Brain rot é uma expressão em inglês que a Universidade de Oxford define como “a suposta deterioração do estado mental ou intelectual de uma pessoa, especialmente vista como resultado do consumo excessivo de material (particularmente conteúdo online) considerado trivial ou pouco desafiador”. Para a prestigiada instituição, que anualmente leva a cabo essa eleição no Reino Unido, esta foi também a palavra/expressão do ano de 2024, denotando a preocupação levantada pelo impacto do consumo de redes sociais na saúde mental, sobretudo das gerações mais jovens. Para a psicóloga Sandra de Carvalho Martins, “é importante que todos, e não apenas as chamadas gerações Z e Alfa, tenham consciência dos potenciais impactos” destes hábitos digitais e “se promova uma cultura de autocontrolo para redução do tempo de exposição a este tipo de conteúdos”.Não deixa de ser curioso que um dos problemas mais atuais da sociedade tenha a defini-lo uma expressão usada pela primeira vez já no século XIX, pelo autor norte-americano Henry David Thoreau, no seu livro Walden, publicado em 1854. Neste, o ensaísta “criticava a tendência da sociedade em desvalorizar ideias complexas ou que podem ser interpretadas de diversas formas, em favor de ideias mais simples”, explica a psicóloga.Por esse motivo, acrescenta, “podemos idealizar que brain rot terá vários níveis, sendo que o ambiente digital, especialmente este tipo de conteúdos curtos, de pouco valor e viciantes das redes sociais, acrescenta uma camada inédita que potencialmente poderá ter efeitos negativos mais intensos do que, por exemplo, tiveram no seu tempo a televisão ou a rádio”. . Embora “não exista, à data, uma tradução consensual em português da expressão inglesa brain rot, ela projeta uma ideia de “apodrecimento cerebral”.A expressão ganhou projeção sobretudo entre as gerações Alfa, daqueles nascidos após 2010, e Z, nascidos entre finais de 90 e a primeira década deste século, para rotular um tipo de conteúdos nonsense que viralizam em redes sociais como o TikTok, Snapchat ou YouTube. Mas se, inicialmente, estas gerações resgataram a expressão de Henry Thoreau com uma perspetiva irónica, o seu uso rapidamente foi adotado para assinalar o potencial nocivo das redes sociais sobre os utilizadores. “O uso irónico da expressão brain rot por alguns dos indivíduos das próprias gerações Z e Alfa pode refletir uma autoconsciência sobre o impacto desses hábitos”, nota a psicóloga e autora do livro O Cérebro Eficiente, mas também pode acarretar um risco de normalização do problema. Assim, acrescenta, “é importante que se consciencialize a sociedade” e “se promova uma cultura de autocontrolo, para redução do tempo de exposição a este tipo de conteúdos, e de sentido crítico, de modo a filtrar e desconstruir o conteúdo”.“Dificuldades de concentração, lapsos de memória, cansaço mental e redução da capacidade de processar informações complexas” são os danos cognitivos mais comuns associados à “cultura brain rot”. Este declínio é frequentemente agravado pelo impacto emocional, traduzido em “irritabilidade, oscilações de humor e uma criatividade diminuída, que resulta da ausência de momentos de tédio, que são cruciais para o pensamento criativo”, sublinha Sandra de Carvalho Martins, acrescentando que alguns estudos encontraram correlações entre o uso de dispositivos digitais e o aumento de sentimentos de solidão e de ansiedade, onde pode ser difícil determinar qual o sentido dominante.De resto, Sandra Martins explica a popularidade destes conteúdos catalogados como absurdos entre as gerações atuais, “especialmente os memes”, com o facto de serem “uma forma de os jovens se expressarem nas redes sociais, acabando por ser uma forma de se destacarem no seu grupo ou comunidade. Alguns desses memes são percecionados como não tendo sentido ou como sendo absurdos, mas muitas vezes contêm sátira ou humor apenas percecionado por uma franja de quem os vê”, resume.O mais importante, salienta a autora - que em 2019 criou o projeto Neurónios Ativos, na rede social Instagram, para divulgação de material de estimulação cognitiva -, é não permitir que o cérebro fique refém desta cultura brain rot. Estimular o cérebro de forma adequada é fundamental para o manter saudável e eficiente: “Numa primeira instância, tendo consciência de que a tecnologia faz parte da nossa vida, devemos minimizar a exposição a este tipo de conteúdos e tentar direcionar a atenção e tempo para outros mais instrutivos e de qualidade. Noutra vertente, devemos priorizar o contacto social, ter uma alimentação saudável, praticar atividades físicas, exercitar a cognição para manter a sua saúde e, não menos importante, ter boas noites de sono, essenciais para a consolidação das nossas memórias.”