia uma incoerência nas datas e estava escrito em inglês com passagens em árabe. Em suma, se desse aval ao mandado, estaria a realizar um “ato inválido”. Já Piantedosi alegou que a decisão de “expulsar Almasri deve ser vista como necessidade de salvaguardar a segurança do Estado e a proteção da ordem pública”. As explicações não convenceram a oposição, que mostrou fotografias de migrantes subsarianos torturados na prisão de Mitiga e empunhou cartazes com as frases “Onde está Meloni?” e “Meloni, a patriota em fuga”. A líder do Partido Democrático, Elly Schlein, disse que Nordio “não falou como ministro, mas como advogado de defesa de um torturador”. O ex-primeiro-ministro e líder do Movimento 5 Estrelas, Giuseppe Conte, acusou a líder dos Irmãos de Itália de “cobardia institucional”. .“Com Meloni, pensava-se que se tinha encontrado a dama de ferro, mas na realidade encontrou-se o homem manteiga: forte com os fracos e fraco com os fortes.”Matteo Renzi, líder do partido Italia Viva . A falta de audácia foi também invocada pelo senador Matteo Renzi numa intervenção em que contrapôs a personagem homem manteiga, de Pinóquio, ao Frodo de O Senhor dos Anéis -- no fim de semana, a irmã de Meloni, Arianna, comparou Giorgia àquela personagem de J.R.R. Tolkien. “Se tivesse havido alguma coragem por parte da cobarde primeira-ministra, ela teria vindo aqui dizer que há um interesse nacional deste país e que esse interesse se chama ENI”, disse, em referência ao acordo de exploração de gás e petróleo por parte da empresa italiana em território líbio. “Se Meloni quisesse defender o interesse nacional, tê-lo-ia dito. Mas não o faz, liberta o torturador de crianças.” Outros apontam para a importância do acordo entre Bruxelas e Trípoli - do agrado de Roma - para que as autoridades líbias reprimam a imigração irregular. “Optou-se por ignorar a cooperação internacional judicial em nome da cooperação política com a Líbia”, considerou o porta-voz da Amnistia Internacional de Itália, Riccardo Noury. No final das sessões parlamentares na Câmara dos Deputados e no Senado, os partidos da oposição preparavam-se para entregar uma moção a exigir a presença de Meloni no Parlamento para ser confrontada com o caso.