Aliança de Modi e oposição celebram resultados eleitorais
Houve um tempo, em Portugal, em que todos ou quase todos os partidos declaravam vitória na noite eleitoral. O mesmo se passou na Índia, onde quer os partidos da aliança de Narendra Modi, quer a aliança da oposição, quer ainda os partidos regionais celebraram os resultados das eleições gerais que começaram há seis semanas.
À porta da sede do Partido do Povo Indiano (Bharatiya Janata Party, BJP), em Nova Deli, Narendra Modi reivindicou vitória, mas ao apresentar-se pela terceira vez como candidato a primeiro-ministro - e contra todos os prognósticos -, o discurso teve de ser retocado. Desta vez, o sucesso não foi do partido nacionalista hindu, mas da aliança que engloba dezenas de partidos a nível estadual, Aliança Democrática Nacional. E não só: “A vitória de hoje é a vitória da maior democracia do mundo”, afirmou, ainda sem saber os resultados finais. Mas quando se dirigiu aos seus fiéis, o primeiro-ministro já sabia que o BJP, apesar de pouco baixar em termos percentuais (de 37,4% para 36,7%), não só falhou a vitória esmagadora que os seus dirigentes e apoiantes previam (apontavam para a eleição de 400 deputados em 543) como recuou o suficiente para perder a maioria parlamentar.
Em 2019, o BJP assegurou 303 lugares e a sua aliança 353; cinco anos depois, o partido deverá eleger à volta de 240 deputados e a aliança não irá chegar aos 300. Contas simples: Modi terá de levar para o Governo os partidos de que passa a depender. O partido no poder fica “fortemente dependente da boa vontade dos seus aliados, o que os torna atores decisivos que se espera virem a cobrar a sua quota-parte, tanto em termos de formulação de políticas como de formação do Governo”, disse o diretor do Programa do Sul da Ásia no Carnegie Endowment for International Peace. “Este seria um território verdadeiramente desconhecido, tanto para os indianos como para o primeiro-ministro”, disse Milan Vaishnav à Associated Press.
Modi, de 73 anos, mostrou-se indiferente à queda nas preferências dos eleitores no discurso de meia-hora. Preferiu reafirmar a sua agenda, o que inclui elevar a economia indiana de quinta para terceira posição através de programas específicos para jovens, agricultores, bem como o aumento das exportações e o desenvolvimento da indústria da defesa. “Este país assistirá a um novo capítulo de grandes decisões. Esta é a garantia de Modi”, disse dele próprio.
Escolhido de Deus
A campanha eleitoral de Modi foi polarizadora como os dez anos do seu Governo nacionalista hindu. Numa entrevista, disse ter sido escolhido por Deus. Nos comícios, instilou medo entre os hindus das castas mais baixas, ao dizer que o maior partido da oposição, o Congresso de Rahul Gandhi, iria acabar com os programas de ação afirmativa, retirar-lhes o gado e as joias e dá-las aos muçulmanos.
Os partidos da oposição queixam-se de perseguição por parte do poder e o exemplo mais mediático é o do líder do partido anticorrupção Aam Aadmi, Arvind Kejri- wal. Este aguerrido crítico de Modi, ministro-chefe de Nova Deli e também com grande base eleitoral no Punjab, foi detido em março por suspeitas de corrupção. Pior, o desenvolvimento do país não tem chegado a todos, caso do desemprego jovem em alta, quando, em paralelo, a bolsa de valores atinge máximos e se dá uma multiplicação de milionários.
Com uma cópia da Constituição nas mãos, Rahul Gandhi, o herdeiro da dinastia Nehru-Gandhi - mimoseado de “príncipe” pelos dirigentes do BJP - tinha motivos para se regozijar. O seu partido, reduzido a 52 lugares em 2019, quase duplicou o número de eleitos, e impediu a maioria do BJP. Gandhi destacou o facto de o voto popular ter impedido uma maioria absoluta que poderia pôr em causa o texto fundamental do país. “Os eleitores puniram o BJP”, disse, antes de afirmar, não sem exagero, que “o país disse a Narendra Modi ‘Não te queremos’”.