Cinco substituições. Um recurso útil e de uso moderado
As substituições podem ser uma arma ao serviço dos treinadores para ganhar jogos. Uma arte de antecipação que permite a gestão das peças em campo, como forma de tirar melhor rendimento da equipa e aumentar as hipóteses de sair vencedor. Possibilidades essas que foram aumentadas com a alteração do número de substituições por jogo. A FIFA, com a concordância do Internacional Board, decidiu autorizar o aumento de duas substituições por encontro, como proteção dos jogadores devido à paragem de quase três meses por culpa da pandemia covid-19. Em Portugal, a regra das cinco substituições começou emperrada - só entrou em vigor na 26.ª jornada, depois de aprovadas em Assembleia Geral da Liga -, mas tem dado jeito aos treinadores.
Os técnicos da I Liga têm recorrido à regra das cinco substituições de forma moderada. No total, a regra excecional que permite mais do que as habituais três alterações foi usada 24 vezes em 36 possíveis, tendo em conta que já foram completadas duas jornadas com a nova regra em vigor e cada jornada tem nove jogos e 18 utilizações possíveis. Dessas em apenas 14 os técnicos acionaram as cinco alterações máximas.
Na ronda 26 a regra foi utilizada em sete dos nove jogos, mas por apenas nove treinadores. E só em dois encontros foi usada por ambos os técnicos. O Portimonense- Benfica (2-2) foi um deles. O outro foi o Tondela-Desp. Aves (2-0). Já na ronda seguinte, o cenário foi algo diferente. As cinco substituições foram acionadas por 11 técnicos em nove partidas, mas com a particularidade de terem sido usadas pelos dois treinadores do mesmo jogo por quatro vezes. O Santa Clara- Portimonense (1-1), o Paços de Ferreira-Belenenses SAD (2-1), Boavista-Vit. Setúbal (3-1) e Sporting-Tondela (2-0).
No que aos três grandes diz respeito, o Benfica é o que mais recorre às cinco alterações, sendo que o FC Porto ainda não fez uso dela. Sérgio Conceição ficou-se pelas quatro alterações nos jogos com o Marítimo (1-0), com o último jogador a ser substituído aos 90+4 minutos, e o Desp. Aves (0-0), com o último jogador a entrar aos 89'. Quanto a Bruno Lage esgotou as alterações em ambos os jogos. Frente ao Portimonense (2-2) a última alteração foi feita ao minuto 80, já com o Rio Ave (vitória por 2-1), o técnico do Benfica fez uma dupla alteração aos 90'+2'. Já Rúben Amorim tem tido um regresso mais tranquilo, após a paragem devido à pandemia, e já recorreu às cinco alterações no jogo com o Tondela (2-0, a mais tardia ao 88'), depois de ter feito apenas quatro na jornada antes, com o Paços de Ferreira (1-0, a última aos 83").
E em 13 dos 18 jogos houve alterações aos 90 ou mais minutos. Na jornada 26, oito técnicos mexeram na equipa depois do tempo regulamentar e um deles gastou uma alteração dupla. Petit no encontro do Belenenses SAD com o Vit. Guimarães (1-1), talvez na tentativa se segurar o empate frente a um adversário difícil por tradição. Na ronda 27, apenas cinco treinadores o fizeram, sendo que Bruno Lage foi o único a fazer uma mudança dupla depois dos 90 (90'+2') e já depois de chegar ao golo que lhe daria a vitória em Vila do Conde.
Dos 18 treinadores da I Liga, apenas três (João Pedro Sousa, Pepa e Custódio) terminaram um jogo sem recorrer a mais de três alterações, desde que a regra entrou em vigor. O Gil Vicente-Portimonense da jornada 26, que terminou com um triunfo famalicense (3-1), foi o primeiro jogo em que a regra foi aplicada e Vítor Oliveira o primeiro treinador a fazer uso dela. Em desvantagem no marcador o técnico gilista mexeu na equipa por três vezes - as permitidas por lei -, mas fazendo duas substituições duplas aos 68 e 82 minutos de jogo, enquanto João Pedro Sousa se ficou pelas habituais três alterações. O técnico do Famalicão foi um dos três que optou por não fazer mais do que três mexidas na equipa até hoje no total de 36 encontros. Os outros foram Pepa do Paços de Ferreira, frente ao Sporting (derrota por 1-0), na jornada 26, e Custódio do Sp. Braga, na ronda 27 frente ao Famalicão (0-0). Todos os outros fizeram quatro ou cinco substituições e nenhum ainda fez as cinco alterações de uma vez, mas é possível...
"Não podemos olhar para as cinco substituições como algo obrigatório. É um recurso que nós, treinadores, temos e que eu já o utilizei no jogo com o Belenenses. Fomos os primeiros a falar sobre as cinco substituições e mais jogadores na ficha de jogo, mas não está preconcebido que no plano de jogo esteja inerente as cinco mudanças, depende do que o jogo pede e o jogo com o Sporting não pedia isso", explicou ao DN Pepa, que no jogo com o Sporting só fez três alterações.
"Foi uma gestão cuidada da nossa parte, porque sabíamos que o segundo e o terceiro jogo eram os mais críticos do microciclo de três jogos. Em Alvalade, no segundo jogo após a retoma fizemos uma alteração de cinco jogadores na equipa inicial face ao onze que tinha entrado em campo com o Rio Ave e por isso durante o jogo fiz uma alteração ao intervalo e duas após o golo do Sporting, após a hora de jogo. Estava satisfeito com o que os jogadores estavam a demonstrar em termos táticos, técnicos e desempenho de rendimento, mas acima de tudo em termos físicos. Independentemente de estar a encostar ou não o Sporting mais para trás, a equipa estava bem", na opinião do técnico do Paços, que frente ao Belenenses SAD já usou as cinco alterações: "Houve essa necessidade. Mudei dois ao intervalo e depois três no decorrer do segundo tempo."
A média do tempo de jogo aumentou. Raro é o jogo que não acaba depois dos 90+5 minutos para compensar o tempo gasto nas alterações extra, mas Pepa não olha para a quinta substituição como forma de queimar tempo: "Isso não entra na minha equação. Não são balelas, isso não entra na nossa foram de estar mesmo. O melhor exemplo que posso dar é num jogo com o Sporting há dois anos, que o árbitro deu três ou quatro minutos de tempo extra e o jogo foi até aos 100 minutos e não houve nenhum jogador a deitar-se no chão a queimar tempo. Para mim isso não existe. Cinco substituições por necessidade da equipa tudo bem, para queimar tempo não. E se alguém o usar com esse intuito o árbitro está lá para dar mais tempo de jogo."
Cada um sabe de si e o treinador dos castores (16.ª da I Liga) "jamais" irá criticar um treinador que uso o recurso às substituições para deixar o tempo passar. Até porque pode chegar o dia em que ele o poderá fazer. Na opinião do técnico não se trata de queimar tempo, mas "deixar a equipa respirar", uma forma de "quebrar o ritmo do jogo e enervar a equipa adversário". Recurso válidos como outros quaisquer. "Vou-lhe dar um exemplo. Imagine que no jogo com o Sporting, o Paços dava a volta ao resultado e o Sporting começava a carregar em cima de nós e eu ainda tinha duas substituições para fazer. Qual é o problema de eu aos 90 mexer na equipa. Não é muito normal mas não seria perder tempo, era quebrar o ritmo e fazer com que a equipa respirasse um bocado, porque o desgaste é muito grande quando se anda 90 minutos atrás de uma bola", explicou o treinador.
No geral é a regra é uma "mais-valia". Ele era dessa opinião antes da retoma e mantém a ideia. E só tem pena que não se tenha aprovado a tempo de ser usada logo na primeira jornada após a paragem devido à pandemia: "Discutiu-se tanta coisa e não houve tempo para discutir uma alteração importante. Isso é que não faz sentido, mas mais vale tarde do que nunca."
Mas será que a regra veio para ficar? "Não acredito que fique... para já... Acredito que nas grandes competições como os campeonatos europeus e mundiais e Jogos Olímpicos, onde há uma grande densidade de jogos, isso possa ser revisto. A quarta substituição ou as cinco com três paragens poderão ser opção. As três substituições são curtas para 120 minutos de jogo quando há prolongamento. Se queremos um bom espetáculo em vez de ficar a olhar para a televisão e dizer que as equipa se estão a arrastar, a jogar para trás e para o lado no prolongamento temos de evoluir. Agora quando chega o intervalo o árbitro apita para mudar de campo rápido, quando o cansaço e a desidratação ao fim de 105 minutos de jogo. Mas andamos a brincar? Precisamos evoluir se quisermos um bom espetáculo, mas eu acredito que o futebol vai evoluir para aí", confessou.
O futebol começou sem substituições. Se um jogador se lesionava a equipa ficava o resto do jogo a jogar com menos um. Em 1958 introduziram uma substituição, embora inicialmente o guarda-redes e o jogador de campo só pudessem ser trocados em caso de lesão. Foi preciso esperar até ao Mundial de 1970, para serem autorizadas duas mexidas. Em 1992 foi autorizada a terceira substituição, mas somente em caso de lesão do guarda-redes até passar a definitiva em 1995. Desde então que se mantém. Por isso Pepa vê com naturalidade as quatro ou cinco mudanças por jogo...