Trump mudou de tom perante os europeus: agora elogiou o seu ”espírito” e disse que “ter uma Europa muito forte é positivo”.
Trump mudou de tom perante os europeus: agora elogiou o seu ”espírito” e disse que “ter uma Europa muito forte é positivo”.EPA / YURI GRIPAS / POOL

Trump adota a tática da guerra comercial em ultimato de 50 dias a Putin

Presidente dos EUA anuncia taxas aduaneiras e sanções secundárias à Rússia se a guerra não terminar e apoia esquema de ajuda de armamento à Ucrânia por parte dos aliados europeus.
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A paciência de Donald Trump para Vladimir Putin, bem como pelo caminho gizado pela sua administração para pôr fim à guerra na Ucrânia, chegou ao fim. Na mesma ocasião prometeu tarifas e sanções secundárias caso Moscovo não se sente à mesa com Kiev e chegue a um acordo de paz e anunciou um acordo com países europeus segundo o qual estes vão em breve fornecer sistemas de defesa e armas norte-americanas e substitui-las por outras compradas aos EUA. “Eu uso o comércio para muitas coisas. Mas é ótimo para pôr fim a guerras”, disse o presidente norte-americano ao receber na Casa Branca o secretário-geral da NATO, Mark Rutte.

Em campanha eleitoral prometeu - dezenas de vezes - acabar com a guerra “em 24 horas”. Uma vez na presidência disse estar a falar de forma “figurada”. Norte-americanos e russos encontraram-se, bem como russos e ucranianos, mas nada de significativo - exceto a libertação de prisioneiros - daí saiu. Em maio, após uma conversa telefónica com o líder russo, Trump disse que caberia à Rússia e à Ucrânia chegarem a um acordo. Mas depois da cimeira da NATO, em Haia, na qual os aliados se comprometeram em gastar 5% do PIB em Defesa em 2035, Trump terá mudado de ideias. Com o Pentágono a bloquear a transferência de material já prometido para a Ucrânia, na semana passada foi o próprio Trump quem deu ordens para que as armas e munições chegassem à Ucrânia. “Eles têm de ser capazes de se defender. Estão a ser duramente atingidos. Vamos ter de enviar mais armas, principalmente armas defensivas”, afirmou antes de lamentar que “tantas pessoas estão a morrer nessa tragédia”.

O homem que cultiva a “arte do negócio” - título de um livro seu - resolveu numa assentada adotar a tática da guerra comercial com que tem brindado de igual forma países parceiros e rivais e, ao mesmo tempo, permitir que Kiev receba armamento sem gastar um dólar. Segundo este acordo, a NATO vai coordenar a operação logística de transferência de armamento que os países europeus e o Canadá têm prontos a servir para a defesa da Ucrânia. Em troca, estes países adquirem aos Estados Unidos material novo para substituir o transferido. De acordo com Trump e Rutte, Kiev estará a horas de receber os primeiros reforços.

“Estou desapontado com o presidente Putin, pois pensava que chegaríamos a um acordo há dois meses, mas isso não parece estar a concretizar-se. Se não chegarmos a um acordo dentro de 50 dias, é muito simples, [as tarifas] serão de 100%.”

Donald Trump

No topo da lista estão as baterias de defesa aérea Patriot e respetivos mísseis. Na mais recente versão, Kiev diz precisar de mais 10 sistemas. Não ficou claro quantos sistemas serão transferidos. A dada altura, Trump disse que até 17 baterias poderiam ser enviadas para o país sob invasão. Crê-se que a Ucrânia tenha seis Patriot em uso. Segundo a CNN, que cita uma fonte da administração Trump, os EUA também poderão vender mísseis de curto alcance, mísseis ar-ar de médio alcance e munições de obus aos membros da NATO, seguindo a mesma lógica.

O neerlandês Rutte - o homem que há dias chamou Trump de “papá” - disse que este desenvolvimento “é realmente importante”. Dirigindo-se a Trump, prosseguiu: “Ligaste-me na quinta-feira a dizer que tinhas tomado uma decisão. E a decisão é que queres que a Ucrânia tenha o que precisa para se defender da Rússia, mas queres que sejam os europeus a pagar por isso. O que é totalmente lógico, e isto vem na sequência do enorme sucesso da cimeira da NATO, mas também da decisão de manter a Ucrânia forte e da decisão de aumentar a nossa produção industrial de defesa”, disse. O acordo da NATO prevê que o armamento cedido a Kiev conte para a meta dos 5% do PIB.

“A Ucrânia poderá obter uma quantidade realmente enorme de equipamento militar, tanto para defesa aérea, como também mísseis, munições, etc. Se eu fosse Vladimir Putin reconsideraria se não deveria levar as negociações sobre a Ucrânia mais a sério.”

Mark Rutte

Em complemento a esta nova política - impensável há cinco meses, quando Zelensky saiu da Casa Branca destratado pelo vice J.D. Vance -, Trump estendeu a Moscovo a sua visão mercantilista da política e lançou um ultimato: ou Putin se senta à mesa e chega a um acordo em 50 dias, ou os seus produtos receberão taxas aduaneiras “muito severas”. O presidente norte-americano lançou alguma confusão ao afirmar que as “tarifas de 100%, que podem ser chamadas de tarifas secundárias”. Funcionários da Casa Branca esclareceram vários meios norte-americanos que, além das taxas de 100% aplicadas às importações de produtos russos, o presidente referia-se em paralelo às sanções secundárias - uma arma poderosa que visa os países compradores de petróleo russo, caso da Índia e da China.

O senador Lindsey Graham, que rompeu com Trump após a invasão do Capitólio, mas que voltou a ser um forte aliado, é um dos dois patrocinadores de legislação que prevê sanções à Rússia e que, a ser aprovada, será “um martelo à disposição de Trump”, segundo palavras do próprio. No entanto, Trump pôs em dúvida a necessidade de Senado e Câmara aprovarem um texto que recebeu o apoio de uma maioria absoluta de senadores (85 em 100). “Não tenho a certeza se precisamos disso. Pode ser bastante útil, vamos ver”, disse.

Em entrevista à CBS, Graham previu que “nos próximos dias, verão armas a chegar em níveis recorde para ajudar a Ucrânia a defender-se”. O senador da Carolina do Sul explicou o porquê: “Um dos maiores erros de cálculo que Putin cometeu foi jogar com Trump. E basta observar que, nos próximos dias e semanas, haverá um esforço maciço para levar Putin à mesa de negociações.”

As declarações de Trump na Casa Branca, ao mostrar-se dececionado com Putin, parecem provar as declarações de Graham. Em 2021, Joe Biden disse acreditar que o líder russo é um “homicida”. Agora Trump, que na mesma ocasião disse que esta guerra “é de Biden” e não sua, afirmou: “Não quero dizer que é um assassino, mas é um tipo duro”, disse de Putin. “Provou-o ao longo dos anos. Enganou muitas pessoas ao longo do anos, enganou Clinton, enganou Bush, enganou Obama, enganou Biden, mas não me enganou. A certo ponto falar não adianta. É preciso agir. É preciso resultados. E espero que ele faça isso.”

Horas depois, Trump falou com Zelensky, anunciou o presidente ucraniano. Este agradeceu o apoio dos EUA e revelou que ambos concordaram em falar com maior frequência para se coordenarem.

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