Bangladesh: fazer like ou partilhar artigos contra o governo pode dar prisão
Amnistia Internacional, Human Rights Watch, Comité para a Proteção de Jornalistas, Federação Internacional de Jornalistas. Todos dizem o mesmo: a liberdade de expressão está seriamente ameaçada no Bangladesh.
O problema é a nova lei que o governo criou para regular a internet. Chama-se Digital Security Act e permite que a polícia prenda e reviste indivíduos que atentem contra os símbolos nacionais, ponham em causa crenças religiosas ou simplesmente partilhem ou aprovem informação que contrarie o governo e ponha em causa a ordem pública.
Com uma população de 167 milhões de habitantes, o Bangladesh era considerado até há dois anos a quinta maior democracia do planeta - atrás de Índia, Estados Unidos, Brasil e Indonésia.
Desde então, os índices democráticos do país asiático têm-se deteriorado rapidamente, ao ponto de este ano o Transformation Index da Fundação Bertelsmann ter colocado o país na lista das autocracias e de o país ter descido oito posições no ranking democrático da Economist Intelligence Unit, estando agora classificado como um regime híbrido, entre a democracia e a ditadura.
No rescaldo dos ataques terroristas que o país sofreu em 2016, o governo da primeira-ministra Sheik Hasina implementou medidas duras de controlo da informação. O país tinha já há uma década uma cartilha de comportamento digital escrita, o Communication Technology Act. Nesta altura, Hasina aceitou novas regras que previam a detenção de indivíduos suspeitos de perturbarem a ordem e a harmonia social.
O caso mais famoso terá sido a detenção de Monirul Islam em 2017. Este trabalhador das plantações de borracha do sul do país gostou e partilhou um post do Facebook que acusava a primeira-ministra de ter viajado para a Índia com um único objetivo: fazer campanha política. No dia seguinte a polícia foi buscá-lo a casa, sem acusação. Passou três meses detido e sem fiança porque um juiz considerou a sua partilha uma "traição à pátria."
Entretanto, em julho e agosto, o atropelamento mortal de duas crianças levou milhares às ruas de Daca durante nove dias.A polícia respondeu violentamente, ferindo vários manifestantes. Alguns universitários e um jornalista foram detidos ao abrigo do Communication Technology Act.
Shahidul Alam adensou o escândalo: foi preso em casa horas depois de prestar declarações à cadeia de televisão Al-Jazeera, condenando a atuação da polícia e do governo. Alega agora que a polícia o espancou e não tem direito a fiança. Várias ONG de direitos humanos e defesa dos jornalistas exigem a sua libertação.
Estes casos fizeram incidir uma luz sobre um documento que permitia prisões arbitrárias, e foi sobretudo por isso que o governo aceitou reformá-lo. Na passada quarta feira, os 320 deputados do parlamento aprovaram por larga maioria o novo Digital Security Act. Só 11 votaram contra.
A associação de diretores de jornais reagiu imediatamente e acusou o governo de ter criado uma lei ainda mais ameaçadora para a liberdade de expressão e para os jornalistas.
Além de se manterem as prisões arbitrárias, além de se poder prender quem fizer like ou partilhar um post do Facebook, as penas aumentam para quem desafiar o regime. E agora não apenas o sistema político, mas também para o religioso. Ofender crenças passa a ser crime. O trabalho jornalístico é condicionado e, como diz o presidente da associação de diretores de jornais local, "sem jornalismo não há democracia".
As reações não são apenas internas nem apenas das ONG dos direitos humanos. Por toda a Península Indiana se fazem ouvir vozes do que estas quebras de liberdade podem representar para a região. Ao fim de duas décadas, a democracia no Bangladesh está a perder o combate pelas liberdades. Como diz , jornalista nepalês, "outras nações podem seguir-lhe o caminho"