Incêndios. Drones no ar e botas em terra. Forças Armadas testam nova estratégia
O Estado-Maior-General das Forças Armadas testou nesta semana um novo paradigma para a vigilância florestal, que envolve uma gestão centralizada de meios dos três ramos.
As Forças Armadas querem melhorar a suas ações de vigilância florestal para a prevenção de incêndios e estão a testar uma nova estratégia de patrulhamentos em terra, no ar e até em zonas fluviais sempre que necessário.
O Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) propõe que sejam atribuídas aos militares zonas de risco, em regiões em que tenham os seus recursos humanos e instalações mais próximos.
O Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) propõe que sejam atribuídas aos militares zonas de risco, em regiões em que tenham os seus recursos humanos e instalações mais próximos, e que seja o seu Centro de Comando de Operações Militares (CCOM) a fazer a gestão de meios a projetar no terreno.
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Este modelo substituirá o atual emprego de meios à la carte, em que os patrulhamentos são distribuídos em itinerários e horas limitadas - como acontece com as 36 patrulhas militares do plano Faunos (que sofreram uma redução em relação ao ano passado), coordenado pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas.
Gestão das zonas prioritárias
Nesta semana no Centro de Comando foi preparado um exercício, a que o DN assistiu em parte, para testar a coordenação de meios do Exército, da Força Aérea e da Marinha.
"Há a perceção de que a eficácia do atual sistema é duvidosa e é possível melhorar bastante os resultados."
"No nosso entender, tendo em conta toda a análise que fizemos, há a perceção de que a eficácia do atual sistema é duvidosa e é possível melhorar bastante os resultados", sublinha Marco Serronha, tenente-general do Exército, que comanda o CCOM.
Segundo este oficial-general, esta intenção de mudança de paradigma é do conhecimento da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) e da GNR, que é a entidade nacional competente para a coordenação das ações de vigilância florestal.

No exercício participaram militares de todos os ramos.
© Francisco Rodrigues/EMGFA
"O que pedimos é que nos sejam atribuídas zonas prioritárias e somos nós, através do CCOM, a gerir os recursos a dispensar pelos três ramos. Essas áreas ficam à nossa responsabilidade", afiança o oficial general.
Lembra que "os novos drones da Força Aérea trouxeram uma capacidade adicional, no apoio direto à GNR, que é a autoridade com competências para a vigilância florestal, mas também como meio do Sistema de Forças Nacional, gerido pelo EMGFA".

Almirante Silva Ribeiro, chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas.
© Orlando Almeida
Numa recente entrevista ao DN, o chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, Silva Ribeiro, já tinha antecipado este novo plano. "Neste mês, vamos realizar um exercício para desenvolver o conceito de emprego desses drones, por determinação do senhor ministro da Defesa. [...] Os drones veem o panorama em altitude e, depois, as equipas por terra, dirigem-se aos locais onde existem eventuais problemas, para tomar as ações que forem necessárias."
Visibilidade e interação
No entender do comandante do CCOM, "a vantagem imediata do novo modelo é que pode gerir os meios aéreos e terrestres de forma mais eficaz. Logo à partida, porque podemos estudar e avaliar todas as características desses terrenos e planear os recursos mais adequados".
"Uma presença mais permanente e regular das nossas patrulhas em determinadas zonas terá efeitos dissuasores importantes, quer pela visibilidade quer pela interação com as populações."
Paralelamente, explica, "uma presença mais permanente e regular das nossas patrulhas em determinadas zonas terá efeitos dissuasores importantes, quer pela visibilidade quer pela interação com as populações".

O tenente-general Marco Serronha comanda o CCOM.
© Francisco Rodrigues/EMGFA
Os militares pretendem que as áreas geográficas definidas sejam próximas das suas instalações para que possam "empenhar e gerir meios de forma eficiente".
De acordo com esta disponibilidade, propuseram à GNR, entre outras, áreas geográficas nas regiões de Trás-os-Montes, Beira Alta, zona de Santarém, Coimbra.
"São tudo áreas centradas nas zonas de maior risco de incêndio. Contando com as patrulhas no terreno e com as equipas que vão estar a operar os drones, estimamos que possamos empenhar entre 200 e 250 militares por dia", assinala Marco Serronha.
Olhar para os resultados
No final do mês de outubro será aprovado o conceito geral desta nova estratégia pelo ministro da Defesa, depois serão definidos os pormenores do plano a aplicar no próximo ano - caso seja assim aprovada por todas as entidades envolvidas, designadamente pela GNR.
"Há uma série de melhorias a fazer, mas tudo tem de ser coordenado e integrado com a GNR."
Tiago Oliveira, presidente da AGIF, confirmou ao DN ter tomado conhecimento desta proposta do EMGFA.
"Há uma série de melhorias a fazer, mas tudo tem de ser coordenado e integrado com a GNR. O princípio é sempre melhorar os sistemas, mas a GNR terá de analisar com as Forças Armadas todos os detalhes e coordenarem recursos", afiança este responsável, especializado na gestão de risco de incêndio florestal.

Tiago Oliveira, presidente da AGIF.
© Pedro Rocha/Global Imagens
Sublinha que "é importante olhar para os resultados" e destaca que se tem "conseguido reduzir as ignições". No entanto, admite, "há muito trabalho a fazer, por exemplo haver uma visão integrada, que envolve um portal comum, que permita a todas as entidades observar onde estão os recursos de cada uma e possam fazer uma melhor gestão".
Um portal geoespacial
O exercício, a que assistimos em parte, chamado Zéfiro 2020 (esta é a designação, na mitologia grega, do deus do vento do oeste) tem como objetivo "treinar e exercitar a estrutura de comando, controlo e comunicações, na participação ativa das Forças Armadas, na fase de pré-supressão, materializada pela ação de vigilância e deteção na prevenção de incêndios rurais".

O coronel Antunes explica os cenários do exercício.
© Francisco Rodrigues/EMGFA
É explicado pelo coronel Paulo Antunes - estão presentes oficiais e militares dos três ramos - que "estas ações integram as capacidades já existentes e as resultantes dos UAS [Unmanned Aircraft Systems] recentemente adquiridos pela Força Aérea no âmbito do reforço de meios do Dispositivo de Combate a Incêndios Rurais, meios esses que integram o Sistema de Forças Nacional, contribuindo para o levantamento de um sistema integrado de vigilância e deteção das Forças Armadas".
O mapa que surge no ecrã gigante da sala de operações mostra a zona da Lousã.
Observamos uma uma imagem, parada, cheia de nuvens e uma nesga de céu, captada pelo drone da Força Aérea, que tem a base no aeródromo local.
Observamos uma imagem, parada, cheia de nuvens e uma nesga de céu, captada pelo drone da Força Aérea, que tem a base no aeródromo local. Nas imagens de satélite é possível visualizar a posição das patrulhas no terreno, a Lince, do Exército, e a Foca, da Marinha, uma comunicação feita através dos rádios SIRESP que estão na posse dos militares.
Somos informados de que "há três drones a operar na prevenção de incêndios", mas que só o da Lousã está a participar neste exercício. A Força Aérea adquiriu 12 drones, mas devido a atrasos de vária ordem não conseguiu cumprir o seu objetivo de atingir a sua "capacidade total" até final de agosto.

Nas imagens por satélite é possível visualizar a posição das patrulhas no terreno: as Lince, do Exército, e as Foca, da Marinha.
© Francisco Rodrigues/EMGFA
Os "eventos e incidentes" criados para o exercício são "reservados", mas é-nos explicado que servem para testar "o empenhamento, em apoio à GNR, dos meios militares".
Simula-se um pedido, que implica um "esforço adicional de vigilância", em coordenação coma ANEPC, "em face da evolução da estação meteorológica".
Botas no chão e... drone
É difundida uma ordem e são atribuídas a cada ramo, através dos respetivos comandos operacionais, missões de vigilância adicionais, sendo-lhes distribuídas zonas de vigilância e deteção.
Os comandos operacionais procedem de seguida ao planeamento e execução dos patrulhamentos requeridos.
Nas imagens do Portal Geoespacial vão surgindo os vários meios que estão no terreno, a imagem (ainda parada) do drone que estará no ar.
Nas imagens do Portal Geospacial, vão surgindo os vários meios que estão no terreno, a imagem (ainda parada) do drone que estará no ar, informações geográficas, estatísticas.

No portal geospacial surgem vários dados de apoio.
© Francisco Rodrigues/EMGFA
O coronel Antunes fala ao telefone e faz-nos sinal, avisando que há novidades. Afinal o drone terá de aterrar "devido às condições atmosféricas". Mais tarde, no registo de voos que o DN consultou, foi possível verificar que este drone esteve no ar cerca de 20 minutos, por cima do aeródromo.
Problemas de comunicação e climatéricas impediram que se visse as imagens em tempo real. Ainda há tempo para ver uma gravação de 25 de agosto, com alguns exemplos de capacidades de vigilância destas aeronaves.

O drone da Força Aérea teve de aterrar mais cedo, devido às condições climatéricas e a problemas de comunicação.
© Francisco Rodrigues/EMGFA
A imagem seguinte já é da pista do aeródromo, onde está pousado o drone e, junto a ele, as botas de um militar que está na pista.
Atualizado a 29/09/2020, às 15h44. O EMGFA não deu a conhecer a sua proposta na passada terça-feira, mas manifestou esta intenção já anteriormente à AGIF, ANEPC e GNR
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