Dinheiro para residências de estudantes fora do Orçamento
O número de estudantes deslocados no ensino superior público é de 120 mil e a taxa de cobertura nacional de alojamento universitário é apenas de 13%. Este diagnóstico foi feito pelo próprio governo e serve de base para o PSD questionar a razão pela qual não há propostas para responder a este "gravíssimo problema" no Orçamento do Estado para 2019.
Numa pergunta dirigida ao ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, os deputados do PSD, entre os quais Duarte Marques, lembram que o governo ficou obrigado a realizar, após a aprovação de uma lei no Parlamento de 24 de junho, no prazo de três meses, um levantamento do estado e das necessidades de requalificação das residências de estudantes nas instituições de ensino superior público.
"Contudo, após a publicação da lei e do prazo ter corrido e ter-se esgotado, não aconteceu, ou pelo menos não é do conhecimento de muitas instituições nem do grupo parlamentar do PSD que tal levantamento tenha acontecido", referem os deputados sociais-democratas e questionam o ministro sobre a concretização desse levantamento.
Os deputados do PSD recordam que o governo apresentou a 17 de maio, em Coimbra, o Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior. Programa promovido através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e da Secretaria de Estado da Habitação. Mas alegam que foi precisamente por a "resposta apresentada ficar muito longe de ser uma solução para o problema" que o Parlamento aprovou a lei de 24 de junho.
O DN questionou o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) sobre as medidas previstas no OE 2019 para o aumento e requalificação das residências universitárias, mas sobre este ponto o gabinete do ministro Manuel Heitor não respondeu. Na proposta de lei e no relatório do Orçamento de Estado para o próximo ano não encontrámos nenhuma dotação de despesa especificamente destinada a este fim ou outras medidas específicas sobre o alojamento universitário.
O gabinete do MCTES garante, no entanto, ao DN que o "levantamento, identificação e caracterização das residências de estudantes junto das instituições de ensino superior públicas" está feito e os seus dados são atualizados em outubro na página da Direção-Geral do Ensino Superior (DGES). Os dados publicados ontem são basicamente os que já constavam do Plano Nacional para o Alojamento do Ensino Superior e que foram tornados públicos em maio. O governo também fez o rastreio e caracterização dos estudantes deslocados inscritos no ensino público.
O resultado do diagnóstico resultou da inquirição de 33 instituições de ensino superior, das quais 31 disponibilizam 192 residências e 15 370 camas e 9075 quartos. A maior concentração de alojamentos disponíveis é em Coimbra, Lisboa, Porto, Aveiro e Braga.
No universo de alunos inscritos e deslocados em 2016-2017, esta oferta de alojamento apenas representa 13%, ficando 87% dos alunos obrigados a encontrar e a suportar os custos de uma residência particular.
Um levantamento feito pela plataforma de alojamento universitário Uniplaces dava conta, por exemplo, de que o custo médio de arrendamento de um quarto em Lisboa se situa nos 400 euros, representando esta verba cerca de 65% do orçamento mensal de que dispõem os estudantes deslocados.
Quanto à resposta a dar a este problema, o ministério de Manuel Heitor remete para o plano de intervenção e requalificação e construção de residências de estudantes, que foi anunciado em maio também, e que está em fase de "elaboração, tendo em vista a sua aprovação até dentro do prazo fixado na lei", de 24 de julho. O gabinete do ministro garante que se encontram a ser "identificados os imóveis devolutos pertencentes a entidades públicas que possam ser reabilitados e reafetados para utilização enquanto unidades de alojamento para estudantes de ensino superior".
Este plano, refere também o gabinete, está a ser concebido "com base nas necessidades" diagnosticadas, em articulação com as instituições de ensino superior públicas e com as entidade gestoras do Fundo Nacional para a Reabilitação do Edificado (FNRE), do Instrumento Financeiro para a Reabilitação e Revitalização Urbanas, da SPGM e instituições bancárias.
"Este plano tem tido a colaboração contínua e sistemática com o ministro do Ambiente e a Secretaria de Estado Habitação, assim como o ministro da Educação e o ministro adjunto e da Economia, sobretudo orientado para a identificação de edifícios do Estado, que estão a ser avaliados e serão oportunamente divulgados, em colaboração com a DG Tesouro e outras instituições governamentais", assegura o gabinete de Manuel Heitor.
O governo recorreu à Fundiestamo - a empresa instrumental do grupo Parpública para a gestão de fundos imobiliários - para financiar a criação de alojamentos, com rendas acessíveis, para dezenas de milhares de estudantes do ensino superior que estão deslocados das suas áreas de residência.
Em maio, em declarações ao DN, a secretária de Estado da Ciência e do Ensino Superior não quis assumir números e horizontes temporais concretos", explicando que, "com a percentagem de deslocados que temos e a reduzidíssima percentagem de camas que temos, ainda será preciso muito tempo" para responder a todas as necessidades. No entanto, admitiu, "se atingíssemos metade da percentagem dos alunos deslocados nos próximos anos já não seria mau".
Quatro meses depois, a revista Exame noticiava que a Fundiestamo estimava que fossem investidos dez milhões de euros em obras através do Fundo Nacional para a Reabilitação do Edificado (FNRE) em cerca de 30 imóveis para criar 1500 novas camas em residências universitárias públicas para aumentar a oferta de alojamento para os estudantes universitários deslocados no país. Uma gota de água no oceano das 110 mil necessárias.
A celebração dos primeiros protocolos para a criação desta capacidade estava a ser preparada com as universidades de Lisboa, Évora, Coimbra, Porto, Aveiro e Trás-os-Montes e com os politécnicos de Leiria e de Coimbra, além da Movijovem, refere em comunicado o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
As associações de estudantes do ensino superior reagiram na altura, garantindo que o Plano Nacional de Alojamento não chegava para as necessidades e defendiam que era importante implementar incentivos a quem decide alugar a estudantes, como a redução de IMI ou a isenção de taxas municipais.
Já em outubro, o MCTES garantia ao jornal Público que o governo conta ter disponíveis, em 2019, mais 700 camas em novas residências do ensino superior que irão resultar da reabilitação de 12 imóveis. E que no total, com a reabilitação destes imóveis, existirá em 2021 uma oferta de 2000 novas camas espalhadas pelas regiões de Aveiro, Coimbra, Covilhã, Évora, Guarda, Leiria, Lisboa, Portalegre, Porto, Vila Real e Viseu.
A bancada do PSD irá apresentar propostas nesta área durante o debate na especialidade do OE 2019, que foi ontem aprovado na generalidade. No documento sobre ensino superior elaborado pelo Conselho Estratégico do PSD, defende-se o aumento da capacidade de residências estudantis e o alargamento da sua cobertura. "É urgente o país aumentar o número de camas. Tentar, pelo menos, duplicá-lo", frisou Graça Carvalho, a coordenadora do CES para esta área, na apresentação das propostas. Disse ainda que a solução passa pela construção ou reabilitação recorrendo a fundos europeus ou da contratualização com a sociedade civil.