Já levamos meio ano a gastar os recursos de 2019: o pior e o melhor do ambiente do ano que passou

Associações ambientalistas passam o ano em revista. Da poluição no Tejo à derrocada da estrada em Borba, da morte do furo em Aljezur às energia renováveis, o ano foi pródigo em casos, mas também teve momentos altos.
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Tratamento inadequado do lixo e metas que ficarão por cumprir, consumo excessivo dos recursos, picos de poluição nos rios e no ar, a derrocada de uma estrada entre duas pedreiras na zona de Borba ou ainda os incêndios florestais e os extremos de temperatura, a lembrar que as alterações climáticas já aí estão. Mas também um mês inteiro (março) em que o consumo de eletricidade foi de produção exclusiva por energias renováveis, o fim do projeto da Galp e ENI para a prospeção de petróleo ao largo de Aljezur e a suspensão de licenças de exploração de gás na região centro, ou ainda o novo roteiro para o país chegar à neutralidade carbónica em 2050, apresentado pelo governo no início do mês, eis o essencial do pior e do melhor que se viveu em Portugal na área do ambiente, na visão das associações ambientalistas Zero e Quercus.

O que correu mal impõe novas filosofias e obriga a mudanças, e o que se andou de positivo exige reforço de práticas e medidas. Por isso, a Zero traça também perspetivas para o ano que entra, que, com uma ou outra novidade, repetem quase a papel químico os temas que já em 2017 a associação ambientalista considerava como os mais importantes desafios para 2018.

Ei-los: salvaguardar solos e tornar a floresta mais resistente, criar políticas mais eficazes de resíduos para cumprir metas de reciclagem da UE para 2020, travar o desperdício e as perdas na água, adotar uma lei do clima que sirva de base a uma política estável e de longo prazo para o setor. São, afinal, "os vários pilares da política ambiental em que é preciso continuar a dar resposta", como sublinha o presidente da Zero, Francisco Ferreira.

O pior de 2018

Poluição no Tejo
O episódio ocorrido logo no primeiro mês do ano, no dia 24, quando um manto de espuma cobriu durante vários dias toda a superfície do rio na região de Abrantes, é um acontecimento negativo destacado pela Zero. Foi "o culminar de mais de dois anos de poluição recorrente ao longo de todo o Alto e Médio Tejo", considera a associação ambientalista. As medidas "mais assertivas" tomadas pela administração pública neste caso, para preservar a qualidade da água do Tejo, e os seus resultados são uma das questões a acompanhar em 2019.

Mais de duas Terras para satisfazer consumo se todos fossem como os portugueses
No dia 16 de junho, os portugueses esgotaram os recursos naturais para o ano inteiro e começaram a consumir os de 2019. Se toda a gente no planeta "vivesse como uma pessoa média portuguesa, a humanidade exigiria o equivalente a 2,3 planetas para sustentar as suas necessidades de recursos", diz a Zero. Não é de agora. Há anos já que se verifica esta tendência negativa.

Incêndio de Monchique
Entre 3 e 10 de agosto, Monchique foi palco do maior incêndio do ano, durante o qual ardeu uma área de 27 mil hectares. O incêndio foi potenciado por condições atmosféricas adversas (temperaturas muito altas) e pelo desordenamento do território, destaca a Zero. Nessa semana, a 4 de agosto, registou-se o dia mais quente do século no território do continente, com a máxima a atingir 41,6 graus Célsius e a mínima uns impressionantes 23,2, durante uma onda de calor com valores médios das máximas acima dos 40 graus. Tudo junto contribuiu para um pico de poluição atmosférica em alguns dias dessa mesma semana.

Derrocada da estrada em Borba
A tragédia, que vitimou cinco pessoas, quando a estrada entre duas pedreiras abateu, a 19 de novembro, pôs a nu "o enorme descontrolo no cumprimento da legislação", e o "grande passivo ambiental" que esta atividade está a deixar na região do Alentejo, diz a Zero. Também a Quercus elegeu este como um dos piores acontecimentos ambientais do ano, enquanto exemplo "da exploração exaustiva dos recursos naturais", em que "os valores económicos se sobrepuseram aos critérios ambientais e de segurança".

Tratamento de resíduos aquém das metas
Para as duas associações ambientalistas este é um dos pontos negros que marca o ano agora a findar. Em causa está o facto de Portugal não atingir as metas da UE para 2020 na redução e tratamento do lixo urbano, como reconheceu em novembro o próprio Relatório do Estado do Ambiente. A redução da produção de resíduos em 7,6%, em relação a 2012, não será cumprida, nem tão-pouco as metas para a reciclagem.

A Quercus elege ainda como piores factos ambientais do ano os processos de decisão do novo aeroporto de Lisboa no Montijo; o corte de centenas de azinheiras no Alto Alentejo para instalação no seu lugar de um olival intensivo; o crescimento da população de vespa asiática (Vespa velutina) no território nacional e ainda a autorização para o novo armazém temporário de resíduos radioativos na central nuclear de Almaraz, em Espanha, nas margens do Tejo e a uma centena de quilómetros da fronteira portuguesa.

O melhor de 2018

Fecho de Almaraz
É, justamente, de Almaraz que vem igualmente um dos factos ambientais positivos destacados pela Quercus. A associação assinala por isso o anúncio feito pelo chefe do governo espanhol, o socialista de Pedro Sánchez, do encerramento da central de Almaraz, agendado para 2024. "Depois de muitos anos de contestação por parte da sociedade espanhola e portuguesa, é bastante positiva a intenção manifestada pelo atual governo espanhol", diz a associação, sublinhando que "é necessário pôr desde já em marcha um plano para o encerramento e desmantelamento da central".

Março, um mês a renováveis
Para a Zero, esta é uma das marcas positivas do ano: durante um mês, "os portugueses consumiram eletricidades exclusivamente produzida por fontes renováveis", algo inédito "pelo menos nos últimos 40 anos", que mostra que este é um caminho possível na produção e consumo de energia. Não admira que o dia com os melhores índices de qualidade do ar, com índice de "muito bom" na maioria das estações, fosse 30 de março.

O fim do furo de Aljezur
Este é um dos factos positivos destacados pelas duas associações ambientalistas. A decisão foi tomada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé a 13 de agosto, que deferiu uma providência cautelar interposta pela PALP, a Plataforma Algarve Livre de Petróleo. "Incompreensivelmente", como nota a Zero, o governo ainda recorreu da decisão, mas em 29 de outubro o consórcio Galp/ENI anunciou a desistência do projeto.

Administração pública sem plástico
Esta é uma escolha Quercus, que saúda as medidas aprovadas no Conselho de Ministros "para a proibição do uso de garrafas, sacos e louça de plástico na administração pública. Assinalada pela mesma associação como positiva é igualmente a suspensão das licenças para fraturamento hidráulico na região centro para prospeção e exploração de gás natural.

Proibição na UE de pesticidas que afetam as abelhas
A maioria dos Estados membros, incluindo Portugal, apoiou a proposta da Comissão Europeia para banir a utilização ao ar livre de pesticidas com três compostos chamados neonicotinóides, que causam mortalidade nas abelhas. "Até final do ano", diz a Quercus, esses produtos "vão desaparecer do ambiente", para "segurança das abelhas, da saúde pública e da biodiversidade".

Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050
Apresentado pelo governo no início de dezembro, fica como uma das marcas positivas do ano, segundo a Zero, pelas suas "metas mais ambiciosas", em relação às da própria Comissão Europeia. Trata-se do documento orientador das políticas nacionais para as próximas décadas, com vista a atingir até 2050 a produção de eletricidade por renováveis a 100 por cento ou a total descarbonização dos transportes. Agora, defende a Zero, deve seguir-se a adoção na Assembleia da República de "uma lei do clima", que permita garantir "a estabilidade das políticas nesta área a longo prazo".

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